A
última batalha pela Grécia
Teresa de Sousa /
18-6-2015 / PÚBLICO
1.Quando a crise
grega se aproxima inexoravelmente da hora da verdade, duas questões
políticas fundamentais continuam sem resposta. A primeira diz
respeito a Berlim, a outra a Atenas. Em Berlim, a chanceler não abre
o jogo sobre o que pensa realmente do desfecho da crise. E, como
escrevia ontem José Ignacio Torreblanca no El País, a única coisa
de que há certeza é que “a decisão final será tomada por Angela
Merkel”. Já aprendemos que a chanceler decide sempre no último
minuto. Será a sua vontade a prevalecer, mesmo que, desta vez, haja
posições distintas dentro do Governo alemão. A mais óbvia será a
de Wolfgang Schäuble, um dos últimos europeístas do tempo de
Helmut Kohl, que parece convencido de que a zona euro ficaria melhor
sem a Grécia, e que considera não haver um risco de contágio aos
países mais vulneráveis do Sul, com consequências imprevisíveis
para toda a zona euro. Outro sinal de que as coisas estão a mudar em
Berlim veio das declarações recentes de Sigmar Gabriel, líder do
SPD e vice-chanceler do Governo de “grande coligação”. O SPD
teve sempre a preocupação de não fazer muitas ondas em matéria de
política europeia, pela razão simples de que quase 80 por cento dos
alemães apoiam a chanceler neste domínio. Desta vez, Gabriel
endureceu o discurso: “Se um acordo não for alcançado, a
paciência de muita gente pode acabar.” A frase seguinte é a
novidade: “Não deixaremos os trabalhadores alemães e as suas
famílias pagarem pelas promessas eleitorais exageradas de um governo
que é parcialmente comunista.” Quebrou um tabu. A ideia do SPD não
é impedir um acordo, mas “dividir” o Syriza entre aqueles com
quem é possível negociar, como Alexis Tsipras, e os sectores mais
radicais do partido que, em última análise, não querem nem o euro
nem a Europa. Um compromisso com o primeiro-ministro grego poderia
ajudar a separar as águas, abrindo as portas para um entendimento
com forças políticas mais moderadas e pró-europeias, com o To
Potami (6,1 por cento e 17 deputados), que é, entre os partidos
gregos no Parlamento, o mais pró-europeu e cujo líder já disse que
apoiará qualquer acordo que mantenha a Grécia no euro. Jean-Claude
Juncker falou recentemente com alguns partidos da oposição grega
para avaliar da sua disponibilidade para apoiar um acordo. É uma
aposta arriscada, mas é ela que justifica as palavras do líder do
SPD alemão. Ontem, a chanceler reagiu sem alarido às duríssimas
críticas de Tsipras contra a “pilhagem” europeia e a tentativa
de humilhar a Grécia (as palavras mais duras foram para o FMI).
“Estou a concentrar toda a minha energia na ajuda às três
instituições para que encontrem uma solução”, disse a chanceler
em Berlim. As acusações de Tsipras são vistas em meios ligados às
negociações como uma “carta moral”. Uma maioria de gregos
continua a querer ficar no euro, mesmo que, para isso, tenha de
aceitar um mau acordo. É difícil avaliar a margem de manobra
interna de Tsipras, aceitando como bom que ele quer um acordo.
2. O comportamento
do Governo grego nos últimos cinco meses tem sido criticado por
muitos analistas. Tsipras fez uma avaliação errada dos apoios com
que poderia contar entre os seus pares europeus e as instituições
da União. Eram escassos, como se viu, deixando à chanceler a
decisão final. Ontem, pela primeira vez, um primeiroministro
europeu, no caso o chanceler austríaco, Werner Faymann
(social-democrata), foi a Atenas testemunhar a sua solidariedade com
Tsipras. É caso raro. François Hollande quer continuar a ser o
“melhor amigo” de Merkel e já só pensa em ganhar um segundo
mandato. Os países ibéricos não querem ver o “infractor”
premiado: Lisboa porque quis beber o cálice da austeridade até ao
fim; Madrid por causa do Podemos. Os nórdicos terão imensa
dificuldade em fazer aprovar nos respectivos parlamentos mais ajudas
para Atenas, que serão necessárias no caso de haver um acordo. Os
países do Leste argumentam que não estão para financiar um país
cujo rendimento per capita é maior do que o deles (ou, pelo menos,
de alguns). Mesmo com um acordo vai ser difícil vencer todos estes
obstáculos.
3. A Grécia só
continua a respirar graças aos apoios de urgência do BCE ao seu
sistema bancário (o chamado ELA). Mario Drahgi avisou os europeus de
que uma saída da Grécia lançaria a zona euro “em mares nunca
dantes navegados”. Ou seja, ninguém pode garantir que uma união
monetária que seja reversível não tenha efeitos sobre o euro e,
sobretudo, sobre os seus países mais vulneráveis (Portugal está na
linha da frente). Podia não ser agora, mas na próxima crise. A
tentação de “purificar” o euro aumentaria. O FMI quer livrar-se
desta “aventura” em que entrou graças à pressão de Merkel em
2010.
Depois do G7, a
pressão americana sobre a Grécia também aumentou. Obama olha para
a crise grega do ponto de vista geopolítico. O Presidente americano
já disse aos seus aliados europeus que esta é uma péssima altura
para atirar a Grécia para os braços da Rússia. Além disso, os EUA
têm uma base naval em Creta e olham para a Grécia como uma “guarda
avançada” numa região cada vez mais instável. “As
consequências não seriam apenas económicas mas humanas,
geopolíticas e históricas”, diz o historiador britânico Timothy
Garton Ash. “A Europa nunca mais seria a mesma.” E há ainda
outra coisa: os gregos pagariam um preço altíssimo se a Grécia
saísse, tão alto que abriria as portas a toda a espécie de
extremismos. Seria difícil aos europeus virar a cara.
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