A
solidão de Angela
Teresa de Sousa /
20-6-2015 / PÚBLICO
1.Como era
inevitável, a decisão sobre a Grécia, seja ela qual for, será
tomada na cimeira da zona euro, convocada para a próxima
segundafeira. As decisões políticas cabem aos líderes e, ainda
mais, aquelas que podem ditar o futuro da Europa. A palavra decisiva
caberá à chanceler alemã.
Angela Merkel
enfrenta provavelmente a decisão mais dramática da sua vida.
Liderar tem custos por vezes muito altos, como ela própria tem
aprendido nos últimos tempos. Como sempre, a chanceler decidirá no
último minuto e com o menor custo possível. Seja ele político ou
financeiro. Tem dois cenários à sua frente e não pode adiar mais
uma escolha. Já deu alguns sinais sobre qual será o da sua
preferência. “Ela quer evitar um ‘Grexit’ quase a qualquer
custo”, escreve Nikolaus Blome, jornalista alemão, no site do
Politico-Europa. O que a move é diferente do que move o seu ministro
das Finanças, Wolfgang Schäuble, que está genuinamente convencido
de que o euro ficaria melhor sem a Grécia e que os riscos de um
contágio seriam mínimos. Para ela a questão é política e tem a
ver com o seu papel na História. Wolfgang Munchau, o colunista do
Financial Times, já escreveu noutras ocasiões de grande incerteza
que Merkel não gostaria de ficar na História como a chanceler que
veio do Leste para acabar com União Europeia. Blome cita um
“murmúrio” perfeitamente audível de Merkel há meia dúzia de
meses: “A Alemanha seria olhada como tendo destruído a Europa pela
terceira vez no espaço de um século.”
2. Dos dois
cenários, é a saída que ela mais teme. “Está prisioneira da
história alemã”, diz Blome. A diferença é que o apoio que
sempre teve na Alemanha à sua política europeia e que foi até
agora a sua grande força desta vez não parece estar garantido. Nos
media, nas associações patronais, no seu próprio partido crescem
os apoiantes do “Grexit”. Wolfgang Schäuble tem estado na linha
da frente das negociações que decorrem no Eurogrupo e sente o
desgaste. Não suporta o vedetismo histriónico do seu homólogo
grego. É um sentimento bastante generalizado. Mas não é esta a
questão principal. Para os chefes do Tesouro dois mais dois
continuam a ser quatro. As contas são diferentes quando se passa ao
Conselho Europeu e as decisões são políticas — dois mais dois
podem ser cinco. Os líderes europeus sabem como tomar decisões
suficientemente ambíguas para encontrar um compromisso sem fechar
totalmente a porta a “clarificações” futuras. É neste quadro
que a chanceler vai decidir. Há apenas uma regra que deve ser
preservada: evitar a capitulação de um dos lados. Merkel não pode
desiludir totalmente os alemães, mas está no seu terceiro mandato,
prestes a superar a longevidade de Helmut Kohl, e sabe que a decisão
que tomar sobre a Grécia se projectará muito para além das
próximas eleições. Pode usar algum do capital político que
acumulou e está em boa posição para chegar a um acordo. Teve o
cuidado que não entrar na guerra das acusações. Nunca disse que se
lhe tinha “esgotado a paciência”, a frase mais ouvida nas
últimas semanas na boca dos responsáveis europeus. Chega ao
Conselho Europeu sem se ter comprometido com nada. Terá apoios à
mesa do conselho, mas também alguns críticos. Alexis Tsipras tem de
levar alguma coisa consigo de regresso a Atenas que prove aos gregos
que valeu a pena. É este exercício difícil que vai ter de ser
feito na próxima segunda-feira. Como escreve o Financial Times num
longo editorial a apelar ao bom senso, deixar cair a Grécia no caos
seria “um rude golpe para o ideal europeu”.
3. A chanceler quer
um acordo e a Grécia precisa de um acordo. É impensável imaginar
que o primeiro-ministro grego considere de ânimo leve um default,
empurrando os gregos para uma situação ainda mais desumana. É
difícil de entender o que o faz esticar a corda nesta contagem
decrescente para a hora da verdade. Aposta que Merkel não o deixará
cair, mas corre o risco de se enganar, como se enganou sobre outros
apoios que nunca chegaram. A visita que ontem fez a Vladimir Putin
foi um péssimo cartão-de-visita para desanuviar o ambiente e
retomar alguma confiança mútua. Para quem o ouviu, parece que não
precisa da Europa para nada. Ultrapassou todos os limites. Porquê?
Há coisas em que os
gregos têm razão. O que Yanis Varoufakis disse na quinta-feira, em
conferência de imprensa depois de mais uma reunião falhada, seria
normal se viesse da boca de muitos economistas americanos: faremos as
reformas mas precisamos de mais tempo para pôr a economia a crescer.
O que lhe falta hoje é credibilidade, que esbanjou nos últimos
cinco meses. Berlim também poderia hoje admitir que a receita da
troika pode não ter sido a melhor, se, cinco anos depois, a Grécia
volta ao ponto de partida. E há ainda outra questão muito simples:
se Antonis Samaras fosse ainda o primeiro-ministro, os responsáveis
europeus (a começar por Merkel) tratá-lo-iam da mesma maneira?
Samaras convocou eleições porque as negociações com a troika
estavam num impasse. Também ele se negava a aceitar algumas das
receitas mais amargas impostas por Bruxelas. Enganou-se nos cálculos
e perdeu. Uma vacina para dissuadir futuros Syrizas? Não chega nem
será o melhor caminho. São também os nacionalistas do Norte que
ganham terreno que é preciso dissuadir. Basta olhar para a
Dinamarca, onde os populistas ficaram acima dos liberais, ou para a
Finlândia, onde os Verdadeiros Finlandeses já estão no Governo.
Aliás, os líderes europeus vão fazer tudo para que uma solução
para a Grécia possa ser encontrada sem novo resgate oficial. Seria
muito difícil fazê-lo aprovar em muitos parlamentos nacionais
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