Às
vezes apetece desvotar
PEDRO SOUSA CARVALHO
15/05/2015 - PÚBLICO
“Um
faz, o outro desfaz; um monta o outro desmonta; um constrói e o
outro destrói. E nós votamos, ora num, ora noutro, mas às vezes só
apetece desvotar.”
PEDRO SOUSA CARVALHO
O PS, na oposição,
já faz de conta que é governo e o PSD, no poder, já prepara ser
oposição
Ninguém leva a mal
que os socialistas andem a brincar a ser governo antes de o ser. Como
ninguém com certeza levará a mal que os social-democratas já andem
a brincar a ser oposição antes de o ser. Aliás, ainda hoje, em
Vila Franca de Xira, o PSD vai organizar um debate insólito, com a
presença de Marcelo Rebelo de Sousa, subordinado ao tema “O
partido na oposição”. Quem teve a ideia de debater o tema ‘como
estar na oposição’ em véspera de eleições legislativas só
pode ser um génio da política.
Naturalmente que, à
medida que se aproxima a data das eleições, o Governo vai ficando
sem tempo e vai despachando à pressa o que ficou por fazer e a
oposição vai achando que o Governo tem cada vez menos legitimidade
para o fazer. Seja a privatização da TAP, seja a concessão dos
transportes, seja o que for.
Ainda ontem António
Costa duvidada da legitimidade do Governo para poder tomar uma
decisão sobre o futuro da TAP quando está tão perto de terminar a
legislatura. Para o secretário-geral do PS, o prazo de validade
desta maioria está a chegar ao fim e diz que “em condições
normais daqui a três semanas este Governo cessaria funções”. A
tese de Costa é que a Constituição prevê mandatos de quatro anos
e este Governo já vai levar um bónus de alguns meses extra de
governação. O problema é que a lei eleitoral determina como data
de eleições o período de 14 de Setembro a 14 de Outubro. Sempre
que há eleições antecipadas, como aconteceu em Junho de 2011, o
Governo eleito depois ganha alguns meses de bónus. O próprio
António Costa deve lembrar-se deste capricho eleitoral já que o
primeiro governo de José Sócrates, do qual ele fez parte, esteve a
governar quase cinco anos em virtude das eleições antecipadas que
se seguiram à queda de Santana Lopes.
Portugal tem neste
momento dois governos a governar o país ao mesmo tempo. Um que já é
e outro que acha que vai ser. Um, o do PSD/CDS, governa às segundas,
quartas e sextas e o outro, o do PS, às terças, quintas e sábados.
O primeiro é um governo eleito democraticamente e que tem toda a
legitimidade para governar até Setembro/Outubro, altura em que os
portugueses vão a votos dizer se querem continuar com este ou se o
querem trocar pelo outro. O segundo vai-se fiando nas sondagens e
pensa, também com igual legitimidade, que será governo daqui a
cinco meses.
À segunda-feira, o
Governo diz que vai privatizar a TAP e à terça o PS diz que é
contra a privatização. À quarta Passos Coelho diz que a
privatização é a única forma de salvar a empresa e à
quinta-feira os socialistas dizem que é preciso consultar Bruxelas
para saber se é possível uma injecção de dinheiros públicos. À
sexta-feira, o Governo faz ouvidos de mercador e abre o concurso para
vender 100% da TAP. Ao sábado, António Costa diz que “ninguém
pense em comprar mais de 49% da TAP”. E ao domingo já não os
podemos ouvir, nem a um, nem a outro. É uma irresponsabilidade do
lado do Governo avançar com uma operação desta monta sem tentar um
mínimo de consenso com o PS e é uma aberração a atitude dos
socialistas de tentar boicotar a venda com ameaças de reverter o
negócio quando chegarem ao poder. Não há paciência.
O mesmo se está a
passar com os transportes terrestres, com o PS a vir anunciar esta
semana que vai anular o concurso do Governo para a subconcessão a
privados do Metro de Lisboa e da Carris no caso de vencer as próximas
eleições legislativas.
Nestas coisas da
política a vingança serve-se fria. Ainda há dias António Costa
acusava o Governo PSD/CDS-PP de chegar ao poder “e achar que o país
era uma folha em branco”. O secretário-geral do PS dizia que o
Governo não foi capaz de conviver com nenhuma das marcas de sucesso
da governação socialista, dando como exemplo o Simplex e as Novas
Oportunidades. Os socialistas preparam-se para retribuir a cortesia.
Reformas como a do IRC, do quociente familiar, ou das freguesias, que
são bandeiras desta governação, também devem ser atiradas borda
fora caso o PS ganhe as eleições.
Um faz, o outro
desfaz; um monta o outro desmonta; um constrói e o outro destrói. E
nós votamos, ora num, ora noutro, mas às vezes só apetece
desvotar.
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