Independentistas
catalães aprovam plano para a ruptura com Espanha
JORGE ALMEIDA
FERNANDES 27/10/2015 - 18:58
O
acordo entre soberanistas não é ainda a declaração unilateral de
independência. Parece uma fuga para a frente perante o impasse
político em Barcelona e a proximidade das legislativas de 20 de
Dezembro.
As duas forças
independentistas catalãs, a coligação Juntos pelo Sim (JxSi) e a
Candidatura de Unidade Popular (CUP), aprovaram ontem de manhã o
texto de uma moção que proporão ao parlament de Barcelona para
declarar “solenemente o início do processo de criação de um
Estado catalão independente, sob a forma de república”. Asseguram
que não se submeterão “a decisões das instituições do Estado
espanhol, em particular do Tribunal Constitucional.” Pretendem que
o texto seja votado na próxima semana.
A proposta anuncia a
“abertura de um processo constituinte cidadão, participativo,
aberto, integrador e activo para preparar as bases da futura
Constituição catalã”. Começariam depois a “desconexão” com
o ordenamento jurídico espanhol e a criação de estruturas
provisórias do futuro Estado. As eleições constituintes
realizar-se-iam no prazo de 18 meses.
O presidente do
Governo espanhol, Mariano Rajoy, qualificou a proposta soberanista
como “mera provocação que não terá nenhum efeito” e garantiu
que o Estado “não renunciará a nenhum dos mecanismos políticos e
jurídicos de que dispõe para a defesa do país e o cumprimento da
lei e da Constituição”. Rajoy falara antes por telefone com o
líder socialista, Pedro Sánchez, e com Albert Rivera, do partido
Cidadãos. Terão combinado “uma via directa de diálogo” perante
o desafio catalão.
A legitimidade
Na segunda-feira,
houve outros dois actos relevantes. Rajoy dissolveu as Cortes
(parlamento) confirmando a marcação das eleições legislativas
para 20 de Dezembro. E o parlament de Barcelona elegeu para a sua
presidência Carme Forcadell, a “Passionária catalã”. Na
expressão do jornalista Enric Company, é “uma presidente para a
ruptura” e fez do seu primeiro discurso na câmara “a continuação
da agit-prop a que se dedica há anos”. Terminou gritando: “Viva
a república catalã.” Inés Arrimadas, do Cidadãos e líder da
oposição, reagiu assim: “Ela excluiu metade dos catalães.”
A declaração
independentista não é uma surpresa embora possa ter sido antecipada
por pressão da CUP. Quando Artur Mas, president da Generalitat
(governo autonómico) convocou as eleições-plebiscito de 27 de
Setembro, explicou que se a JxSi conquistasse a maioria absoluta de
68 deputados, o parlament aprovaria uma Declaração Unilateral de
Independência (DUI) no prazo de seis meses. A secessão unilateral
seria completada em 18 meses e, no fim, ratificada por referendo. O
acordo de ontem não é ainda a DUI mas uma ambígua declaração de
intenções.
A JxSi é uma
coligação entre a Convergência Democrática da Catalunha (CDC), de
Mas, a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), de Oriol Junqueras, e
associações nacionalistas da sociedade civil. Mas falhou a aposta
dos 68 deputados (teve 62). Para a ter maioria parlamentar, precisa
dos votos da CUP, um movimento nacionalista de extrema-esquerda, que
se tornou no árbitro do jogo político.
Mais importante foi
o facto de o bloco independentista, incluindo a CUP, ter tido menos
de 50% dos votos no “plebiscito”. Há outro ponto relevante: o
Estatuto catalão estipula que qualquer revisão do seu texto exige
uma maioria qualificada de dois terços dos deputados.
“Mas tem um
mandato para negociar [com Madrid] uma consulta popular que inclua a
eventualidade da independência”, observa Lluis Bassets,
director-adjunto do El País. Conclui: “Um mandato para negociação
da independência não é o mesmo que um mandato para fazer a
independência e nem sequer para fazer um referendo.” A Catalunha
está partida em duas metades. E o parlament não pode proclamar a
independência unilateral. “Não o pode fazer porque está fora da
lei, mas também porque não tem suficiente força eleitoral.”
Pântano
A Catalunha passa
momentos agitados. A par do “caso Pujol”, os escândalos de
corrupção, como o financiamento ilegal da CDC através de comissões
cobradas nos concursos de obras públicas, atingem directamente a
figura de Mas. O tesoureiro do partido está preso. Embora
encurralado pelas investigações judiciais, Mas insiste em manter-se
na chefia do governo. Mas a sua nomeação é vetada pela CUP. Vários
analistas apostam na inevitabilidade da queda de Mas.
Entretanto, a
Catalunha permanece sem governo efectivo. A administração pública
está paralisada. Se não houver novo governo até 9 Janeiro, as
eleições autonómicas terão de ser repetidas em Março. A CUP
exigiu ontem um acordo sobre a presidência da Generalitat até 9 de
Novembro. Numa entrevista, Carme Forcadell declarou a respeito de
Mas: “Ninguém é imprescindível.”
O clima pantanoso e
a deslegitimação das instituições instiga os nacionalistas a
fazer uma fuga para a frente, na medida em que o soberanismo é o
único ele que os une e precisam de relançar a mobilização. Por
outro lado, sabem que a partir de Janeiro haverá um novo Parlamento
em Madrid e será nele que se vai travar o verdadeiro debate sobre a
Catalunha e a Espanha.
Os analistas
aconselham que não se subestime o risco duma subida de tensão na
Catalunha até às eleições de 20 de Dezembro.
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