Os labirinticos e secretos corredores
da “Irmandade” na Direcção-Geral de Infra-estruturas e equipamentos.
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A rede. Dos “Pingas” à maçonaria,
todas as ligações do esquema
A
procuradora Inês Bonina escreve algo deste género no início do despacho: o
processo que envolve João Correia é impróprio para mentes simples.
10/05/2015 / Jornal i online
O Ministério
Público acredita que, para retirar dividendos públicos em proveito próprio e
dos seus cúmplices, João Correia montou
um esquema “excepcionalmente complexo” a partir da Direcção-Geral de
Infra-estruturas e equipamentos.
Ele, o principal
arguido, terá recorrido a uma rede de contactos que estabeleceu ao longo dos
anos: da maçonaria à universidade, passando pela sua terra natal, Ordem dos
Arquitectos e, last but not least, o grupo de convívio “Os Pingas”. Como e onde
se cruzam os 12 suspeitos?
João Alberto
Correia
83 crimes
Num policial,
caber-lhe-ia o papel de “cabecilha” do grupo. João Correia chegou à direcção da
DGIE pela mão de Rui Pereira – e não de Miguel Macedo, como o i chegou a
escrever. Foi depois reconduzido pelo social--democrata, no final de 2012. O MP
acredita que, desde a primeira hora, fez uso de “amizades” e conhecimentos para
pôr em marcha um esquema de “troca de favores” e partilha indevida de verbas
públicas.
Albino Rodrigues
37 crimes
A par de Luísa de
Sá Gomes, Albino Rodrigues seria também um braço-direito de João Correia dentro
da DGIE. Além dos almoços e jantares nos convívios organizados pelos membros do
“Pingas” e partilhados com o amigo arquitecto (faziam ambos parte do grupo), o
técnico superior e o ex--director-geral da DGIE tinham um tipo de ligação mais
profunda: eram ambos maçons, “estando ligados por essa qualidade e pelos
deveres de obediência e lealdade que essa organização professa”, sublinha a
procuradora. Na verdade, em Maio de 2012, por despacho de João Correia, Albino
Rodrigues, actualmente com 58 anos, foi nomeado para chefiar a divisão de obras
da DGIE por alegada “urgente conveniência de serviço”.
Luísa de Sá Gomes
4 crimes
Esta funcionária
pública de 50 anos, mestre em Direito, foi chamada à DGIE pelo próprio João
Correia. A procuradora não é clara nem quanto à forma como os dois se
conheceram nem quanto ao momento, apesar de ambos terem anos de trabalho nos
gabinetes do Ministério da Administração Interna – entre 2008 e 2011, Luísa de
Sá Gomes foi directora de serviços na Unidade Ministerial de Compras da
Secretaria--Geral do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Já no final do processo, refere o despacho de acusação, a responsável jurídica
na direcção-geral terá tentado apagar o rasto das múltiplas irregularidades
cometidas nos processos de adjudicação de contratos da DGIE. Também terá
continuado a cumprir as orientações de João Correia, mesmo depois de este ter
cessado as funções de director-geral naquele organismo público.
Henrique Oliveira
37 crimes
É o mais novo dos
12 arguidos (tem 35 anos). Empresário de profissão, membro do “Pingas”, no
currículo acumula outro pormenor: maçon, e, por essa via, “irmão” de João
Correia. O nome de Henrique Oliveira surge nos corpos sociais de várias
empresas directa e indirectamente envolvidas nos contratos de reestruturação
dos antigos governos civis, adjudicados pela DGIE. A saber: é sócio-gerente da
Primenext, director--geral da Interclima, sócio-gerente da Think Attitude,
sócio da PH Set Lda., gerente de facto da A. Magarinhos. Várias das empresas
que venceram os contratos da DGIE acabaram por subcontratar a Primenext para
realizar as obras projectadas.
José Leal
3 crimes
Os caminhos de
José Leal e João Correia cruzaram-se em 2011. Dois anos antes, o empresário da
Lousada conhecera Rui Correia, irmão do principal arguido no processo. Rui pôs
os dois em contacto e, no mesmo ano em que foram apresentados, José Leal
“efectuou uns trabalhos” para João Alberto Correia que, à data, era responsável
da Escola Superior Gallaecia. O seu nome está “directamente ligado a duas
empresas favorecidas” no processo: é sócio--gerente da José Leal – Sociedade de
Construções, Lda. (fundada em 1998) e da empresa Inexec – Sociedade de
Construções, Lda. (criada cerca de dois anos depois). Em causa estão seis
concursos atribuídos a estas duas empresas.
