Palácio
sob tutela militar vandalizado e a cair aos bocados em Caxias
JOSÉ ANTÓNIO
CEREJO 22/12/2015 - PÚBLICO
Milhares
de azulejos do século XVIII foram roubados nos últimos anos de um
palácio mandado construir por um irmão de D. João VI. Paço Real
de Caxias está à beira da ruína e depende do Ministério da
Defesa.
Visto de fora não é
particularmente imponente, embora o soberbo painel de azulejos azuis
e brancos que cobre a parte superior da sua fachada chame a atenção
em frente à estação ferroviária de Caxias. Também visto de fora,
o Paço Real de Caxias está há muitos anos em adiantado estado de
degradação, com janelas e portas emparedadas. E a definição de
“paço modesto” que lhe é dada pelos especialistas, por oposição
à monumentalidade dos seus jardins, faz pensar que por trás
daquelas paredes não há grande coisa.
Talvez por isto
tudo, e por estar há muitas décadas em mãos militares, ninguém
adivinhava que, escondido na aparente modéstia da habitação que
foi residência de Verão da família real desde 1834, ali havia um
pequeno palácio repleto de azulejos semelhantes aos do Palácio de
Queluz. Um pequeno palácio com tectos e paredes pintadas de
grinaldas de flores e outros ornamentos e mandado construir, antes do
terramoto de 1755, por D. Francisco de Bragança, irmão de D. João
VI. Quem sabia o que lá estava eram os responsáveis dos monumentos
nacionais que em 1953 o classificaram como imóvel de interesse
público.
Mas se em 1953 e
mesmo no final do século passado ainda lá havia um pequeno palácio,
agora está lá um casebre imundo, abandonado, vandalizado, saqueado,
à beira da ruína.
Os azulejos, azuis e
brancos e polícromos, que cobriam parte das suas paredes foram
arrancados à bruta, sistematicamente. Ficaram restos partidos no
chão, misturados com o reboco caído. Ficou um ou outro que não se
deixou levar, assim como as pinturas que não há maneira de roubar e
que a humidade das infiltrações praticamente já apagou.
Nos tectos,
sobretudo do salão nobre, a água e a incúria, as tempestades que
vêm do mar e entram pelas janelas partidas do primeiro andar, deram
cabo das pinturas e das madeiras. No chão, onde ainda se consegue
caminhar, o soalho ameaça desfazer-se debaixo dos pés. Nalgumas
salas, as arvores do pátio interior do edifício entram pelas
janelas dentro. Aqui e ali uma enxerga, trapos velhos e garrafas
vazias mostram que por ali passaram pessoas sem abrigo.
Num vão de escada
vê-se um monte de papéis velhos que sobraram de um fogo ateado que
só não reduziu tudo a cinzas porque não calhou. Mais do que papéis
velhos há documentos e livros chamuscados. Alguns com datas do
princípio do século passado e até mais de trás.
No rés-do-chão há
uma sala inteira em cujo solo apodrecem milhares de documentos a
monte. Documentos que identificam quem por ali passou pelo menos
desde meados do século passado: Conservatória da Propriedade
Científica, Literária e Artística e Instituto de Altos Estudos
Militares (que de lá saiu em 1956).
Disto tudo, daquilo
que não se vê da rua, soube há dias o Fórum Cidadania Lisboa.
Numa carta enviada ontem mesmo ao ministro da Defesa, aquele
movimento cívico pede a Azeredo Lopes que o esclareça sobre “quais
os procedimentos urgentes que o Ministério da Defesa pode encetar de
modo a, numa primeira fase, colocar um ponto final ao saque e
destruição, e, num segundo tempo, lançar um programa de restauro e
utilização apropriada do edifício”.
Em resposta ao
PÚBLICO ao fim do dia, o gabinete do ministro informou que “ainda
não houve tempo para analisar a situação dos imóveis que são
propriedade do Ministério da Defesa, e deste em concreto”. O
porta-voz de Azeredo Lopes acrescentou que vai ser pedida informação
aos serviços por forma a tomar as medidas que for possível.
Em 2012, o anterior
Governo decidiu vender em hasta pública o Paço Real de Caxias, bem
como outros imóveis militares, intenção que não se concretizou
até agora.
Os jardins do paço
foram recuperados pela Câmara de Oeiras, com base num protocolo
celebrado com o Ministério da Defesa em 1986, mas a sua pretensão
de ficar com o palácio não foi atendida pelo Governo. Embora também
já revelem sinais de algum abandono por parte do município, os
jardins estão abertos ao público desde há vários anos.
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