domingo, 18 de outubro de 2015

Passámos dos insultos à guerrilha política


EDITORIAL / PÚBLICO
Passámos dos insultos à guerrilha política
DIRECÇÃO EDITORIAL 18/10/2015 - PÚBLICO

A política trouxe a TAP e o Banif à baila, mas a discussão está a ser feita com enorme leviandade

Cavaco Silva vai começar a ouvir os partidos que elegeram deputados e, ao que se percebe, ainda não se vislumbram entendimentos sólidos que assegurem a governabilidade, nem à esquerda, nem à direita. Confrontado com este revés, o Presidente comentou ontem: “Não estamos assim tão surpreendidos, na medida em que tínhamos imaginado todas as possibilidades”. O “tão” é um advérbio que mostra que a probabilidade que Cavaco atribuía ao actual quadro político era diminuto. Mas aconteceu e o próprio ajudou à sua deterioração quando, a seguir às eleições, se limitou a conversar com Passos Coelho para que este procurasse desenvolver diligências para uma solução de governo.

Já se passaram mais de 300 horas desde as eleições de 4 de Outubro e a coligação PSD/CDS e o PS gastaram pouco mais do que quatro horas em duas reuniões, sendo que na primeira Costa disse que “foi bastante inconclusiva” e, na segunda, Passos disse que a negociação não avançou “rigorosamente nada”. A crispação tem aumentando e o nível de elegância na discussão começa a escassear: Portas acusa Costa de ter “sequestrado o voto dos portugueses”, Passos fala em “chantagem política” e o líder do PS acusa Passos de ser “displicente” nas negociações.

Dos insultos já passámos para um clima de quase guerrilha política, com as máquinas partidárias a utilizarem os conteúdos das reuniões técnicas tidas entre Maria Luís Albuquerque e Mário Centeno para passar informação para a opinião pública que não é clara, nem exacta. Nesta altura já existe uma grande interrogação sobre o que se passa na TAP e no Banif, e nem sequer temos dados suficientes para perceber se se trata apenas de demagogia política ou se há algum motivo para alarme. É uma enorme irresponsabilidade.

Com tanta quezília, o PS vira-se para a esquerda, onde há reuniões atrás de reuniões e um clima de cordialidade que até assusta aqueles que torcem um nariz a um Governo de socialistas apoiado pela esquerda radical. Mas como se explica hoje no PÚBLICO, por detrás dos sorrisos e dos apertos de mãos há uma enorme barreira que os separa; uma barreira histórica e uma barreira de intenções. António Costa sabe que dificilmente conseguirá gizar um Orçamento que agrade ao Bloco sem violar as regras do Pacto Orçamental. E a garantia vazia do PCP de que “nada impede o PS de formar Governo e entrar em funções” não é cartão-de-visita que Costa possa ir mostrar a Cavaco para ser indigitado primeiro-ministro. E no meio das negociações com o PS, vão-se sucedendo episódios que, se o assunto não fosse tão sério, até dariam para rir: o último editorial do Avante! veio apoiar um protesto contra a NATO que se realiza em Lisboa no dia 24.


Com tanto azedume nas negociações à direita e com tanta simpatia inconsequente nas da esquerda, alguém terá de arrepiar caminho para que o país não fique ingovernável.

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