domingo, 13 de dezembro de 2015

Os franceses querem mudar, mas estarão dispostos a confiar em Le Pen?


Os franceses querem mudar, mas estarão dispostos a confiar em Le Pen?

CLARA BARATA 13/12/2015 – 07:01 / PÚBLICO

As sondagens não prevêem vitórias para a Frente Nacional na segunda volta das eleições regionais francesas, mas os resultados são incertos.

Marine Le Pen hesitou antes de se apresentar como candidata às eleições regionais – o seu foco principal são as presidenciais francesas, na Primavera de 2017. E avisou que, se ganhasse a presidência da região Norte-Pas-de-Calais-Picardia, na segunda volta deste domingo, delegaria o cargo. Mas, se as sondagens se confirmarem, talvez não seja desta que a irritação popular contra os partidos tradicionais entregará o poder à extrema-direita em regiões da dimensão dos mais pequenos países europeus. Mas é um aviso.

Se a líder da Frente Nacional (FN) for derrotada, ou se o mesmo acontecer à sua sobrinha Marion Maréchal-Le Pen na região de Provence-Alpes-Côte d'Azur (PACA, no Sudeste), a culpa será da barreira erguida pelo PS francês, que retirou as suas listas e recomendou a votação no candidato que ficou em segundo lugar, apesar de ser do centro-direita. O objectivo é conter o avanço da extrema-direita, a todo o custo – mesmo o de desaparecer dos órgãos de gestão destas regiões durante um mandato.

Mas mesmo que nenhuma sondagem durante a semana tenha acenado com uma promessa de vitória, Marine Le Pen nem se permitiu mencionar a palavra derrota, na quinta-feira, em Paris, no único comício realizado entre a primeira volta de há uma semana e a segunda deste domingo. Não cedeu um milímetro ao apresentar a FN como a única alternativa, o único partido diferente. "Com o PS e a UMP [o partido de Nicolas Sarkozy, a que ele entretanto deu um novo nome, Os Republicanos], temos os dois clãs de uma mesma máfia", denunciou.

"Repartiram os territórios, repartem também os benefícios. Os atentados [de 13 de Novembro em Paris] foram rapidamente esquecidos, para se dedicarem a coisas mais sérias: salvar os seus cargos", acusou, num comício em que estiveram presentes todos os cabeças de lista da FN nas eleições regionais.

Pecarão as sondagens por serem demasiado optimistas? "Seja qual for o tipo de escrutínio e o contexto político, é obrigatório constatar que os resultados da FN melhoraram em todas as eleições, no conjunto do território", disse ao Le Monde Joël Gombin, da Universidade da Picardia-Júlio Verne e membro do Observatório das Radicalidades Políticas da Fundação Jean Jaurés.

As sondagens dizem até que Florian Philippot – o braço direito de Marine Le Pen e principal autor da estratégia de normalização da FN – será batido pelo candidato de Os Republicanos na região de Alsace-Champagne-Ardenne-Lorraine (Leste), onde o candidato socialista, Jean-Pierre Masseret, que ficou em terceiro lugar, se recusou a sair da corrida. Embora o PS lhe tenha retirado o apoio, a permanência de Masseret fragiliza a frente contra a extrema-direita. Em 2012 Marion Maréchal-Le Pen tornou-se deputada porque uma candidata socialista não se retirou na segunda volta das legislativas.

Mas pode ser que o efeito de barragem contra o avanço da extrema-direita funcione, como já aconteceu muitas outras vezes, impedindo a FN de concretizar os bons resultados da primeira volta. No entanto, os dois grandes partidos nacionais, o PS e Os Republicanos, vão sentir os efeitos do realinhamento político a nível nacional que se está já a desenhar, afirma Joël Gombin.

Há cada vez menos pessoas votar nos partidos tradicionais, transformando a abstenção num fiel da balança que favorece a FN —que pode ou não dar a vitória a Le Pen em alguma das seis regiões onde a FN ficou à frente na primeira volta ou entregar-lhe o Palácio do Eliseu nas presidenciais de 2017. “Vamos assistir de certeza a uma desnacionalização do voto socialista, e sem dúvida d’Os Republicanos. Vão passar a ter feudos, e terras de conquista, como a FN.”

O que muitos franceses expressaram nestas eleições foi uma enorme vontade de mudar, e o seu desprezo pela classe política que os tem governado em alternância, dizem muitos analistas. Entre os seis milhões que votaram na extrema-direita no último domingo, muitos nunca tinham votado – ou nunca o tinham feito antes de 2012, quando Marine Le Pen obteve a votação recorde para a FN, na primeira volta das eleições presidenciais em que François Hollande e Nicolas Sarkozy discutiram o segundo turno.

"Já não podemos falar de um voto de protesto, quando a FN obtém há 30 anos resultados superiores a 10%, e sucessivamente tem ultrapassado os tectos de 15, 20, 25%", comentou Jean-Yves Camus, director do Observatório das Radicalidades Políticas da Fundação Jean Jaurés.

O voto na FN é cada vez mais por convicção, num partido que 41% dos franceses associam a algo de novo na vida política, diz um estudo do think tank Diderot. É um voto que apela aos jovens: embora 65% dos que têm entre 18 e 24 anos simplesmente não votem, 35% dos que o fazem escolhem o partido de Le Pen. É muito, mas os jovens franceses não estão a tornar-se todos fascistas, pois uma proporção igual escolhe os partidos de esquerda, só que fragmenta o seu voto pelas várias opções disponíveis, diz um estudo Ipsos-Sopra-Steria.

Para um partido que durante muito tempo sofreu pela falta de quadros com formação, a FN é hoje um partido interessante para os jovens por outro motivo: propõe ateliers de formação, com o objectivo de captar militantes e encontrar candidatos. A formação de extrema-direita da família Le Pen é um bom sítio para jovens atraídos por uma carreira política, diz o estudo do Diderot.


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