Ministério dos Negócios Estrangeiros diz à Embaixada dos Emirados Árabes Unidos para demolir obras ilegais
Em causa trabalhos feitos
pela embaixada no Príncipe Real e contestados pelo dono do imóvel vizinho e um
grupo de cidadãos
Inês Boaventura / Público/ 20 dez 2013
O presidente da Câmara de Lisboa enviou uma carta ao
ministro Rui Machete, na qual sustenta que as obras da Embaixada dos Emirados
Árabes Unidos foram realizadas sem o necessário licenciamento municipal, pelo
que devem ser demolidas. O Ministério dos Negócios Estrangeiros já transmitiu
essa informação à embaixada, solicitando-lhe que actue “em conformidade”.
Em causa está o facto de aquela entidade ter construído, no
exterior do edifício que ocupa na Praça do Príncipe Real, em Lisboa, uma
estrutura metálica ( já parcialmente retirada), uma caixa de elevador e um
barracão de metal que várias janelas, uma porta e escadas do palacete do lado.
O proprietário desse imóvel é o empresário libanês Nabil Aouad, que denunciou a
situação em Setembro, através do PÚBLICO, depois de várias tentativas
infrutíferas para resolver o problema diplomaticamente e sem o tornar público.
Desde então, a Câmara de Lisboa sempre recusou prestar
esclarecimentos sobre o assunto, com o argumento de que devia ser o Ministério
dos Negócios Estrangeiros (MNE) a fazê-lo. Logo em Setembro, o Ministério fez
saber que tinha recordado à embaixada que “deveria solicitar o prévio
licenciamento para quaisquer trabalhos” efectuados nos seus edifícios e
“proceder à suspensão de quaisquer obras em curso que estivessem a decorrer sem
as devidas autorizações municipais”. Nada disso aconteceu.
Entretanto foram surgindo várias vozes contra a intervenção
da Embaixada dos Emirados Árabes Unidos, incluindo a do crítico de arte
Alexandre Melo, do engenheiro João Appleton, do olissipógrafo José Sarmento de
Matos e da galerista Cristina Guerra, que se uniram em torno de um movimento
intitulado Em Defesa do Príncipe Real. Foi também lançada uma petição na
Internet, contra aquilo que se diz ser um “abuso de poder e desrespeito do
património”, que recolheu 1178 assinaturas.
O movimento contra as obras ilegais da embaixada conseguiu
que o Rui Machete tomasse posição
Já em Novembro, foi a vez de a Direcção-Geral do Património
Cultural concluir, depois de uma visita ao local, que os trabalhos
desenvolvidos revelavam “um total incumprimento da legislação aplicável, além
do desrespeito pelos critérios, normas e convenções pelos quais se regem as
boas práticas de intervenção no património cultural imóvel”.
Vendo que nada disso surtia efeito, Nabil Aouad e o seu
advogado solicitaram uma reunião com o ministro dos Negócios Estrangeiros.
Segundo o empresário, nesse encontro Rui Machete disse-lhes que tinham perguntado
à Câmara de Lisboa se a demolição era a única solução para as obras ilegais,
acrescentando que se assim fosse exigiria ao embaixador Nasser Alraisi que a
concretizasse.
Depois disso, o libanês e o seu representante legal, José
Miguel Júdice, reuniram-se com António Costa. Na sequência do contacto de Rui
Machete e dessa reunião, o presidente da Câmara de Lisboa escreveu, a 12 de
Dezembro, uma carta na qual afirma que aqueles trabalhos foram realizados em
desrespeito do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, pelo que devem ser
demolidos.
“António Costa foi inteligente, rápido, decisivo e
profissional. Geriu esta crise como um bom presidente de câmara”, declarou
Nabil Aouad ao PÚBLICO. O empresário acredita que esse foi um passo decisivo
para resolver um problema que se arrastava há meses. “Esta não é uma batalha
contra os Emirados Árabes Unidos, pelos quais tenho muito respeito. É uma
batalha contra o embaixador, que revelou prepotência e falta de sensibilidade,
de respeito e de civismo. E que não honrou o compromisso que tinha feito de que
iria retirar as construções”, frisa o libanês, que se estabeleceu em Lisboa há
24 anos.
Questionado sobre o que o ministro Rui Machete iria fazer
com a carta de António Costa, a sua assessora de imprensa respondeu que “a
informação que consta da carta mencionada foi transmitida à Embaixada dos
Emirados Árabes Unidos, tendo o Ministério dos Negócios Estrangeiros solicitado
que aquela embaixada agisse em conformidade”. A assessora acrescentou que “esta
é uma questão que o MNE continua a tratar com a necessária reserva que os
assuntos respeitantes à segurança e integridade das missões diplomáticas
obrigam no respeito pela legislação nacional, incluindo a Convenção de Viena
sobre Relações Diplomáticas de 1961” .
De acordo com um dos interveninentes neste processo, que não
quer ser identificado, a embaixada “não tem agora outra alternativa” senão
demolir as obras em causa. Não o fazer, diz, “seria um acto altamente
inamistoso”, que não deixaria ao Governo português outra hipótese que não fosse
“declarar o embaixador persona non grata e dizer-lhe que tem de abandonar o
país”. A Embaixada dos Emirados Árabes Unidos não respondeu às perguntas do
PÚBLICO sobre este assunto.
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