Turquia
recusa ser “campo de concentração” para refugiados
Alexandre Martins /
20-10-2015 / PÚBLICO
O plano liderado
pelo Governo da Alemanha para fazer da Turquia uma espécie de
zona-tampão, onde ficariam milhares de migrantes e refugiados que
tentam entrar na União Europeia (UE), está a ser dificultado pelas
exigências do Governo turco e pela forte oposição de Chipre.
Ontem, um dia depois
da passagem por Istambul da chanceler alemã, Angela Merkel, o
primeiro ministro turco deu uma entrevista ao canal A Haber, onde
deixou claro para que lado pende a balança na questão do fluxo de
migrantes e refugiados, que tem dividido a Europa: “Não podemos
aceitar um acordo com a seguinte base: ‘Dêemnos dinheiro e eles
permanecerão na Turquia’. A Turquia não é um campo de
concentração.”
Esta polémica frase
— que Ahmet Davutoglu garante ter dito pessoalmente a Merkel — é
mais uma indicação de que a Turquia percebeu que dificilmente
haverá uma solução para os receios de parte da população
europeia que não passe pelo seu país. E, por isso, aproveita para
pressionar Bruxelas a aceitar todas as suas exigências, prevendo-se
o aumento das divisões na UE.
Chipre, por exemplo,
nem quer ouvir falar na “redinamização” do processo de adesão
da Turquia como moeda de troca para uma futura parceria em relação
aos migrantes e refugiados — uma ideia admitida no domingo pela
chanceler alemã.
“Os motivos pelos
quais as negociações foram congeladas não deixaram de existir. Tal
como as coisas estão, não podemos dar o consentimento ao seu
reinício”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros cipriota,
Ioannis Kasoulides.
As divergências
entre a Turquia e Chipre são antigas — a ilha está dividida desde
que a Turquia invadiu o Norte. Mas outros Estados-membros têm-se
mostrado muito cépticos sempre que se discute a possível adesão à
UE de um país maioritariamente muçulmano — em Agosto, a
Eslováquia chegou a anunciar que estava disposta a receber
refugiados, mas só se fossem cristãos, e a Bulgária disse temer
que a chegada à Europa de mais muçulmanos “perturbe o equilíbrio
étnico do país”.
No “plano de
acção”, a UE propõe adiantar 3000 milhões à Turquia e acena
com a simplificação na obtenção de vistos para a entrada na UE.
Em troca, a verba seria usada pela Turquia para lidar com a passagem
e permanência de migrantes e refugiados — no reforço dos
controlos de entrada e saída e na construção de campos para os
migrantes que forem rejeitados na UE.
“Aproveitámos a
crise que estamos a enfrentar para voltarmos a alcançar uma
cooperação próxima, tanto entre a UE e a Turquia como entre a
Alemanha e a Turquia”, disse Angela Merkel. Mas Ahmet Davutoglu não
se mostrou tão optimista. Apesar de ter deixado claro que “a
imigração ilegal deve ser controlada”, e que vão ser “accionados
mecanismos conjuntos”, este esforço de aproximação enfrenta o
cepticismo e até a oposição de alguns países europeus —e a
iminência das eleições legislativas na Turquia, marcadas para 1 de
Novembro, com o Partido da Justiça e do Desenvolvimento a não
querer passar a ideia de que está a fazer muitas concessões.
A Turquia, que
acolhe 2,2 milhões de refugiados sírios, chamou ao “plano de
acção” de Bruxelas um “projecto” — até porque os 3000
milhões de euros de que se fala já iriam ser desbloqueados, devido
ao estatuto da Turquia de candidato à UE.
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