José Machado
3 crimes
Não sendo a mais
longa amizade que João Correia tem no grupo, já soma alguns anos. A relação do
ex-director--geral da DGIE com José Machado remonta, pelo menos, ao ano de
2005. Como os dois se conheceram, não é claro. Mas a procuradora aponta para
dados relevantes: o empresário terá, por diversas vezes, realizado “trabalhos
de construção civil” para a DGIE sem que algum contrato tivesse sido assinado
ou que houvesse sequer concurso para o efeito. José Machado era vice--presidente
da Joaquim Sá Machado & Filhos, S.A. Entre eles terão combinado inflacionar
valores de obras e acertado resultados de concursos que se queriam públicos.
Ricardo Nobre
5 crimes
Ricardo Nobre é
mais um dos amigos do “Pingas”, tendo, nesse âmbito, partilhado momentos de
convívio com João Correia. Além disso, o empresário leiriense, de 37 anos, é
sócio-gerente da Mudastone, Lda. desde a fundação, em 2007. A Mudastone terá
entrado no esquema de duas formas: primeiro, “vencendo” directamente dois
concursos lançados pela DGIE; segundo, sendo subcontratada pelas empresas
ERGSilva, Lda. e Blue Bee, Lda. para a tal reestruturação de antigos governos
civis – o modelo-base de todo o esquema.
Bruno Cerqueira
2 crimes
João Alberto
Correia deu aulas na Faculdade de Arquitectura e Artes da Universidade Lusíada.
Foi aí, no meio académico, que o arquitecto estabeleceu os primeiros contactos
com Bruno Cerqueira. Um era professor, o outro foi aluno. Esse momento
aconteceu nos primeiros anos da década de 1990, mas a amizade que nasceu ainda
no milénio passado estendeu-se até aos dias de hoje – além da amizade, os dois
partilham, de resto, a mesma profissão: arquitecto. Foi o ex--aluno quem, a determinado
momento, se deslocou aos locais das futuras obras para determinar o que seria
feito e a que preço – quando era. Essa função, até à chegada de João Correia à
DGIE, caberia aos técnicos daquela direcção-geral.
Luís Fróis
5 crimes
Luís Fróis: director
de operações, 40 anos. Era gerente da Tetmei mas, para adensar a trama,
colaborava também com a Nextinforman e com a Informantem – empresas que se
enredariam num jogo de contratação e subcontratação alegadamente orquestrado
com antecedência entre Fróis, Henrique Oliveira e Henrique Muacho. Estes dois
últimos reunir-se--iam nos almoços do “Pingas”, mas a procuradora deixa Fróis
de fora desse grupo. Onde seriam delineadas as movimentações, fica em aberto,
tal como a origem clara da ligação a João Correia.
Henrique Muacho
7 crimes
O gestor de
empresas completa 44 anos nos próximos dias. É mais um entre os cerca de dez
membros do “Pingas” identificados pela procuradora Inês Bonina. E, tal como
outros camaradas de convívios, Muacho tem o seu nome vinculado a duas empresas
que terão beneficiado do esquema alegadamente montado por João Alberto Correia.
Neste caso, Henrique Muacho é presidente do conselho de administração da
Nextinforman Infraestruturas, SA, e gerente da S.T.M.I. – Sociedade Técnica de
Manutenção Informática, Lda. Esta última detinha ainda participação maioritária
numa terceira empresa, a Tetmei (ligada a outros arguidos).
Carlos Farófia
9 crimes
Carlos Farófia
tem menos cinco anos que João Correia, mas isso não impede que estejam unidos por
uma amizade de décadas. Os dois cresceram juntos em Reguengos de Monsaraz,
conheceram-se ainda jovens e trazem desses tempos uma ligação que não se perdeu
até aos dias de hoje. À imagem de vários outros arguidos, Farófia está
“directamente ligado a duas empresas favorecidas” pelo ex--director da DGIE: é
sócio e gerente da Lostipak – Construção, Carpintaria e Manutenções Técnicas
(assumiu a gerência em Setembro de 2011) e sócio-gerente da Divicode Lda. desde
a constituição da empresa, em 2013. Foram ambas subcontratadas por outras duas
(a Taer, Lda., e a Manuel Joaquim Malheiro, Lda.) em concursos da DGIE.
Manuel Saldanha
1 crime
Foi a Ordem dos
Arquitectos que juntou estes dois profissionais. Conheceram-se há cerca de 12
anos e, em 2009, partilharam experiências mais próximas ao integrarem uma lista
de candidatura aos órgãos da Ordem – que saiu vitoriosa da eleição. Saldanha
foi eleito presidente do Conselho Nacional de Disciplina, enquanto Correia foi
eleito vogal do Conselho Fiscal. João Correia terá adjudicado “projectos de
arquitectura a empresas e ateliês indicados por projectistas e arquitectos do
seu círculo de conhecimentos e com quem mantinha relações de amizade”. Saldanha
– sócio-gerente de uma empresa da área, seria um deles. Os contornos dos
serviços terão sido previamente acertados antes do concurso público.
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