CRÓNICA
O juiz que me condenou
JOSÉ ANTÓNIO
CEREJO 06/05/2015 -
Tinha muitos
defeitos o Oscar. Alguns confundiam-se com virtudes: por vezes assumia uma
espécie de superioridade intelectual em relação aos demais, mas ele era
intelectualmente superior; outras vezes arrasava quem se lhe opunha com uma ironia
que raiava o desprezo — ou mesmo a brutalidade, mas fazia-o por convicção, com
profunda convicção, não por altivez. A frontalidade, a cultura enciclopédica, a
fidelidade às causas em que acreditava, acima de todas elas a da liberdade,
eram as marcas que melhor o definiam.
Não era um homem
de meias tintas. As suas opiniões, muitas vezes contra-corrente, não deixavam
ninguém indiferente: Nem como dirigente e activista sindical, nem como
jornalista que nunca abdicou dos seus direitos enquanto cidadão, nem como
provedor do leitor do Diário de Notícias, nem como comentador de tudo o que
entendia comentar, incluindo música clássica e comes e bebes, nos jornais, no
facebook, em toda a parte.
Nunca fui
propriamente um amigo pessoal do Oscar. Encontrávamo-nos no sindicato, num ou
noutro debate, num ou noutro funeral de outros da nossa geração.
Dele recordo,
sobretudo, um episódio que a meu ver o define como poucos outros. Estávamos no
fim dos anos 90 do século passado e ele presidia ao Conselho Deontológico do
Sindicato dos Jornalistas. Anos antes, precisamente quando foi aprovado o
Código Deontológico da nossa classe, eu também integrara esse órgão, então
presidido por Daniel Reis. E continuava a pertencer a outros órgãos do
sindicato, onde o Oscar também estava. De nada me serviu, nem eu aceitaria que
me servisse.
O Conselho
Deontológico recebeu uma queixa de um ex-governador civil de Beja a quem eu
havia feito a vida negra e os conselheiros fizeram o seu trabalho. No final fui
admoestado numa resolução tornada pública e mais tarde usada em tribunal,
contra mim, pelo dito ex-governador civil, de seu nome António Saleiro.
Não foi
propriamente uma condenação. Mas o conselho, em particular o Oscar, entenderam
que eu não tinha cumprido todos os meus deveres deontológicos por só ter feito,
por escrito, 30 ou 40 perguntas ao dito senhor, que depois perdeu todos os
processos judiciais que moveu contra mim e contra o PÚBLICO. Não gostei da
decisão do conselho, como é natural.
O Oscar
convidou-me para almoçar e discutimos acaloradamente o assunto até meio da
tarde. Ele achava que eu devia ter continuado a perguntar. E eu perguntava-lhe:
até quando? E quando é que escreveria a notícia? Ele manteve-se na dele e eu na
minha.
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