quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Primeiro foi Durão Barroso no Algarve. Ontem foi um alto responsável do Eurogrupo: "TC é um tribunal activista". Barroso diz que está o “caldo entornado”, se Portugal não der continuidade às medidas de austeridade. O FMI calcula que o Estado português precisa, entre 2013 e 2015, de garantir um financiamento equivalente a 65,9% do PIB


O caldo está muito entornado. Bruxelas e Eurogrupo disparam balas reais contra o Tribunal Constitucional
Primeiro foi Durão Barroso no Algarve. Ontem foi um alto responsável do Eurogrupo: "TC é um tribunal activista"
Por António Ribeiro Ferreira
publicado em 9 Out 2013
in ( jornal ) i online

Convergência de pensões públicas e privadas.
Cortes nas pensões de sobrevivência. Regime de mobilidade na nova versão. Cortes salariais dos trabalhadores do Estado. Horário de trabalho de 40 horas. São os cortes na despesa confirmados nas oitava e nona avaliações para se cumprir o défice de 4% em 2014 e preparar o país para o famoso pós-troika. Medidas que, sem excepção, vão parar ao Tribunal Constitucional e que, pela prática anterior, arriscam ser chumbadas pelos juízes do Palácio Ratton. Há um plano B do governo aos chumbos? Não. Há um plano B do Eurogrupo aos chumbos? Não. Portugal recebe a tranche de 5600 milhões em Novembro com os chumbos? Não. A partir daí o caldo está entornado, como afirmou o presidente da Comissão Europeia este fim-de--semana no Algarve. Outra vez entornado. E mesmo um dramático segundo resgate não é automático. O governo tem de o pedir e os estados-membros do Eurogrupo têm que o aceitar. Ainda por cima, disse ontem um alto responsável do Eurogrupo, o Tribunal Constitucional português, ao contrário de outros, "é activista relativamente aos funcionários públicos e às suas condições de emprego". Por outras palavras, é um tribunal político que toma decisões em função da ideologia da maioria dos seus juízes.

Europa entra na guerra
A guerra interna entre os órgãos de soberania é um facto antigo e conhecido. Nos últimos tempos, o Tribunal Constitucional chumbou medidas aprovadas pelo parlamento por proposta do governo. Foram os cortes dos subsídios de Natal e de férias e mais recentemente o novo regime de mobilidade especial. As decisões dos juízes do Palácio Ratton têm sido fortemente criticadas pelo primeiro-ministro e por altos responsáveis da maioria. O que é completamente novo é a franqueza dos ataques da Comissão Europeia e do Eurogrupo ao Tribunal Constitucional. Se em relatórios de avaliações anteriores já eram feitas referências críticas a algumas decisões, o caldo entornou-se definitivamente com o recente chumbo do regime de mobilidade especial que admitia o despedimento de funcionários ao fim de um ano na mobilidade. E com as ameaças de chumbo às principais medidas já conhecidas e que representam cortes da ordem dos 4700 milhões.

Um beco sem saída
 Algo inédito no conjunto dos países sob resgate e que podem conduzir Portugal a um beco sem saída. E isto porque um eventual segundo resgate implica necessariamente medidas de austeridade ainda mais duras e que arriscam ser chumbadas pelo Tribunal Constitucional. Um nó impossível de desatar num país em bancarrota e que só pode cumprir os seus compromissos mais básicos com o dinheiro emprestado pelos credores. Por isso mesmo, os responsáveis europeus decidiram pôr fim à diplomacia e passaram ao ataque, sem medo das palavras. "O fogo cerrado, com balas reais", como referiu ao i uma fonte em Bruxelas, "vai continuar até o Tribunal Constitucional perceber de uma vez por todas que Portugal está a viver há anos uma situação de emergência."

