Nóvoa é o grand finale de Mário
Soares
Luís Osório 02/05/2015 / in (Jornal) i online
No fim da
apresentação da candidatura de Sampaio da Nóvoa, os funcionários do Teatro da
Trindade tiveram de esvaziar a sala. O tempo escasseava e um outro público
aguardava já pela sua vez de entrar para assistir ao clássico “À Espera de
Godot”, de Beckett. Vale o que vale, mas não deixa de ser um elemento
simbólico, o ex-reitor da Universidade de Lisboa, que citou Sérgio Godinho e
Zeca Afonso esqueceu-se da referência às circunstâncias do destino que o
colocaram no mesmo palco onde, poucas horas depois, seria representada a peça
que melhor descreve a espera por um futuro diferente. Um detalhe para
providencialistas.
Agora os factos.
Sampaio da Nóvoa será apoiado pelo PS e se o candidato da direita for Rui Rio,
hipótese que ganha consistência, corre o risco de ganhar as eleições, tentarei
explicar. Destaco antes uma outra evidência: trata-se da derradeira batalha
política de Mário Soares. A figura maior da Terceira República assumiu nos
últimos dois anos um combate sem quartel (e algumas vezes pouca razoabilidade)
ao governo de Passos Coelho. Ajudou a criar condições para a queda de António
José Seguro, ungiu António Costa e escolheu o seu candidato presidencial depois
de ter desistido de Carvalho da Silva. Mudar o poder e ver Sampaio da Nóvoa
eleito e em Belém seria o seu “grand finale”.
A equação a
resolver por Nóvoa e pelo PS, a primeira de todas, passa por saber se Marcelo
Rebelo de Sousa avança ou mais uma vez hesita até acabar por desistir – como
aconteceu noutras alturas em que se pensava ter tudo do seu lado. Se avançar,
ganhará. Tem uma notoriedade/popularidade superior a qualquer político, fala
uma linguagem que as pessoas entendem, entra pela casa dos portugueses, que não
o trocam por outra vedeta mediática do género. Mas Marcelo hesita e tem telhados
que não lhe apetece arriscar com a tragédia que se abateu sobre o BES e Ricardo
Salgado, seu íntimo.
Passos não o
quer. Prefere Rui Rio por vários motivos, o primeiro dos quais poder matar dois
pardais no mesmo tiro: anula Marcelo, por quem nunca morreu de amores, e afasta
Rio da sua sucessão. Não é mau para uma jogada só. O problema é que com vários
jogadores, naipes e especulações, tudo dependerá das cartas que cada um quiser
ou tiver de jogar. Nóvoa e Costa preferirão sempre Rio. No caso do líder do PS,
com a vantagem de, na pior das hipóteses, ter de trabalhar (se vencer as
legislativas) com alguém com quem simpatiza política e pessoalmente.
Se excluirmos
Marcelo, o professor catedrático que o PS apoiará tem hipóteses de ganhar. Resolvendo
o problema de ninguém o conhecer, está claro. Se as eleições fossem amanhã,
perderia com quem lhe aparecesse pela frente. Mas não são amanhã. Sampaio da
Nóvoa, que escolheu o i para a sua primeira entrevista a um jornal depois de se
assumir candidato, contará na estrada com a máquina de um partido e terá perto
de si Mário Soares, Jorge Sampaio e, ao que se sabe, Ramalho Eanes – os
presidentes que terminaram cada um dos seus dois mandatos em alta. Do outro
lado estará Cavaco Silva. Mesmo que se mantenha neutro, apoiará Rio. Presente
envenenado e indigesto.
Não sei ainda o
que pensa Nóvoa. Os seus dotes poéticos são passadistas e à sua volta (pelo
menos no Trindade) não existe gente nova e com futuro, um problema. Mas não
estaria seguro da vitória de Rui Rio como estão os entusiastas desta espécie de
Sidónio Pais. Na verdade, estaria preocupado.
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