Tsipras
dá mais um passo em desafio aos credores
MARIA JOÃO
GUIMARÃES 05/06/2015 - PÚBLICO
Primeiro-ministro
grego discursa perante o Parlamento e tenta que a oposição defina a
sua política em relação às propostas dos credores.
O primeiro-ministro
grego, Alexis Tsipras, rejeitou em termos claros a oferta dos
credores num discurso perante o Parlamento grego, voltando a
chamar-lhes "irrealistas" e "absurdas", dando
mais um passo no desafio à troika do Fundo Monetário Internacional,
Banco Central Europeu e Comissão Europeia.
A questão deverá
dominar o encontro do G7 na Alemanha, muito a contragosto da
anfitriã, Angela Merkel. No fórum os EUA deverão continuar a
pressão cada vez menos subtil sobre os europeus para cederem um
pouco e não desvalorizarem o perigo de uma saída da Grécia – não
só pelos riscos imprevisíveis para a economia global como pelo
perigo de perder a preciosa posição geoestratégica da Grécia.
Provavelmente jogando com isso, lembra o Guardian, Tsipras fez saber
esta sexta-feira que manteve uma conversa telefónica com o
Presidente russo, Vladimir Putin.
No Parlamento,
Tsipras argumentou que a proposta que o seu próprio Governo
apresentou aos credores, já resultado de um compromisso e com
concessões, é a única aceitável – "um acordo deveria ter
como principal objectivo uma economia sustentável". Já "as
propostas dos credores são irrealistas". Por isso – e foi com
esta frase que terminou o discurso –, "o Governo grego não
vai concordar com propostas absurdas".
Mas ao mesmo tempo
que levava o desafio em frente, garantia que um acordo está
"iminente".
Ainda antes do final
do discurso de Tsipras, o jornalista Nick Malkoutzis, do diário
Kathimerini e do site de análise Macropolis, resumia o objectivo:
"Tsipras está a tentar forçar os partidos da oposição a
dizer publicamente que rejeitam as propostas dos credores." Esta
é a altura de "responsabilidade para todos, sobretudo para o
Governo, mas também para a oposição", disse Tsipras. E pediu
a "todos os partidos" no Parlamento que apoiem os esforços
do Governo.
Uma frente nacional
unida seria crucial para desafiar deste modo os credores, que não só
têm insistido que é o seu plano, e não o de Tsipras, que é a base
das negociações, como têm recusado que a ideia é um compromisso a
meio-termo entre as posições de todos. Como disse o chefe do
Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, "não é verdade que tenhamos de
encontrar um meio-termo – essa não é a nossa intenção".
Numa crise que
demasiadas vezes tem sido vista por um prisma moral, o
primeiro-ministro grego declarou que "a asfixia económica de um
país é uma questão moral" e garantiu: "Não nos vão
humilhar."
O Governo
esforçou-se por manter o discurso secreto numa questão que tem sido
dominada por fugas de informação, rumores e tiradas de fontes não
identificadas. Apenas foi discutido pessoalmente, evitando
telemóveis, conta Paul Mason, do Channel 4 da TV britânica. A
imprensa antecipava vários cenários, incluindo o anúncio de
eleições. A contribuir para a atmosfera dramática, nuvens-chumbo
de tempestade enquadravam o Parlamento na praça Syntagma
(Constituição).
Tsipras fez ainda o
seu discurso de recusa quando uma sondagem dizia que a maioria dos
gregos preferia que as propostas dos credores fossem aceites: 47%
querem que o Governo aceite o plano da troika enquanto 35% querem que
as recuse, diz o inquérito do instituto Metron Analysis.
O desafio do
primeiro-ministro segue-se ao apoio à posição do Governo grego de
uma série de economistas no diário financeiro Financial Times,
incluindo o prémio Nobel Joseph Stiglitz, o francês Thomas
Picketty, o antigo primeiro-ministro italiano Massimo D’Alema, e o
americano Jamie Galbraith. Criticando as "concessões
constantes" que estão a ser exigidas ao Governo grego, os
signatários dizem-se desapontados com os líderes europeus por estes
não estarem a colaborar com o executivo grego que iniciou já duas
grandes mudanças na lista contra a evasão fiscal e corrupção, que
a austeridade está a "minar" quando o objectivo dos
parceiros deveria ser encorajar o seu sucesso. Termina avisando: "O
modo como a Grécia for tratada enviará uma mensagem a todos os seus
parceiros da zona euro."
A oposição reagiu
ao discurso de Tsipras com questões e críticas. O anterior chefe de
Governo, Antonis Samaras, disse que a má gestão por parte de
Tsipras e do Syriza levou a que muitos credores estejam a fazer mais
exigências do que em 2014. "Vocês destruíram totalmente o
país e isolaram-nos." E duvidou da incongruência de Tsipras
dizer que um acordo está iminente e que o plano apresentado pelos
credores é absurdo.
Nas eleições
antecipadas de Janeiro, o Syriza venceu ficando a pouco da maioria
absoluta com 149 deputados num Parlamento de 300 deputados –
coligou-se com o partido populista Gregos Independentes, que tem 13
deputados. O Syriza teve uma votação de 33%, e as últimas
sondagens têm indicado que teria um melhor resultado se a votação
fosse hoje – e que na oposição, a Nova Democracia diminuiria
ainda mais os 27% que obteve em Janeiro e que correspondeu a um grupo
parlamentar de 76 deputados. Ainda esta sexta-feira, uma sondagem do
instituto Metron para o jornal Parapolitika dava entre 45% de
intenções de voto ao Syriza, 21,4% à Nova Democracia e 7% ao To
Potami, com os socialistas (PASOK) renegados para sétimo lugar com
3,8%.
Num lembrete da
realidade política grega por vezes esquecida, no debate seguiu-se o
presidente do partido de extrema-direita Aurora Dourada, que com 6,3%
nas últimas eleições elegeu 17 deputados (nesta sondagem aparecia
logo a seguir ao Rio, com 5%). Muitos deputados saíram enquanto
falava Nikos Mihaloliakos, que está preso preventivamente, acusado
de associação criminosa e outros delitos.
Por último, falou
Evangelos Venizelos, do PASOK, acusando o Governo de "enquanto
diz que não implementará a austeridade, trazer o país para a
recessão".
Alguns analistas
elogiaram a manobra política de Tsipras, outros lamentaram que o
primeiro-ministro dissesse que havia um acordo próximo enquanto
rejeitava as ofertas que lhe foram feitas. Depois do debate, a
situação continuou tão incerta como antes.
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