Mercados só no Ano Novo
 Voltando ao alto responsável do Eurogrupo, as suas afirmações são também muito significativas relativamente ao eventual regresso aos mercados de Portugal e se o assunto já estaria em cima da mesa dos países da moeda única. Para o referido alto responsável, ainda é manifestamente cedo para abordar a questão, garantindo que "a discussão só terá lugar no ano novo". Por outras palavras, só depois de se conhecerem as decisões do Tribunal Constitucional e o Orçamento do Estado de 2014 estar em vigor é que o Eurogrupo analisará o futuro imediato de Portugal, não só os meses até Junho, fim do programa de assistência, como o pós- -troika.

FMI alerta zona euro

Com este aceso debate em curso, o FMI avisou ontem que a zona euro ainda corre o risco de entrar em estagnação e que poderá ser necessário dar mais tempo a alguns países para cortarem os défices se o crescimento ficar abaixo do esperado. Na actualização às projecções para a economia mundial divulgadas com o World Economic Outlook, a instituição melhora 0,1 pontos percentuais a projecção para a recessão económica na área do euro, esperando agora que a economia caia 0,4% este ano. A organização mantém a estimativa de regresso ao crescimento em 2014 para os países que partilham a moeda única europeia, mantendo a perspectiva de que a economia cresça 1% no conjunto do ano

Barroso diz que está o “caldo entornado”, se Portugal não der continuidade às medidas de austeridade
IDÁLIO REVEZ 05/10/2013 – in Público

Comissão Europeia prepara uma "missão para o crescimento" de ajuda a Portugal, mas os empresários queixam-se que a banca não financia.
O regresso de Portugal aos mercados está pendente da capacidade de “cumprir os passos que estão previstos” nas reformas delineadas pela troika na oitava e nova avaliações.

O presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, salienta que o recado é válido para “todos”, incluindo o Tribunal Constitucional. “É obvio que Portugal tem de fazer um esforço como Estado, não se pode pedir apenas responsabilidade do Governo – é responsabilidade de todos órgãos de soberania e da sociedade no seu conjunto.” A instabilidade social e a “falta de determinação”, disse, representam “um risco político” a ter em consideração. Mas a política baseada “apenas na consolidação orçamental", reconheceu, “não é suficiente” para relançar a economia.

À margem do Fórum Empresarial do Algarve, a decorrer em Vilamoura, Durão Barroso lembrou que os “mercados reagiram muito negativamente, quando surgiram dúvidas quanto à dificuldade do país realizar o programa de ajustamento”.

Recusando-se a entrar directamente na analise da política portuguesa, Barroso remeteu as questões relacionados com os chumbos do Tribunal Constitucional para o relatório feito de “alertas” elaborado pelos economistas da Comissão Europeia (CE), Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional. “A análise dessas instituições é clara: se Portugal não cumprir os passos que estão previstos, há um problema que vai gerar dificuldade em voltar aos mercados.” A instabilidade leva à insegurança junto dos investidores e quem paga é o país credor que vê reduzidas as fontes de financiamento. “Quando as pessoas começam a duvidar, começam a vender dívida pública portuguesa, os juros começam a aumentar e lá temos outra vez o caldo entornado.”

Durante a sua intervenção neste fórum, que reúne mais de três centenas de empresários portugueses e estrangeiros, o presidente da CE afastou qualquer hipótese de implosão da moeda europeia. “Qualquer ameaça está completamente afastada”, disse.

Do conjunto dos países que mais expostos têm estado à crise, salientou como dado “positivo” os resultados alcançados pela Espanha, um Estado onde a exportação de bens e serviços “representa hoje 33% do PIB, a percentagem mais elevada desde a introdução do euro”.

Em contraponto ao optimismo de Barroso, o ex-ministro socialista e antigo administrador da Galp Murteira Nabo criticou a falta de financiamento às empresas para que estas possam conquistar mercados. Barroso respondeu desculpando-se com a velocidade lenta a que circula a política europeia, salvaguardando que a União Europeia(UE) representa 28 democracias, cada qual com a sua cultura. Em relação a Portugal, criticou os que defendem o afastamento da moeda única.  

