Apple nega escravatura após BBC exibir reportagem numa fábrica na China
CLÁUDIA
BANCALEIRO 19/12/2014 - PÚBLICO
A Apple é uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, um negócio que
lhe tem dados lucros de vários mil milhões de dólares.
A Apple recorre a
unidades de produção em países asiáticos, como a China ou Malásia, para
produzir iPhones e iPads. Nos últimos anos foi acusada de não garantir os
direitos dos trabalhadores das unidades estrangeiras que contrata, uma alegação
que negou. Uma reportagem do programa Panorama, da BBC, revela agora a
realidade dos operários de uma fábrica em Xangai, onde existem turnos de 12
horas, que podem chegar a 18, e onde a exaustão leva os trabalhadores a
adormecerem nos seus postos. A Apple manifestou-se “profundamente ofendida” com
as conclusões da investigação.
Em 2010, as
condições de trabalho em fábricas na China contratadas pela Apple para o
fabrico dos seus produtos foi notícia, depois de ter sido tornado público que
14 trabalhadores de um dos maiores fornecedores chineses da norte-americana, o
Foxconn, se terem suicidado. As mortes terão sido o resultado da pressão
sofrida no local de trabalho para cumprir os objectivos da empresa. Na altura,
a Apple elaborou uma espécie de directiva a cumprir sobre a forma obrigatória
como os trabalhadores deviam ser tratados e dividiu a produção entre a Foxcon e
a Pegatron, situada nos arredores de Xangai.
Dois anos depois,
o jornal The New York Times publicava uma investigação em que revelava que
empregados de uma fábrica chinesa que fornecia a Apple trabalhavam em condições
desumanas. Na noite de quinta-feira, a BBC exibiu uma reportagem onde é
mostrada a forma como são tratados os trabalhadores chineses numa unidade da
Pegatron, onde é produzido o iPhone 6.
Na mesma
investigação da estação de televisão britânica, são mostradas imagens de
crianças a trabalhar em condições perigosas na ilha indonésia de Bangka, em
minas ilegais de estanho que estará a entrar na cadeia de produção da Apple,
segundo o programa Panorama.
Um jornalista
trabalhou infiltrado numa fábrica que produz partes para computadores Apple.
Aí, fez um turno de 18 horas seguidas apesar de ter feito pedidos de descanso,
que terão sido negados. Um outro jornalista, cujo turno mais longo durou 16
horas, confessou que mesmo esfomeado não teve forças para se levantar para
comer. “Queria apenas deitar-me e descansar. Não consegui dormir à noite por
causa do stress”.
Fazer horas extra
deveria ser voluntário, mas, segundo o programa Panorama, a nenhum dos seus
jornalistas foi dada outra alternativa. As condições dos dormitórios destinados
aos trabalhadores também são expostas na reportagem. Numa situação, um
jornalista teve que partilhar um quarto pequeno com 12 outras pessoas.
Além da China, a
BBC avança que encontrou ilegalidades graves na Indonésia, nomeadamente casos
de trabalho infantil. Na ilha de Bangka, foram filmadas crianças, entre os 12 e
14 anos, a procurarem estanho à mão em zonas perigosas, sob iminente risco de derrocada
de paredes de lama.
À reportagem, um
homem que pertencia a um grupo que recolhe estanho na zona avançou que o
material é vendido a uma fundição que está lista de fornecedores da Apple.
60 horas de
trabalho semanais
A empresa
norte-americana recusou um pedido de entrevista da BBC mas emitiu um comunicado
onde sustenta a sua posição sobre as conclusões da investigação. “Sabemos que nenhuma outra empresa está a
fazer tanto como a Apple para garantir condições de trabalho justas e seguras”,
indica a nota citada no site da BBC. “Trabalhamos com os fornecedores para
resolver deficiências e assistimos a uma melhoria contínua e significativa, mas
sabemos que o nosso trabalho nunca fica concluído”.
Ainda de acordo
com a empresa, é normal os trabalhadores fazerem sestas durante os turnos de
trabalho, mas que iria investigar se nos casos agora reportados os
trabalhadores tinham adormecido no seu posto de trabalho, como é visível nas
imagens mostradas pela BBC. Também a Pegatron indicou que irá iniciar o seu próprio
inquérito.
A Apple garantiu
que acompanha as condições de trabalho de mais de um milhão de pessoas e que no
caso da Pegatron a média de horas de trabalho semanais são 55.
Quanto às minas
ilegais de estanho, a empresa confirmou que 70% desta matéria é importada de
pequenas minas e que não é possível determinar nas unidades de fundição se vem
de uma mina ilegal ou não.
Num email enviado
aos perto de cinco mil trabalhadores britânicos, citado pelo jornal The
Telegraph, o vice-presidente das operações da Apple, Jeff Willians, afirmou, em
seu nome e no do presidente executivo da empresa, Tim Cook, que norte-americana
ficou “profundamente ofendida com a sugestão de que a Apple quebraria uma
promessa feita aos trabalhadores da sua cadeia de fornecedores ou enganaria os
seus clientes de alguma forma”.
Segundo Jeff
Willians, a Apple partilhou antecipadamente com a BBC os “factos e perspectiva”
do empenho da empresa no respeito dos direitos humanos, mas que o programa
Panorama “claramente falhou” em transmiti-los. Mais, o responsável sublinha que
a Apple confirmou o número de horas semanais de trabalho cumpridas por mais de
um milhão de pessoas nas unidades que contrata e que 93% destas cumpriram o
limite de 60 horas semanais imposto este ano.
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