sábado, 2 de maio de 2015

BES. Um contributo para a regeneração /Luís Rosa.


BES. Um contributo para a regeneração

Numa altura em que se fala tanto da crise de representação, os deputados da CPI ao BES deram um contributo para a regeneração do regime pondo de lado interesses partidários.

Luís Rosa / luis.rosa@ionline.pt / 2-5-2015 / I online

Escrevi neste espaço a 17 de Novembro, primeiro dia das audições da comissão parlamentar de inquérito (CPI) ao BES, que a grande dúvida da CPI era: “PSD, PSe CDS deixarão que o regime por eles criado seja posto a nu? Como a democracia é a pior forma de governo à excepção de todas as outras que já foram experimentadas, o sucesso desta CPI dependerá essencialmente [...] dos deputados Miguel Tiago (PCP) e Mariana Mortágua (BE).”

A resposta à grande dúvida foi claramente positiva. Para bem do regime e da democracia representativa –  tão maltratada pelos eleitos nos últimos anos –, os deputados do Bloco Central e os dos partidos contestatários conseguiram ultrapassar as quezílias partidárias e uniram-se na busca da verdade. Apesar da eficácia de Mariana Mortágua (a grande revelação da comissão) e de Miguel Tiago, o sucesso da CPI foi igualmente definido pelos coordenadores Carlos Abreu Amorim (PSD), Pedro Nuno Santos (PS) e Cecília Meireles (CDS) e pelo relator, Pedro Saraiva (PSD).

Numa altura em que se fala tanto da crise da representação, a regeneração do regime também passa pela capacidade dos partidos de porem o interesse nacional acima dos interesses partidários. Os deputados da CPI conseguiram fazê-lo e, nesse sentido, são um exemplo para os colegas parlamentares.

Das principais conclusões da CPI, retira-se um dado óbvio: Ricardo Salgado é o principal responsável pelo descalabro do Grupo Espírito Santo (GES), muito por culpa da sua gestão centralizadora, que lhe dava conhecimento de tudo o que se passava de relevante no GES e no BES. Esta conclusão, apesar de óbvia, não pode ser desvalorizada. Muito mais quando há quem tente fazer dos reguladores os principais responsáveis pelos fortes indícios de má gestão e fraude que estiveram na origem da falência do GES e da injecção de 4,4 mil milhões de euros no Novo Banco.

Esse é também um dos maiores contributos da CPI e pode ser traduzido numa simplificação eficaz: a responsabilidade dos polícias nunca é a mesma que a dos supostos ladrões. Foram os responsáveis pela gestão que terão enganado os investidores do papel comercial e foram os gestores que terão escondido informação aos accionistas não Espírito Santo do BES e dos GES. Em suma, foram os gestores que geriram mal, praticando irregularidades e até crimes, que devem ser responsabilizados. Tentar apontar responsabilidades aos reguladores (seja o governador Carlos Costa, seja Carlos Tavares) ao mesmo nível da dos gestores é tentar manipular a informação de forma grosseira.

É verdade que a estratégia de Carlos Costa para evitar o caso BES falhou, mas isso não faz com que o governador do Banco de Portugal (BdP) tenha a mesma responsabilidade de quem provocou a derrocada do GES. Mas também é igualmente certo que a medida da resolução foi a mais correcta e a única que impede que os contribuintes estejam a pagar pelos crimes da gestão de Ricardo Salgado.


A CPI não conseguiu, contudo, por a nu todas as ramificações do caso BES. Verdade seja dita, esse trabalho dificilmente poderia ser feito em apenas seis meses. Mas conseguiu-se reunir um acervo documental e depoimentos que poderão ser úteis ao Ministério Público para descobrir o que falta – o que é muito. Mas antes das conclusões judiciais faltam-nos a conclusão dos processos de contra-ordenação do BdP e a da CMVM. É a fase seguinte: a da responsabilização dos reguladores. Os factos já apurados exigem multas e penas históricas.

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