quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Lisboa experimenta uso de falcões para espantar bandos de pombos no centro



Lisboa experimenta uso de falcões para espantar bandos de pombos no centro
POR SAMUEL ALEMÃO • 11 JANEIRO, 2018 •

Uma solução arrojada para um problema persistente, em relação ao qual já várias técnicas foram usadas, ao longo das últimas décadas. A Câmara Municipal de Lisboa (CML) começará, esta semana, e durante os próximos três meses, a testar o uso de falcões para espantar os bandos de pombos que frequentam o centro da cidade, sobretudo em áreas como o Rossio, os Restauradores, a Praça da Figueira ou o Campo das Cebolas. O objectivo é, não tanto que as aves de rapina deglutam os persistentes pássaros, por muitos vistos como uma praga, mas sim que os amedrontem, ao ponto de os afugentarem do coração da capital. Durante este período, serão realizados lançamentos de falcões, numa área compreendida entre Santa Apolónia e Cais do Sodré. “Vamos ver como corre. Se a experiência for positiva, poderá ser alargada a outras zonas da cidade”, explica a O Corvo o director municipal de Higiene Urbana da CML, Vítor Vieira, admitindo a dificuldade sentida pela autarquia em lidar com o fenómeno.

 “Esta questão dos pombos é sempre muito polémica, divide as opiniões. Temos, por isso, que olhar para os dois pratos da balança”, afirma o responsável, reflectindo sobre a necessidade de lidar com sensibilidades antagónicas. “Se, por um lado, sempre existiu aquela ideia de muitas pessoas associarem os pombos a doenças, sujidade, destruição de património, como das casas e dos carros, entupimento de caleiras, ou até ao sujar a roupa nos estendais, temos também um fenómeno recente, relacionado com a defesa dos animais e que tem alcançado algum significado”, explica Vítor Vieira, dando conta do esvanecer do anterior paradigma de ver na proliferação de pombos algo exclusivamente negativo. Algo, aliás, corporizado pela recentemente mudança de estratégia da CML, ao inaugurar, a 25 de maio de 2017, no Parque Silva Porto, em Benfica, aquele que se pretende venha a ser apenas o primeiro de uma rede de pombais contraceptivos na capital.

 Nessa cerimónia, o vice-presidente da Câmara de Lisboa, Duarte Cordeiro, dava conta dessa “mudança de política”, o que implicaria, “a prazo”, acabar com a prática de captura e abate de pombos, prevalecente durante décadas. Os tais pombais contraceptivos, dos quais se previa que, até ao final do ano passado, se contabilizassem sete unidades espalhadas pela cidade – mas cuja implementação está atrasada -, têm um funcionamento assente na retirada de ovos das crias da ave por muitos vista como invasora e na sua substituição por réplicas de plástico. Um trabalho dependente da colaboração de grupos de voluntários. “Este é, sem dúvida, o método mais eficaz, melhor que todos os outros que temos vindo a aplicar. O que nos leva a ter uma maior esperança de garantir uma convivência pacífica entre pombos e humanos”, garantia, naquela altura, o vice-presidente da câmara, que também tem a seu cargo o pelouro da higiene urbana.

Mas só esse sistema parece não chegar, admite agora o director municipal de Higiene Urbana, frisando igualmente a necessidade de dar resposta a uma nova sensibilidade demonstrada por alguns munícipes. “Tem-se assistido a uma crescente preocupação com o bem-estar animal e isso tem tido até reflexo nas propostas que nos chegam através do Orçamento Participativo. Foi, de resto, o caso dos pombais contraceptivos”, explica Vítor Vieira, concedendo, todavia, que, mesmo depois de instituída a tal rede de pombais contraceptivos, muito fica por fazer. Daí a necessidade de se tomarem medidas complementares. “Temos estado a estudar alternativas e percebemos que, no aeroporto de Lisboa, já se faz este trabalho com os falcões, e que parece ter vindo a dar bons resultados”, diz, referindo-se ao método utilizado pelos responsáveis daquela infra-estrutura de transportes, como forma de garantir a segurança dos aviões, evitando a entrada de aves nos reactores os mesmos.

A experiência de utilização da mesma espécie de aves de rapina nas zonas centrais de Lisboa, que nesta primeira fase custará aos cofres municipais pouco mais de 18 mil euros, será levada a cabo por uma empresa especializada. Neste projecto-piloto, que estava apenas à espera da autorização do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) para arrancar, serão usados diferentes falcões em cada momento de espantamento. Nunca serão os mesmos em ocasiões sucessivas. “Vão rodando, para garantir a eficácia da sua acção”, diz o responsável a O Corvo. Por outras palavras, se eventualmente caçarem pombos e os comerem, pretende-se que não se deixem levar pela sensação de saciamento. Algo compreensível, se se tiver em conta que essa foi a razão pela qual, em grande medida, falharam diversos programas de controlo populacional de pombos que recorriam a milho contraceptivo. Isto porque muitos deles satisfazem o apetite com o que encontram em caixotes do lixo, logo não sentindo necessidade de comerem o milho manipulado.

 O falhanço destas medidas – que se sucederem a uma outra prática, a da captura e gaseamento dos pombos, levada a cabo durante décadas, mas considerada inaceitável aos olhos da sensibilidade mais recente da opinião pública – deixou as autoridades municipais frustradas. Os problemas relacionados com a sobrepopulação de pombos e as queixas a eles associadas persistam, apesar do muito dinheiro gasto no milho contraceptivo. Daí que, desde 2014, e a par da percepção de que a crescente preocupação com o bem-estar animal impedia a adopção de soluções letais, a Câmara de Lisboa tenha começado a pensar numa mudança de estratégia para lidar com a situação. Primeiro, os pombais contraceptivos, agora os falcões. “Estamos a aprender, a ver se isto funciona. A ideia é afastar os grande bandos de pombos que andam pelo Rossio, Restauradores, Praça do Município ou Campo das Cebolas. Se correr bem, podemos alargar ao resto da cidade”, diz Vítor Vieira.

 A utilização de falcões para afugentar grandes populações de pombos tem sido, com frequência, experimentada pelas autoridades de algumas das maiores metrópoles. Nova Iorque já o fazia no início da década de 90 do século passado e Londres tem-no feito, amiúde, desde 2008, em algumas das suas zonas mais icónicas, como é o caso de Trafalgar Square. Los Angeles começou a fazê-lo em novembro passado. No mês anterior, também Paris anunciava que iria avançar para uma solução semelhante, apesar dos protestos de grupos de cidadãos que saíram em defesa dos pombos. Alegou-se crueldade contra estes animais. Em Lisboa, além do aeroporto, existe um projecto-piloto no Centro Comercial Vasco da Gama, com o objectivo de afastar as inúmeras gaivotas que importunam os comensais que fazem as suas refeições na varanda.


 Texto: Samuel Alemão

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