Pilotos,
TAP e Governo tentaram travar greve até ao último minuto
RAQUEL ALMEIDA
CORREIA 01/05/2015 - PÚBLICO
Negociações
prolongaram-se noite dentro, mas sem acordo à vista. Paralisação
de dez dias irá causar danos incalculáveis.
A “esperança”,
nas palavras do ministro da Economia, manteve-se até ao último
minuto, com as negociações entre sindicato, TAP e Governo a
estenderem-se pela noite dentro. Mas, independentemente do desfecho
deste diálogo de bastidores, que chegou sempre à praça pública
num tom de profunda discórdia, os principais danos do braço-de-ferro
que levou os pilotos a convocar uma greve de dez dias já iriam ser
irreparáveis.
A poucas horas do
início da paralisação, multiplicaram-se ainda os esforços para
lhe pôr um fim a tempo de evitar o pior cenário. Durante a tarde de
quinta-feira, o presidente da TAP recebeu o Sindicato dos Pilotos da
Aviação Civil (SPAC) para tentar um acordo de última hora e, mesmo
depois de os pilotos anunciarem, numa conferência de imprensa às
20h, que iriam avançar com a greve, as negociações com o Governo
prosseguiram. No entanto, os protestos continuavam de pé.
Os impactos da
decisão ainda são difíceis de calcular. O que se sabe, por agora,
é que só no primeiro dia da greve, cujo início está marcado para
esta sexta-feira, pelo menos três mil passageiros cancelaram os
voos, com uma perda imediata para os cofres da transportadora aérea.
Mas, além de o número ser provavelmente mais elevado (porque nem
todos confirmaram os cancelamentos junto da TAP), haverá prejuízos
futuros. É que os clientes que optaram por transferir as viagens ou
pedir vouchers vão ocupar o lugar das novas reservas que pudessem
surgir.
Como, desta vez, a
companhia de aviação optou por não cancelar voos para evitar
reembolsos, limitando-se elencar os que provavelmente não irá
realizar, os aeroportos portugueses vão viver nesta sexta-feira um
dia muito agitado. É muito provável que milhares de passageiros
apareçam de malas feitas, mesmo sem haver certezas de que o avião
não vai ficar em terra.
Para o primeiro dia
de greve, a TAP tem apenas garantidas 56 ligações ao abrigo dos
serviços mínimos, que protegem apenas 5500 dos perto de 30 mil
passageiros que tinham reservas marcadas para esta sexta-feira. A
estes clientes já acautelados, juntam-se os restantes três mil que
cancelaram os voos, ficando mais de 20 mil pessoas com as viagens em
risco.
É deste lote que
fazem parte os cerca de três mil passageiros com bilhetes para os
voos que a companhia colocou na quinta-feira na lista de 33
frequências que não prevê realizar. E sobram, por isso, perto de
18 mil, não se sabendo quantos já desistiram de voar pela TAP e
ainda não comunicaram o cancelamento e quantos só saberão se
descolam quando chegarem ao aeroporto, ficando à mercê da adesão
dos pilotos à greve.
Se a paralisação
se mantiver nos próximos dias, já que está agendada até 10 de
Maio, os danos vão continuar a acumular-se. A transportadora aérea
previa transportar 350 mil pessoas nestes dez dias e, dos três mil
voos que estavam programados, apenas 276 ficaram assegurados com os
serviços mínimos. A lista dos cancelamentos prováveis, que a TAP
divulgou na quinta-feira, abrange apenas os três primeiros dias de
greve, mas já inclui 86 voos. Nada garante, porém, que não
aumente, se a previsão de que muitos pilotos compareçam ao serviço
sair frustrada.
Entre acusações e
apelos
O pior cenário
parecia, porém, evitável, ao início da noite de quinta-feira.
Antes de o SPAC iniciar a conferência de imprensa, havia a
expectativa de que a reunião de última hora com o presidente da
companhia de aviação tivesse dado frutos. Mas o sindicato, que
reclama a devolução das diuturnidades suspensas desde 2011 e uma
fatia entre 10% e 20% no capital, acabou por anunciar que a greve se
mantinha.
Na conferência de
imprensa que começou às 20h, Hélder Santinhos, da direcção do
sindicato, afirmou que “os pilotos e os trabalhadores estão
cansados de pagar por erros que não são seus” e garantiu que
fizeram “concessões muito significativas”, acusando a TAP e o
Governo de “radicalismo”. Mas, ainda assim, admitiu que “existe
sempre” a possibilidade de um acordo.
Em reacção, o
ministro da Economia também deixou no ar a “esperança” de que a
paralisação fosse suspensa. “Apelo a que os pilotos, homens e
mulheres habituados a tomar decisões em momentos delicados,
trabalhem de 1 a 10 de Maio”, disse Pires de Lima.
O governante
justificou o facto de não responder a mais perguntas dos jornalistas
com a “esperança que a sociedade portuguesa toda ainda mantém,
até à última hora,” de que a paralisação fosse desconvocada.
Para o ministro, fazer mais comentários poderia colocar em causa uma
eventual “reconsideração dos pilotos”, deixando transparecer a
expectativa que ainda existia a essa hora, dentro do Governo, de que
houvesse um acordo com o SPAC.
Estas foram as
últimas declarações públicas antes da hora marcada para o início
da greve, depois de uma semana de intensos ataques de parte a parte.
Ainda na quinta-feira, o sindicato acusava o secretário de Estado
dos Transportes de ter proferido afirmações falsas numa entrevista
à SIC. E, por isso, exigia que Sérgio Monteiro pedisse desculpa ou
apresentasse provas do que dissera em tribunal.
O Presidente da
República também veio fazer manifestar a sua posição sobre este
braço-de-ferro, deixando no ar a ideia, já defendida pelo Governo,
de que esta greve poderá obrigar a uma reestruturação da
companhia. “Deus queira que na TAP não aconteça aquilo que
aconteceu noutros países da União Europeia, em que as companhias de
aviação foram forçadas a realizar despedimentos muito
significativos e a cortar nas rotas”, disse Cavaco Silva.
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