Carlos Alexandre teme estar a ser
espiado por organização secreta
ANA HENRIQUES
06/05/2015 - PÚBLICO
Juiz
mencionou as suas suspeitas a procuradora do Tribunal da Relação que arquivou
denúncia anónima contra si.
O juiz Carlos
Alexandre disse a uma procuradora do Tribunal da Relação de Lisboa que teme
estar a ser espiado por uma organização secreta.
Quando a
magistrada o interrogou sobre quem seriam os autores de uma carta anónima em
que o juiz era visado, Carlos Alexandre desvendou, ainda que de forma vaga, as
suas suspeitas. É que embora alguns dos detalhes mencionados na missiva
pudessem facilmente ser obtidos através da leitura de notícias de jornal ou de
outras fontes de informação disponíveis a qualquer cidadão, outros que dela
constam, como o número do processo atribuído pela justiça à primeira denúncia,
ou a referência à identidade dos convivas presentes nas jantaradas de
confraternização em que costuma participar com os seus conterrâneos de Mação, e
ao que ali é dito, já constituem informação privilegiada a que nem toda a gente
tem acesso. A isto o juiz chamou “uma espécie de garde à vue [termo francês
usado para prisão preventiva, mas que também significa sob vigilância] própria
de organizações secretas ou que na prática se comportam como tal”.
A magistrada que
arquivou a denúncia anónima entendeu que ela podia ser encarada como uma
vingança ou uma forma de pressão, tendo como “único fito” a desacreditação do
magistrado.
O magistrado que
viu o seu cão ser envenenado há mês e meio – e pelas mãos de quem têm passado
os casos mais mediáticos da justiça portuguesa – reagia a uma segunda denúncia
anónima de que foi alvo, a qual desencadeou um inquérito no Ministério Público
junto do Tribunal da Relação de Lisboa entretanto arquivado. Segundo a carta
não assinada, enviada para a Procuradoria-Geral da República e também para os
seus serviços distritais de Lisboa, Carlos Alexandre estaria nas mãos de um
jornalista da revista Sábado depois de este ter descoberto factos
comprometedores relacionados os seus bens pessoais, não lhe tendo restado
alternativa senão comprar o seu silêncio passando-lhe informação privilegiada
sobre os processos judiciais.
Datada das
vésperas do Natal passado, a missiva parece ser o desenvolvimento de uma
primeira denúncia anónima contra o juiz enviada aos mesmos serviços pouco tempo
antes e mencionando sucessivas violações do segredo de justiça por parte do
magistrado, que teria por hábito almoçar com jornalistas para lhes passar
informações. Nesta segunda denúncia, feita antes de a primeira ter sido
arquivada pelo Ministério Público, à alegada violação do segredo de justiça
somam-se suspeitas de corrupção e tráfico de influências. Entre os indícios
comprometedores descobertos pelo jornalista estaria “uma conversa/negociação
tida entre um representante da família Espírito Santo e o dito juiz em Mação”,
terra natal do magistrado, logo no início da Operação Furacão, em 2005.
Nas declarações
que prestou em Março passado, na qualidade de testemunha, à procuradora no
Tribunal da Relação encarregue de investigar a veracidade dos factos relatados
na carta anónima, Carlos Alexandre optou por fazer uma espécie de strip-tease
financeiro, explicando quanto ganhava, qual o salário da mulher, que chefia uma
repartição de finanças, e indicando os encargos do casal: empréstimos para
comprar habitação e apartamento de férias, prestação do automóvel, que troca de
cinco em cinco anos, e por aí fora. O magistrado habituou-se a acumular
funções, e até ao ano passado trabalhava
nas varas criminais de Lisboa, no Tribunal Central de Instrução
Criminal, por onde passam os processos mais pesados, e ainda no Tribunal de
Instrução Criminal.
Foi assim que
conseguiu ir fazendo face às despesas quotidianas, explicou. Sempre com os
cuidados que o melindre das funções que exerce exigem: a Caixa Geral de
Depósitos, onde abriu uma conta bancária juntamente com a mulher, tem ordens
para não aceitar depósitos que não os efectuados pelo casal e respectivas entidades
empregadoras, ou os reembolsos de despesas de saúde. “Tem-se cuidado”, como já
o aconselharam. Carlos Alexandre negou ter algum dia ficado refém de quem quer
que seja, jornalista ou não. “Nem de qualquer congregação ou obediência”, fez
questão de dizer. E sublinhou tratar-se da primeira vez na sua vida que foi
acusado de corrupção.
Sem comentários:
Enviar um comentário