Ficar
em gestão? Passos e Portas dispensam
24/10/2015,
OBSERVADOR
Coligação
prepara-se para o derrube do Governo. Não quer ficar em gestão, vai
endurecer discurso e marcar posição: nem uma lei do Executivo de
esquerda vai ter o seu voto. PS nas mãos do PCP e BE.
Na iminência de
caírem logo depois de tomar posse para o segundo Governo, Passos
Coelho e Paulo Portas preparam mais do que uma equipa transitória de
ministros: começam a preparar o caminho para combater o Governo de
esquerda a partir da oposição.
No cenário – mais
do que provável – de o PS fazer um acordo parlamentar com o PCP e
Bloco de Esquerda e de, juntos, chumbarem o programa de Governo da
coligação, os líderes da coligação dispensam ficar em gestão.
Ou seja, mesmo que o Presidente da República ponderasse a hipótese
de não dar posse ao governo de esquerda, o líder do PSD (como o
líder do CDS) diria ao Presidente que preferia entregar o poder,
apurou o Observador.
À direita do
plenário, apontam-se pelo menos três motivos para que António
Costa tome mesmo posse – apesar de tudo o que a direita vê no
método como o fará.
Primeiro, no PSD há
a convicção de que há uma ilegitimidade nesse Governo, mas que
essa ilegitimidade não é constitucional – apenas política. Logo
nas primeira entrevista pós-legislativas, o vice-presidente Matos
Correia vincou a tese: um Governo desses seria “uma fraude” e
“politicamente ilegítimo”, embora admissível à luz da
Constituição. Esta tese não é inteiramente partilhada no CDS,
pelo menos não na sua versão pública – Nuno Melo, por exemplo,
usou já o PREC como comparativo.
O segundo motivo é
mais estrutural – e coincidente com que a esquerda tem dito depois
do discurso de quinta-feira do Presidente: não é concebível o país
ficar bloqueado durante meses, até o próximo Presidente poder
decidir o que fazer.
Por fim, um motivo
mais prosaico, que tem sido o mais repetido nos bastidores: com um
acordo entre as esquerdas e a direita em minoria, ficar em São Bento
significaria ter que aceitar todas as leis que viessem aprovadas do
Parlamento (que não seriam as suas). A ser queimado em lume brando,
em clima de campanha e mesmo assim responsável pelos resultados.
Cavaco: uma ameaça
ou um discurso para a história?
A confusão sobre se
o Presidente estará disposto ou não a dar posse a António Costa
instalou-se depois de, na indigitação de Passos, Cavaco Silva ter
sido duríssimo com o projeto de união das esquerdas. No PS, vários
dirigentes comentaram a hipótese de um bloqueio em Belém ao novo
Governo, mesmo nos media vários comentadores viram essa ameaça como
real. Um grupo de deputados (e constitucionalistas) do PS encontrou
até argumentos para dizer que seria “inconstitucional” se o
fizesse.
Na São Caetano à
Lapa, a leitura foi diferente: viu-se uma marcação de terreno
contra Costa e uma mensagem clara de que ele, Cavaco, não quer ficar
associado ao que vier a acontecer depois. No discurso, linha a linha,
pode até ler-se o Presidente a dizer que a última palavra é a dos
deputados – pelo que serão eles a ficar responsáveis pelo que
vier a acontecer.
Na semana passada, o
jornal Expresso fazia manchete com uma certeza: que em Belém havia a
certeza de que o Presidente não considerava a hipótese de sair de
Belém deixando ao sucessor uma situação por resolver.
Oficialmente, ao Observador, a Presidência recusou comentar.
Próxima etapa à
direita: pôr-se de fora (totalmente)
Depois do primeiro
ato da maioria de esquerda na Assembleia – a eleição de Ferro
Rodrigues – a ordem agora na coligação é endurecer o discurso.
Sem dar espaço a qualquer responsabilização da direita pelo que se
seguir depois. Na prática, isto quer dizer que das bancadas do PSD e
do CDS não virá um voto favorável ao novo Governo da esquerda. “O
PCP e o Bloco vão ter que se atravessar a cada medida”, justifica
uma fonte ouvida pelo Observador. Leia-se: mesmo nas medidas de
contração orçamental que sejam necessárias, devido às exigências
do euro, não será a coligação a salvar o PS.
Até lá, a ordem é
para não dar argumentos. Passos e Portas têm já uma equipa a
trabalhar no programa de Governo que têm de levar à Assembleia e,
como já antecipou o Observador, estão a retirar medidas do programa
eleitoral (as mais criticadas pela oposição, como o plafonamento na
Segurança Social) e a abrir espaço a ideias da oposição, para que
o PS tenha menos argumentos para dizer que não encontrou espaço de
negociação à direita.
Para o Executivo,
Passos apostará em nomes mais ligados aos dois partidos. Com a
justificação de que a época é de combate político, assim se
justificará também a dificuldade em encontrar pessoas disponíveis
para estar (mais do que provavelmente) poucos dias no Executivo. Com
isso, Passos não conseguirá sair com a imagem que gostaria de
deixar: a de uma equipa forte e que seria capaz de virar mais uma
página no sentido da normalização. A dificuldade acrescida do
cenário acabará por levar Passos a perder mais alguns dias para
compor o elenco – sendo mesmo assim o objetivo o de haver posse no
prazo de uma semana.
A cerimónia em que
Cavaco silva dará posse a Passos Coelho será, agora, a próxima da
guerra política – uma guerra cujo passo seguinte já ninguém
finge não saber qual é – mas que ninguém consegue antever como
vai acabar.
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