Só
um pacto muito alargado permitirá governar Espanha
SOFIA LORENA
20/12/2015 - PÚBLICO
Conservadores
vencem mas perdem quase um terço dos deputados que conseguiram em
2011. Podemos impõe-se como terceira força política.
Esperava-se um
Congresso muito dividido, mas nenhuma sondagem antecipava os
resultados reais. Resultados que não permitem, por exemplo, que o
conjunto dos deputados eleitos pelo Partido Popular e pelo Cidadãos,
um dos dois partidos emergentes da política espanhola, obtenham a
maioria absoluta de 176 deputados no Parlamento de 350. Partidos vão
ter de aprender o que é a democracia parlamentar.
O PP, de Mariano
Rajoy, que governou nos últimos quatro anos com maioria a absoluta,
elegeu 123 deputados e conseguiu 28,71%, seguido do Partido
Socialista, com 22% e 90 deputados. Em terceiro lugar surge o
Podemos, de Pablo Iglesias, com 20,65% dos votos e 69 deputados,
tornando-se na primeira força política na Catalunha e no País
Basco.
Aqui entram nos
votos das diferentes candidaturas regionais apoiadas pela formação:
Em Común Podem, a candidatura catalã, que elegeu 12 deputados, mais
uma plataforma idêntica de Valência, e a Em Marea, que reúne o
Podemos e a Esquerda Unida na Galiza. Todos aspiram a ter grupos
parlamentares distintos, mas Iglesias falou nos bons resultados do
seu projecto “plurinacionalista” e a realidade deverá alterar as
intenções.
Em quarto, bastante
atrás do que indicavam a maioria dos inquéritos fica o Cidadãos, o
partido centrista que nasceu na Catalunha para combater o
independentismo. A formação liderada por Albert Rivera conseguiu
13,9% e elegeu 40 deputados.
“Quem ganha deve
tentar formar governo”, afirmou Mariano Rajoy. O mesmo disse o
líder socialista, Pedro Sánchez: “Os espanhóis disseram algo
claro, que se abre uma nova etapa política, que temos de deixar para
trás a imposição e abrir um processo de diálogo. O PSOE está
disposto a debater e a dialogar. Mas, como sempre disse, corresponde
à primeira força política tentar formar governo”.
Governo estável
Rajoy falou numa
sede do PP em ambiente de festa, apesar de ter perdido 3,5 milhões
de votos e das dificuldades que terá para formar governo. “Espanha
precisa de um governo estável, que tenha apoio parlamentar. Vou
procurar um governo estável e que responda aos interesses de todos
os espanhóis. Espanha precisa de estabilidade e confiança”,
repetiu.
O primeiro-ministro
sublinhou que mais de 7 milhões de espanhóis “manifestaram a sua
confiança” no PP, apesar “das dificuldades dos últimos quatro
anos”. E notou que o seu partido venceu com “mais de 1,6 milhões
de votos e mais de 30 lugares de diferença em relação à segunda
força política”, o PSOE.
“A solução para
a governabilidade não é evidente. O país entra um período de
incerteza. Não se vê uma maioria óbvia”, comentou o director do
El País, Antonio Caño. “Neste momento, não vejo como Rajoy pode
somar votos suficientes para governar. A única opção seria
conseguir um acordo com os socialistas e isso não parece possível.
O contrário é igual, Pedro Sánchez não consegue governar com os
votos do Podemos, precisaria dos votos do PP para isso.”
Ora, tanto PSOE como
PP sempre recusaram a possibilidade de uma grande coligação, à
alemã. Mas se levarmos à letra tudo o que os partidos têm tido,
não há solução possível de governabilidade.
Os partidos
nacionalistas
Os partidos
nacionalistas de diferentes regiões podem ter uma palavra a dizer: a
Esquerda Republicana da Catalunha elegeu nove deputados; os
Nacionalistas Bascos outros nove; o Democracia e Liberdade, antiga
Convergência do presidente regional catalão, Artur Mas, conseguiu
oito. Somando os resultados dos principais partidos e pensando nas
alianças naturais, PP e Cidadãos juntam 163 votos, mas Albert
Rivera mostrou-se absolutamente incompatível com os partidos
nacionalistas, o que complicaria a vida aos conservadores.
Iglesias não foi
simpático para o PSOE, recordando na sua intervenção que os
socialistas tiveram “o pior resultado da sua história” e
lembrando que ficou à frente dos socialistas em Madrid, onde Sánchez
era o cabeça de lista. Alguns comentados notaram que Iglesias
parecia estar a “lançar mísseis ao PSOE”.
“Espanha votou
para mudar de sistema e isso tem consequências imprescindíveis e
inadiáveis, como a constitucionalização dos direitos sociais, a
saúde pública, o direito a uma casa digna, o fim dos despejos e uma
reforma da Constituição”, afirmou. Repetiu, como tantas vezes ao
longo da campanha, que Espanha “é um país plurinacional”.
Albert Rivera
celebrou, como Iglesias, “o fim do bipartidarismo” que governa
Espanha desde sempre em democracia, com alternância de poder entre
PP e PSOE. “Esta noite há mais espanhóis que querem diálogo e
que querem reformas. Agora vamos participar da mudança política.
Vamos fazê-lo com 40 mulheres e homens corajosos que vão pensar
Espanha”, disse, prometendo que ninguém como os seus deputados
"vai pensar mais em Espanha do que no nosso partido”
As próximas semanas
vão ser marcadas por negociações inéditas. Para 14 de Janeiro
está marcada a primeira sessão do Congresso. De acordo com a
Constituição, o rei deve iniciar “consultas prévias com os
representantes dos partidos com representação parlamentar e,
através do presidente do Congresso, propor um candidato à
presidência do Governo”.
O candidato proposto
é então votado pelo conjunto dos deputados e eleito, se obtiver
maioria absoluta. Caso contrário, haverá uma segunda votação, 48
horas depois, onde já é suficiente uma maioria simples, com mais
votos a favor do que contra. Se dois meses depois da primeira votação
não houver investidura, o Parlamento dissolve-se e terão de ser
convocadas novas eleições.
Ninguém quis
admitir a possibilidade de uma nova ida às urnas na noite eleitoral.
Mas também ninguém sugeriu estar disposto a ceder o suficiente para
permitir a formação de um executivo estável.
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