sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Cavaco pode estar descansado, Costa garante a instabilidade / António Costa / Económico


Cavaco pode estar descansado, Costa garante a instabilidade

António Costa quer ser primeiro-ministro custe o que custar, como quis ser líder do PS antes. Mas o país não é um partido.

António Costa
Económico / 16-10-2015

"A simples ausência de medidas de política orçamental - que conduziria, nomeadamente, em 2016, à eliminação da sobretaxa sobre o IRS e à reversão integral da remuneração remuneratória aplicável aos trabalhadores das administrações públicas - poria em causa a revogação do Procedimento por Défices Excessivos, dada a projecção de um défice superior a 3% do PIB em 2016".
Conselho das Finanças Públicas, 14 de Outubro

Portugal entrou já no túnel da crise política, qualquer que venha a ser a geometria do próximo governo, e podemos desde já agradecer o "favor" a António Costa, que trocou a estabilidade mínima do país pela sobrevivência a uma derrota eleitoral. Já está para lá da golpada ou da usurpação, Costa já foi longe demais para recuar, e isso quer dizer que está assegurada a instabilidade e a ingovernabilidade. Só falta saber a que custo.

O líder do PS já criou tantas expectativas ao BE e ao PCP sobre uma frente de Esquerda que não tem uma boa saída, e isso seria o menor dos problemas, se não estivesse em causa o país. Ao comportar-se como um vencedor das legislativas com condições efectivas para formar governo e impor uma agenda àqueles dois partidos, António Costa abriu portas que não conseguirá fechar. Nem à direita, nem à (sua) esquerda.

Quando, no domingo das eleições, decidiu não assumir as suas responsabilidades, António Costa começou a criar as condições para não desempenhar o papel que deveria estar cometido ao PS, o de oposição exigente a um governo minoritário. As reuniões que Passos Coelho e Paulo Portas mantiveram com Costa foram muito mais do que inconclusivas, foram a confirmação de que a coligação poderia ter até levado o programa do PS, Costa também o rejeitaria. Porquê? Porque disso depende a sua sobrevivência. Sobravam as discussões à Esquerda, e apesar de ser evidente a impossibilidade de concertar as posições do PS com os dois partidos que não querem cumprir as regras europeias, as económicas e não só, Costa seguiu esse caminho.

Há uma coisa que parece arredada das discussões dos últimos dez dias. O quê? A realidade do país, as restrições económicas e financeiras, a situação orçamental de risco. E se fosse necessário citar alguém, bastaria Teodora Cardoso e o Conselho das Finanças Públicas. A austeridade pode ser suavizada, sim, já estava até previsto, mas não vai acabar. Isso é um conto para crianças, pelo menos enquanto as contas públicas não caminharem para o equilíbrio. Por isso, a consistência de um eventual acordo entre o PS, que diz querer cumprir o Tratado Orçamental, e o BE e PCP vale pouco mais do que zero. Não é de um dia para o outro, do pré-eleições para o pós-eleições, que o BE e o PCP abandonam os seus valores mais relevantes, como a reestruturação da dívida ou a nacionalização dos meios de produção e da banca. Se querem mesmo integrar o arco do governo, vão ter de fazer mais.

Se Cavaco Silva der posse ao governo minoritário da coligação, António Costa já não tem margem para qualquer posição construtiva, só mesmo para uma oposição violenta e que impedirá uma estabilidade mínima a Passos Coelho e a Paulo Portas, isto se o programa de Governo passar no Parlamento. Se o Presidente chamar Costa para formar Governo à Esquerda, não haverá condições para qualquer medida de correção do défice e da dívida pública. E não chegará ao novo primeiro-ministro dar entrevistas a jornais económicos internacionais ou fazer ‘road-shows'. Serão necessárias medidas difíceis, na Função Pública, nos impostos, na Segurança Social.

Estamos já num impasse e ainda nem há um governo em funções.

António Costa quer ser primeiro-ministro custe o que custar, como quis ser líder do PS antes. Mas o país não é um partido, o PS pode até ir à bancarrota, mas os efeitos económicos e sociais de um novo colapso financeiro de Portugal serão catastróficos.


Neste quadro de pântano, um governo minoritário da coligação seria, ainda assim, a menos má das soluções. Não deverá ser possível e, se não for, o melhor que o Presidente pode agora fazer é acelerar os calendários políticos, nomear um governo de gestão para limitar os danos - que existirão - e preparar o país para novas eleições antecipadas para clarificar a legitimidade política e governativa da coligação e do PS.

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