Escom gastou dois milhões só para
ocultar dinheiro
Luís Horta e Costa admite que operação serviu para esconder prémios pagos
nos submarinos e contornar o fisco. "Hoje não faríamos isso".
Micael Pereira |
10:00 Sábado, 20
de dezembro de 2014 / http://expresso.sapo.pt/escom-gastou-dois-milhoes-so-para-ocultar-dinheiro=f903566
A Escom gastou
2,1 milhões de euros só para constituir e gerir um fundo secreto nas Bahamas
com o objetivo de esconder o destino final do dinheiro que o German Submarine
Consortium (GSC) pagou pelos serviços de consultoria prestados por aquela
empresa do Grupo Espírito Santo. "Quisemos dificultar o acesso a essa
informação e esperar por uma oportunidade para regularizarmos os impostos com
melhores condições fiscais", admite Luís Horta e Costa, administrador da
Escom. "Além disso, achámos que seria complicado que se viesse a saber que
houve uma distribuição de bónus à família Espírito Santo", acrescenta. "O
momento no país era diferente. Se fosse hoje não faríamos isso."
Ao todo, a
Ferrostaal, uma das empresas do GSC, pagou 27 milhões à Escom pelo sucesso no
negócio de venda de dois submarinos ao Estado português em 2004. Dos 27 milhões
de euros recebidos pela Escom, cinco milhões tiveram como beneficiários finais
os membros do conselho superior do Grupo Espírito Santo (GES), incluindo
Ricardo Salgado, enquanto 16 milhões foram parar às mãos de três
administradores e de um consultor da Escom, Miguel Horta e Costa, irmão de Luís
Horta e Costa. Ou seja, 21 milhões foram convertidos em prémios. Até agora, no
entanto, não era ainda do conhecimento público o que tinha acontecido com seis
milhões de euros - o resto dos 27 milhões de euros transferidos pela
Ferrostaal.
O rasto do
dinheiro da Escom esteve no epicentro da investigação que o Departamento
Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) desenvolveu durante os últimos
oito anos, relacionada com suspeitas de que teria havido corrupção no negócio
dos submarinos. Esta semana, a procuradora Josefina Escolástica e o procurador
Júlio Braga deram o caso por encerrado, concluindo pela não existência de
indícios de que tenham sido pagas 'luvas' a "decisores políticos" em
troca de uma vitória dos alemães no concurso público internacional lançado pelo
Estado português para a aquisição dos submarinos.
Um milhão em juros para receberem mais cedo
De acordo com
Luís Horta e Costa, além dos 2,1 milhões gastos com a criação do fundo nas
Bahamas, houve ainda 940 mil euros de custos financeiros por causa de dois
empréstimos contraídos pela Escom junto do BES Cayman para permitir que os
prémios dos gestores da empresa e da família Espírito Santo fossem recebidos
antecipadamente, logo em outubro de 2004, dias depois de o contrato dos
submarinos com o Estado português ter entrado em vigor.
O fundo
constituído nas Bahamas, o Feltree Investment Fund, foi criado através de uma
empresa especializada no Brasil. A Escom transferiu um total de 19 milhões de
euros para uma conta titulada por esse fundo no POBT Bank and Trust nas
Bahamas. Desses 19 milhões, 13 foram para os administradores e para o consultor
da Escom. Além disso, foi usada uma sociedade do Grupo Espírito Santo nas Ilhas
Virgens Britânicas, a Afrexport, para onde foram 8,25 milhões de euros. Daí,
cinco milhões seguiram para contas da família Espírito Santo no KBL Swiss
Private Bank, em Genebra, e três milhões ficaram para os homens da Escom.
Ainda segundo
Luís Horta e Costa, a Escom teve depois outros gastos associados ao negócio dos
submarinos. Pagou 750 mil euros ao escritório de advogados Vieira de Almeida,
por serviços jurídicos; 621 mil euros ao BES Investimento, por aconselhamento
financeiro; 500 mil euros à Inteli, por consultoria técnica. E teve de suportar
uma sucursal no Reino Unido, criada e mantida de propósito para aquele negócio,
que custou 340 mil dólares, incluindo os salários e a residência de um
representante.
Houve, por
último, 360 mil euros gastos em Portugal com despesas de viagem e uma avença
mensal de cinco mil euros paga ao longo de vários anos a Miguel Horta e Costa,
o homem que geriu o dossiê dos submarinos com os alemães desde o início. E que
receberia depois quatro milhões de euros de prémio, tal como os três
administradores da Escom.
Confrontado com
as declarações de Ricardo Salgado feitas numa reunião do Conselho Superior do
GES em dezembro do ano passado - e cujas gravações foram tornadas públicas -,
em que o banqueiro se refere a uma "parte que tem de ser entregue a alguém
em determinado dia", Horta e Costa diz: "O dr. Ricardo Salgado sabia
perfeitamente que o dinheiro era para o meu irmão. A questão é que ele achava
que não lhe devíamos dar dinheiro nenhum, apesar de ter sido o Miguel Horta e
Costa a trazer o negócio para a Escom."
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