sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Cimeira do clima prolongada para sábado à espera de um acordo / “Quando a poluição está alta em Pequim, vamos todos de máscara”


Neutralidade” é o caminho para o Apocalipse Ecológico Futuro.
OVOODOCORVO

Quando a poluição está alta em Pequim, vamos todos de máscara”
PÚBLICO / 11-12-2015

Nos sete anos de vida na China, o consultor português Renato Roldão tem visto o país mudar. A nação que se agarrara ao carvão para crescer a um ritmo galopante está agora empenhada em fazer uma transição para uma economia mais sustentável. Roldão chegou a Pequim em 2008, pela mão da empresa portuguesa Ecoprogresso. Já tinha estado na China antes, em 2002, enquanto fazia a tese de mestrado sobre as energias renováveis naquele país. Hoje trabalha para a consultora ICF International, auxiliando a China a desenvolver um sistema nacional de comércio de emissões de CO2, como o que existe na União Europeia.
Tem sentido na pele — ou melhor, nos pulmões — um dos problemas que empurram a China para soluções mais amigas do ambiente: a poluição. No seu apartamento em Pequim, há um purificador de ar em cada divisão. Em cerca de metade dos dias do ano, ele, a mulher e o filho têm de sair de casa protegidos, conta ao PÚBLICO, nos corredores da cimeira.
O Governo chinês está a ser pressionado pela opinião pública e pelas próprias implicações sociais do problema. Mas resolver a poluição é também um passo para algo que a China deliberadamente pretende fazer, que é refrear o seu apetite por fontes sujas de energia e modernizar a sua indústria. “A economia chinesa tem imensas ineficiências”, confirma Roldão.
Dá o exemplo da ineficiência energética dos edifícios. Em Pequim, o aquecimento é fornecido pela cidade, gratuitamente. É ligado a 15 de Novembro e desligado no final de Março. Dentro das casas, porém, praticamente não há forma de controlar o calor. “Às vezes, estão temperaturas negativas lá fora, e cá dentro 30 graus. É preciso abrir as janelas”, diz Renato Roldão. Pequim está a aproveitar o empurrão da poluição para encerrar muitas indústrias poluentes que povoam as zonas industriais ao redor da metrópole. A China
quer ir mais adiante e vai lançar, em 2017, um sistema nacional de comércio de emissões, na qual haverá um limite para as emissões de CO2 e as empresas terão quotas de transaccionáveis de poluição. Com um sistema como este, as indústrias ou investem no controlo da poluição ou compram quotas, o que for mais barato. Muitas acabarão por fechar. Renato Roldão diz que a política climática chinesa está a ser conduzida pela Comissão Nacional para o Desenvolvimento e Reforma — o ministério que tem a tutela do planeamento. “É isto o que me dá confiança na posição chinesa. Estão a pensar de uma forma sistémica”, afirma.
A meta da China é reduzir as emissões de CO2 em 60 a 65% até 2030, mas em termos relativos, por unidade do PIB. Renato Roldão diz, no entanto, que internamente estão a ser avaliados todos os cenários, inclusive como chegar a reduções absolutas de emissões. “Eles fazem muito trabalho de casa.”

Cimeira do clima prolongada para sábado à espera de um acordo
RICARDO GARCIA (em Paris) 11/12/2015 - PÚBLICO

Delegados com mais um dia para ultrapassar as divergências. Acordo de Paris não terá metas de redução de emissões

As negociações para um novo tratado climático, que está prestes a ser aprovado na cimeira da ONU em Paris, foram prolongadas por mais um dia, até sábado, para dar tempo de ultrapassar as últimas divergências.

Uma reunião durante a madrugada desta sexta-feira foi inconclusiva e acabou por ser interrompida às 5h40. O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, que preside a cimeira do clima, criou grupos de trabalho específicos para tentar superar os pontos que faltam resolver e que são centrais para o resultado de Paris: a diferenciação entre países ricos e pobres, o financiamento aos mais vulneráveis e a ambição do acordo.

