As “manifestações de
segunda-feira” regressaram, agora contra imigrantes
Um grupo baptizado com o nome “Patriotas europeus contra a islamização do
país” está a mobilizar cada vez mais alemães. Merkel já fez saber que “não há
lugar na Alemanha” para o ódio contra os muçulmanos
Frank Zeller AFP/
15 dez 2014 / PÚBLICO
Principal destino
da imigração na Europa, a Alemanha enfrenta com preocupação um aumento de uma
vaga populista, com a multiplicação nas últimas semanas de manifestações contra
os estrangeiros.
Estes protestos,
que ocorreram em várias cidades do país, são organizados ou apoiados por
diversos movimentos de extrema-direita ou neonazis, bem como pelo jovem partido
antieuro Alternativa para a Alemanha (AfD), que adoptou também ele um discurso
xenófobo.
Símbolo deste
movimento populista, o grupo baptizado “Patriotas europeus contra a islamização
do país” (PEGIDA), que nasceu em Outubro, não tem parado de crescer. Há já
várias semanas, organiza as “manifestações de segunda-feira”, replicando os
protestos que fizeram vacilar o regime comunista na exRDA até à queda do Muro
de Berlim, há 25 anos. O grupo foi mesmo ao ponto de reciclar o slogan da
altura: “Nós somos o povo.”
Dusseldorf
(Oeste), Würzburg ( Sul), Rostock ( Norte), Bochum (Oeste), Munique (Sul)... os
protestos, que inicialmente chegaram a juntar várias centenas de pessoas,
expandiram-se rapidamente. Na segunda-feira, o PEGIDA surpreendeu ao juntar dez
mil pessoas em Dresden, a capital da Saxónia, um land da ex-Alemanha de Leste
que enfrenta dificuldades económicas e sociais. Para hoje está convocada nova
manifestação na mesma cidade, o que levou a chanceler Angela Merkel a fazer
saber que “não há lugar na Alemanha” para o ódio contra os muçulmanos ou
qualquer outro grupo religioso ou racial.
Outro exemplo:
Marzahn, bairro deserdado de Berlim Leste onde os protestos de segunda-feira,
oficialmente organizados por “cidadãos”, se repetem há várias semanas. No final
de Novembro, 800 pessoas, entre neonazis e residentes locais, protestaram
contra a construção de centros de alojamento para os estrangeiros que pediram
asilo.
Na semana
passada, perto de Nuremberga (Baviera, Sul), três edifícios vazios que deveriam
servir para albergar refugiados foram incendiados, sem dúvida por mão
criminosa, segundo a polícia. No local, foram encontradas inscrições racistas e
cruzes suásticas.
Estes movimentos
tentam “mobilizar o ressentimento, designar um inimigo”, analisa Hajo Funke,
professor de Ciência Política da Universidade Livre de Berlim. “Isso tornase
perigoso quando se transforma em ataques desprezíveis” e favorece “o despertar
dos instintos de massas”, avisa.
O nome “Patriotas
europeus contra a islamização do país”, o seu desejo de salvar a Alemanha do
islão, tudo isto soa como “um apelo às armas lançado por populistas de
extrema-direita” e faz lembrar as cruzadas cristãs e a propaganda nazi, afirma
o professor.
Bodes expiatórios
Estas
manifestações acontecem num contexto de imigração maciça para a Alemanha. No
início de Dezembro, a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico
(OCDE) revelou que o país, visto como uma ilha de prosperidade, se tornou em
2012 o principal destino de imigração na Europa, acolhendo nesse ano 400 mil
pessoas.
A Alemanha também
se tornou o primeiro destino daqueles que pedem asilo na Europa, e as suas
estruturas de acolhimento chegaram ao ponto de saturação. Desde o início do
ano, o país acolheu 180 mil refugiados (mais 57% do que no mesmo período de
2013), nomeadamente pessoas que fugiram de países assolados por conflitos
armados: Síria, Iraque, Afeganistão, Somália... bem como muitos ciganos dos
Balcãs.
A enorme
manifestação de segunda-feira em Dresden atraiu militantes da extrema-direita
mas também simples cidadãos descontentes, o que mostrou que a expressão pública
de sentimentos xenófobos deixou de ser um tabu, num país marcado pelo seu
passado nazi.
Muitos daqueles
que saíram à rua são pessoas que “fracassaram nas suas vidas e no seu trabalho
e projectam nos outros os seus próprios fracassos. Eles procuram bodes
expiatórios”, disse Rainer Wendt, presidente do sindicato de polícias alemães,
numa entrevista à N-TV.
Oficialmente, o
PEGIDA é contra os jihadistas e os estrangeiros que se recusam a integrar-se na
sociedade alemã. Mas durante as manifestações, os alvos dos slogans e dos
cartazes também foram as “elites políticas”, os “burocratas europeus” e os “grandes
media”, promotores de um multiculturalismo que “dilui” a cultura alemã.
Esta retórica é
em tudo semelhante à da AfD, formação criada em 2013 e que já tem representação
em três parlamentos regionais na ex-RDA. O seu presidente, Bernd Lucke, reconheceu
numa entrevista ao jornal Handelsblatt que o seu partido “partilha várias
reivindicações” com o PEGIDA, nomeadamente a vontade de agir contra os
islamistas.
Face a esta
situação, o Governo alemão tenta reagir. Durante o congresso do partido
conservador da chanceler, Angela Merkel, a CDU, foi aprovada uma moção que
afirma que “as actividades subversivas islamistas não serão toleradas”.
Referindo um
estudo segundo o qual uma parte dos alemães se sente estrangeiro no seu próprio
país, o ministro do Interior, Thomas de Maiziere, disse, em declarações ao
canal ARD, que é preciso “levar a sério estas preocupações” e “confrontá-las”.
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