Lições das eleições no Reino Unido
David
Cameron provou ontem que é possível ganhar eleições defendendo a austeridade e
apresentando resultados.
Luís Rosa
09/05/2015 in
(jornal) i online
A Grã-Bretanha
não gosta muito da Europa. Como bons ilhéus que são, não querem que o
Continente lhes diga como devem viver a sua vida. Mas, apesar desse
distanciamento, os britânicos ainda são um guia para a Europa. Como, por
exemplo, na defesa dos princípios democráticos ou na criação de uma economia de
mercado que coexiste de forma saudável com um Estado social sustentável.
Ontem, os
britânicos mostraram à Europa que é possível que um partido (os conservadores)
que liderou a aplicação de medidas de austeridade duríssimas possa renovar o
seu mandato, ganhando sozinho a maioria absoluta e dispensando o seu parceiro
de coligação nos últimos quatro anos (os Liberais-Democratas). Ninguém
imaginaria que David Cameron conseguisse ganhar as eleições. Nem no último dia
de campanha (na última sexta-feira) e muito menos no dia 19 de Outubro de 2010,
quando anunciou um pacote de austeridade no total de 128 mil milhões de euros. E
porquê? Porque o défice orçamental tinha disparado para 11,4% do PIB e era
necessário reduzi-lo para 2% até 2015. A aplicação desta receita foi
bem-sucedida e permitiu reestruturar muitos serviços públicos. Os resultados
estão à vista: com finanças públicas mais saudáveis, é possível à economia
crescer 0,9% em 2014, prevendo-se 1,7% em 2015.
É uma subida
ainda tímida, mas David Cameron conseguiu convencer os britânicos de que não
valia a pena ir atrás das promessas dos trabalhistas de aumentar o investimento
público para fomentar a subida da economia. É tudo um pouco semelhante a
Portugal, é certo. Mas a atracção de Passos Coelho pelo abismo político com
declarações despropositadas, como aconteceu esta semana com o reavivar do caso
da demissão de Paulo Portas no Verão de 2013, pode fazer a diferença.
Um aspecto
positivo da vitória dos conservadores foi a varridela eleitoral que a extrema--direita
teve. Depois de ter ganho as eleições europeias de 2014 com 27,5%, o UKIP teve
apenas 12,6%. Esta derrota clamorosa permite a Cameron gerir melhor o referendo
de 2017 sobre a presença do Reino Unido na União Europeia (UE). Não existam
dúvidas, contudo, de que vamos ouvir o primeiro--ministro a levantar a voz
contra Bruxelas até 2017, exigindo uma redução da contribuição financeira para
a UE e a devolução da soberania cedida.
Isso gerará mais
focos de tensão na União, quando a situação da Grécia está longe de se
resolver. Mas poderá ter o efeito positivo de gerar debate sobre o projecto
europeu. Sempre que se verifica uma grande crise na UE, parece que só existe
uma solução: dar um passo em frente e aprofundar a união política ou a
económica e a monetária. As exigências de Cameron vão obrigar outros países a
encarar a hipótese de engrenar a marcha--atrás em vez de avançarmos sempre para
uma espécie de abismo desconhecido. E isso é claramente positivo porque
permitirá combater uma espécie de pensamento único que existe sobre a Europa.
Uma última nota: David Cameron provou mais uma vez que é um
político destemido. Arriscou a sua cabeça com um referendo sobre a
independência da Escócia e venceu. Apresentou-se sozinho nas eleições e arrasou
com uma maioria absoluta que ninguém previu. A caminho do seu segundo mandato,
no final do qual completará dez anos como primeiro-ministro, Cameron arrisca-se
a vencer o referendo da UE. Desde Margaret Thatcher que os conservadores não
tinham ninguém tão inspirador
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