BES. Um contributo para a
regeneração
Numa altura em que se fala tanto
da crise de representação, os deputados da CPI ao BES deram um contributo para
a regeneração do regime pondo de lado interesses partidários.
Luís Rosa / luis.rosa@ionline.pt / 2-5-2015 / I online
Escrevi neste
espaço a 17 de Novembro, primeiro dia das audições da comissão parlamentar de
inquérito (CPI) ao BES, que a grande dúvida da CPI era: “PSD, PSe CDS deixarão
que o regime por eles criado seja posto a nu? Como a democracia é a pior forma
de governo à excepção de todas as outras que já foram experimentadas, o sucesso
desta CPI dependerá essencialmente [...] dos deputados Miguel Tiago (PCP) e
Mariana Mortágua (BE).”
A resposta à
grande dúvida foi claramente positiva. Para bem do regime e da democracia
representativa – tão maltratada pelos
eleitos nos últimos anos –, os deputados do Bloco Central e os dos partidos
contestatários conseguiram ultrapassar as quezílias partidárias e uniram-se na
busca da verdade. Apesar da eficácia de Mariana Mortágua (a grande revelação da
comissão) e de Miguel Tiago, o sucesso da CPI foi igualmente definido pelos
coordenadores Carlos Abreu Amorim (PSD), Pedro Nuno Santos (PS) e Cecília
Meireles (CDS) e pelo relator, Pedro Saraiva (PSD).
Numa altura em
que se fala tanto da crise da representação, a regeneração do regime também
passa pela capacidade dos partidos de porem o interesse nacional acima dos
interesses partidários. Os deputados da CPI conseguiram fazê-lo e, nesse
sentido, são um exemplo para os colegas parlamentares.
Das principais
conclusões da CPI, retira-se um dado óbvio: Ricardo Salgado é o principal
responsável pelo descalabro do Grupo Espírito Santo (GES), muito por culpa da
sua gestão centralizadora, que lhe dava conhecimento de tudo o que se passava
de relevante no GES e no BES. Esta conclusão, apesar de óbvia, não pode ser desvalorizada.
Muito mais quando há quem tente fazer dos reguladores os principais
responsáveis pelos fortes indícios de má gestão e fraude que estiveram na
origem da falência do GES e da injecção de 4,4 mil milhões de euros no Novo
Banco.
Esse é também um dos
maiores contributos da CPI e pode ser traduzido numa simplificação eficaz: a
responsabilidade dos polícias nunca é a mesma que a dos supostos ladrões. Foram
os responsáveis pela gestão que terão enganado os investidores do papel
comercial e foram os gestores que terão escondido informação aos accionistas
não Espírito Santo do BES e dos GES. Em suma, foram os gestores que geriram
mal, praticando irregularidades e até crimes, que devem ser responsabilizados. Tentar
apontar responsabilidades aos reguladores (seja o governador Carlos Costa, seja
Carlos Tavares) ao mesmo nível da dos gestores é tentar manipular a informação
de forma grosseira.
É verdade que a
estratégia de Carlos Costa para evitar o caso BES falhou, mas isso não faz com
que o governador do Banco de Portugal (BdP) tenha a mesma responsabilidade de
quem provocou a derrocada do GES. Mas também é igualmente certo que a medida da
resolução foi a mais correcta e a única que impede que os contribuintes estejam
a pagar pelos crimes da gestão de Ricardo Salgado.
A CPI não
conseguiu, contudo, por a nu todas as ramificações do caso BES. Verdade seja
dita, esse trabalho dificilmente poderia ser feito em apenas seis meses. Mas
conseguiu-se reunir um acervo documental e depoimentos que poderão ser úteis ao
Ministério Público para descobrir o que falta – o que é muito. Mas antes das
conclusões judiciais faltam-nos a conclusão dos processos de contra-ordenação
do BdP e a da CMVM. É a fase seguinte: a da responsabilização dos reguladores.
Os factos já apurados exigem multas e penas históricas.
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