“Se Portugal não estivesse na zona euro ou na UE, estaria a aplicar medidas muito próximas daquelas que tem vindo a aplicar.” Quando um país atinge uma divida superior a 120% do PIB, e tem problemas estruturais de competividade, “é óbvio que tem de promover contenção orçamental, mas também reformas estruturais para a competitividade”, afirmou.
Por fim, Barroso prometeu que se iria empenhar “activamente” em promover o investimento e fomentar parcerias com empresas nacionais. Para isso, encarregou o vice-presidente da CE, António Tajani (responsável pela indústria e empresas), de se deslocar a Portugal, nos próximas dias 28 e 29 de Novembro, com o objectivo de organizar uma “missão para o crescimento”, envolvendo 220 empresas estrangeiras interessadas em investir no país.
.


Necessidades de financiamento de Portugal até 2015 são mais do dobro das da Irlanda


O FMI calcula que o Estado português precisa, entre 2013 e 2015, de garantir um financiamento equivalente a 65,9% do PIB
Os novos empréstimos que Portugal terá de obter até ao final de 2015 para fazer face às suas necessidades de financiamento são, em percentagem do PIB, mais do dobro daquilo que precisa a Irlanda, o outro país do euro que procura neste momento concretizar um regresso aos mercados.
De acordo com o relatório Fiscal Monitor, publicado ontem pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o Estado português terá de obter, entre 2013 e 2015, financiamento bruto equivalente a 65,9% do PIB anual do país (cerca de 110 mil milhões de euros). A Irlanda, no mesmo período de tempo, apresenta necessidades de financiamento estimadas pelo FMI em 30,5% do PIB anual do país.
Estes números revelam uma enorme diferença de circunstâncias entre os dois países que têm manifestado a intenção de, no final dos seus actuais programas com a troika, obterem o dinheiro de que necessitam através do recurso aos mercados.
Os 65,9% calculados pelo FMI para Portugal (um dos membros da troika) são o valor em percentagem do PIB que o Estado precisa para, por um lado, substituir a dívida pública que atinge a maturidade e, por outro, para fazer face aos novos défices que irá registar nas suas contas públicas.
Obter todo esse dinheiro nos mercados, sem um novo pacote de crédito concedido pela troika, é no caso português uma tarefa que exige a realização de emissões de dívida de elevada dimensão com uma grande regularidade. No caso irlandês, com menos de metade do volume (em percentagem do PIB) de emissões por fazer, a pressão para conseguir o acesso aos mercados é, à partida, menor.
O programa irlandês chega ao fim no final deste ano, o português em Junho de 2014. Ambos os países mostraram intenção de se candidatarem a um programa cautelar junto da zona euro. Nesse caso, o acesso aos mercados seria feito com o apoio de uma garantia dada pelo mecanismo de estabilização financeira, ao mesmo tempo que o BCE se disponibilizava para dar uma ajuda comprando obrigações no mercado secundário.
De acordo com o FMI, em 2013, ano para o qual o Governo disse já não precisar de mais empréstimos, as necessidades de financiamento chegam aos 23,3% do PIB. Em 2014 serão 22,1% e em 2015 20,5%.
Portugal supera também a Grécia neste indicador (o Estado grego precisa de 64,8% até 2015) e apenas é ultrapassado na zona euro pela Itália.
No primeiro lugar da lista de países classificados como avançados pelo FMI está, a grande distância, o Japão, que tem necessidades de financiamento equivalentes a 170,7% do PIB entre 2013 e 2015. A seguir surgem a Itália e os Estados Unidos. Portugal ocupa o quarto lugar, imediatamente acima da Grécia, que segundo as contas do FMI terá necessidades de financiamento de 64,8% até 2015.
No relatório ontem publicado, o FMI revela que no caso de Portugal, uma das principais fragilidades orçamentais está precisamente na dimensão das necessidades brutas de financiamento do país. Com alerta vermelho surge também o nível da dívida, o potencial de crescimento e o nível das taxas de juro.

Sem comentários: