Madeira, o príncipe de Salina,
Costa e os azares dos Távoras
Por Ana Sá Lopes
publicado em 1
Abr 2015 in
(jornal) i online
Um resultado
decente do PS nas eleições da Madeira estaria hoje a ser propalado aos quatro
ventos como uma prova de “um novo ciclo” e “um novo rumo”
Numa campanha
eleitoral dizem-se coisas inúteis, muitas desastradas, outras inclusivamente
parvas. Mas António Costa podia ter evitado acentuar, quando foi cumprir o
doloroso dever de participar nas regionais da Madeira, que “é natural que as
pessoas compreendam que a necessidade de mudança que se sente na Madeira é uma
necessidade de mudança que se sente em todo o país”.
Não, esta frase
desastrada, à luz dos resultados de domingo, não veio de nenhum dos inimigos
políticos de António Costa – mesmo daqueles que, como dizia Churchill, se
sentam na bancadas do seu partido. Foi o próprio Costa a extrapolar uma
“necessidade de mudança” na Madeira para o país inteiro. Se a Madeira quisesse
dizer alguma coisa ou os resultados fossem extrapoláveis, era dia de luto no
Largo do Rato.
O problema da
derrota mortal que o PS teve nas regionais é intrinsecamente madeirense: 40
anos de PSD não originaram uma alternativa política fora do PSD. Alberto João
Jardim não é o príncipe de Salina, de “O Leopardo”, mas circunstâncias
variadas, incluindo a incapacidade, que se perde no fim dos tempos, dos
socialistas madeirenses, permitiram que na Madeira se cumprisse a frase de
Lampedusa. No fim do jardinismo foi preciso que algo mudasse – Albuquerque, um
candidato que há algum tempo se tinha consolidado como opositor interno de
Jardim – para que tudo ficasse na mesma, nas mãos do PSD que sempre governou a
ilha.
Claro que o
discurso do PS, hoje, é correcto: sabemos perfeitamente que não é possível transpor
os resultados de uma realidade específica, o arquipélago da Madeira, para as
legislativas nacionais. Não foi porque a desastrada coligação Mudança conseguiu
que o PS ainda tivesse menos votos do que nas eleições anteriores – e menos
deputados eleitos – que Costa vai ter menos hipóteses de vencer as legislativas
de Setembro/Outubro. Tudo isto é certo e muito bonito, se não soubéssemos que
Costa começou por tentar fazer um discurso de campanha em que colava um desejo
de mudança na Madeira ao desejo de mudança a nível nacional. Se não soubéssemos
também que um resultado decente do PS nas eleições da Madeira estaria hoje a
ser propalado aos quatro ventos como uma prova do “novo ciclo”, do “novo rumo”
e da nova liderança de António Costa. Se não soubéssemos que, em vez de se
esconder na noite de domingo, Costa estaria a fazer um comício onde calhasse.
Teria dado jeito
ao PS um melhor resultado na Madeira porque a política também vive de “onda
psicológica”, aquela que Costa conseguiu surfar durante o processo das
primárias e foi perdendo devagarinho, essencialmente por culpa própria. Costa
acreditou sinceramente na existência de uma passadeira vermelha que o levaria
sem esforço às eleições. Se a decisão de sair da câmara é um passo no rumo
certo, ainda não chega para inverter o gigantesco capital de esperança que
desperdiçou sem que ninguém saiba como nem porquê.
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quarta-feira
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