Fabiu quis dar mais tempo para consultas com as delegações dos países representados na cimeira, na expectativa de conseguir um novo texto no sábado de manhã, para ser adoptado até ao princípio da tarde.

O prolongamento das cimeiras anuais da ONU sobre as alterações climáticas é uma norma, com praticamente nenhuma a cumprir o término previsto. Normalmente duram mais um dia. Uma delas, a de Durban, em 2011, prolongou-se até domingo. O caso mais dramático foi o da cimeira de Haia, em Dezembro de 2000, que foi suspensa por seis meses, sendo retomada em Bona, em Junho de 2001.

Segundo a última versão do texto negocial, apresentada na quinta-feira à noite, o novo tratado climático não terá metas quantitativas de redução de emissões de CO2, apontando apenas para a sua “neutralidade” na segunda metade deste século. O objectivo é conter o aumento da temperatura da Terra “bem abaixo dos 2ºC” e “fazer esforços” para um limite mais ambicioso, de 1,5ºC.

O novo texto resulta de mais de vinte horas de negociações, desde que fora apresentada uma versão anterior na quarta-feira. Muitos pontos parecem estar resolvidos, mas ainda estão por acordar aspectos centrais, como a diferenciação dos compromissos entre países pobres e ricos e o financiamento aos mais vulneráveis.

Na quarta-feira à noite, ainda estavam sobre a mesa propostas de 40-70% ou 70-95% de redução de emissões até 2050, em relação a 2010. As alternativas eram a simples menção a um objectivo de “baixas emissões globais a longo prazo”, à sua “neutralidade” ou à “descarbonização” da economia ao longo deste século.

Venceu a tese da “neutralidade”, que significa que poderá haver emissões de gases com efeito de estufa, desde que sejam compensadas, por exemplo, por florestas ou pela captura e armazenamento de CO2 no subsolo.

Não há uma data certa para se atingir este saldo neutro. A proposta, ainda por aprovar, fala que isto deve ocorrer “na segunda metade do século”. E diz também que todos os países têm de fazer esforços para atingir o pico das suas emissões “o mais rápido possível”, reconhecendo isto “levará mais tempo nos países em desenvolvimento”.

A ausência de metas numéricas foi uma moeda de troca para um novo limite de aumento de temperatura que se considera aceitável – algo que era exigido pelos países mais vulneráveis. Desde 2010 que estava acordado internacionalmente um valor máximo de 2oC acima da temperatura média pré-industrial. Mas com esse nível de aquecimento neste século, algumas ilhas do Pacífico podem ser submersas pela subida do nível do mar.

A solução de compromisso apresentada pela presidência francesa da cimeira foi aceitar desde já que o limite deve estar “bem abaixo dos 2oC”, mas fazendo tudo para evitar mais do que 1,5oC.

Restam ainda temas espinhosos para os ministros dos países representados em Paris resolverem esta sexta-feira, quando termina a cimeira. O principal é a questão da diferenciação dos esforços que cabem a cada um.

Os países ricos querem reduzir as distinções entre desenvolvidos e em desenvolvimento. Estes, por sua vez, não abrem mão desta “bifurcação” – como se diz nos corredores da cimeira – que vem da convenção climática da ONU de 1992, à qual estará vinculado o acordo de Paris. “Que fique claro: não estamos aqui a fazer emendas a convenção. A diferenciação é inegociável”, disse José António Marcondes, negociador principal da delegação brasileira, numa conferência de imprensa antes da divulgação do novo texto negocial.


A divergência sobre o que uns e outros serão obrigados a fazer está patente na questão da “transparência”. O acordo de Paris vai-se basear em planos dos diversos países, nos quais cada um declara o que vai fazer para ajudar a travar o aquecimento global. As nações ricas querem que haja um sistema robusto e aplicável a todos para verificar se as promessas estão a ser cumpridas. com Hugo Daniel Sousa

Sem comentários: