O
aumento omnipotente dos voos “low cost” possibilitou uma
Turistificação Omnipresente…
Esta
Globalização do “direito à viagem” traz também um aumento da
poluição através do tráfego aéreo, isto, em paradoxo
irresponsável com o Aquecimento Global.
“O
futuro preocupa. O movimento de passageiros promete mais do que
duplicar até 2030, segundo as previsões da Organização
Internacional para a Aviação Civil. O número de aviões a cruzar
os céus deverá aumentar de cerca de 20 mil hoje para 42 mil em 2030
e 56 mil em 2040. E, sem medidas para as conter, as emissões de CO2
podem subir de duas a mais de quatro vezes até 2050.”
OVOODOCORVO
Ruído
e CO2: como é que a aviação vai resolver estes problemas?
RICARDO GARCIA
06/06/2015 – PÚBLICO
Os
aviões de hoje são incomparavelmente menos ruidosos e poluentes do
que no passado. No entanto, em 15 anos haverá o dobro deles no ar,
com o dobro dos passageiros. Os desafios, diz a indústria,
resolvem-se com um “ecossistema” de soluções.
Sentado na cabina de
comando do Airbus A350, o piloto Frank Chapman debruça-se sobre o
teclado do computador. O equipamento está embutido na mesinha
retráctil que ocupa um vazio onde deveria estar o manche –
substituído por joysticks laterais.
Chapman, piloto de
testes da Airbus desde 2004, digita alguns comandos e mostra o
resultado num dos ecrãs do moderno cockpit. É apenas uma
demonstração, afinal o avião está parado no Aeroporto de
Toulouse, França, junto às instalações da Airbus.
Tal como o gigante
A380, o A350 – o mais recente modelo da companhia – pode ser
programado para efectuar automaticamente um modo de descolagem
diferente, para evitar parte do ruído. Muitos aeroportos já exigem
que os aviões comecem por subir rapidamente até um determinado
nível, mas depois reduzam a escalada sobre zonas urbanas mais
sensíveis e só voltem a acelerar quando já estão mais altos. É
algo que implica estar a ajustar a potência dos motores
sucessivamente, tarefa que nos novos Airbus fica a cargo do
computador de bordo. “Sempre que há um procedimento específico
para um aeroporto, podemos programá-lo”, explica Frank Chapman.
Tudo conta hoje para
reduzir o ruído dos transportes aéreos. Juntamente com as emissões
de CO2, é o impacto ambiental mais saliente da aviação. E,
ironicamente, um avião hoje faz 75% menos barulho do que um aparelho
do início da era dos jactos comerciais, há mais de meio século.
“As pessoas não se dão conta de que, quando um avião passa por
cima de nós, já não temos de parar de conversar”, disse
Christopher Buckley, vice-presidente executivo da Airbus para a
Europa, África e Ásia-Pacífico, num encontro recente sobre aviação
e ambiente em Toulouse.
Mas com muito mais
aviões no ar e com a urbanização a aproximar-se dos aeroportos, ou
vice-versa, a preocupação com a poluição sonora está ao rubro em
determinados países. No Reino Unido, é um dos principais argumentos
contra a construção de uma terceira pista no Aeroporto de Heathrow
ou de uma segunda em Gatwick, ambos em Londres. O mesmo se passa em
Hong Kong. Em Lisboa, apesar da evolução dos últimos anos, os
valores de ruído do aeroporto mantinham-se acima dos limites legais
em Camarate e na Cidade Universitária em 2013.
“O ruído está de
novo na agenda”, confirma Jonathon Counsell, director de Ambiente
da British Airways. Há uma percepção diferente entre os cidadãos,
diz Counsell. Antes, 90% do som dos aviões vinha dos motores. Agora,
são apenas 50% e já há queixas em Londres do barulho específico
quando as aeronaves baixam o trem de aterragem.
Até agora, o
problema tem sido atacado sobretudo nos motores. A sua operação é
tanto menos ruidosa quanto maior for o rotor dianteiro, que
impulsiona mais de 80% do ar por fora do reactor propriamente dito e
canaliza apenas uma pequena parte para dentro da turbina, para a
combustão. Os que estão a ser usados no Airbus A350 são tão
grandes que têm o diâmetro da fuselagem de um Concorde. O resultado
é de tal forma evidente que o avião foi baptizado de Hushliner –
numa alusão dupla ao silêncio e ao Dreamliner, o Boeing 787 que é
concorrente do A350.
Mas não se pode
aumentar indefinidamente o tamanho da carenagem em torno do rotor
dianteiro. O seu peso, a partir de um certo ponto, compromete os
ganhos de eficiência. “É uma questão física”, diz Caroline
Day, directora de Marketing, Estratégia e Programas Futuros da Rolls
Royce, um dos três principais fabricantes de motores para aviões.
“E os motores não podem arrastar no chão. A partir de um certo
tamanho, torna-se impossível”, acrescenta.
A luta contra o
ruído está agora mais nos pormenores. As pás do rotor principal e
as carenagens dos motores, por exemplo, estão a ser feitas de
materiais compósitos, em peças mais leves e com menos emendas,
reduzindo o atrito e as vibrações.
Nas aterragens, a
batalha vai provavelmente alterar procedimentos que estão há
décadas nos manuais de pilotagem. Os aviões normalmente descem
seguindo um trajecto com uma inclinação de três graus em relação
ao solo. Sempre foi este o padrão. Mas se este declive for
ligeiramente maior, de 3,2 graus, o avião estará cerca de 90 metros
mais alto quando se encontrar a dez milhas (cerca de 18 quilómetros)
do aeroporto, causando menos incómodo sonoro.
Se o ângulo for de
quatro graus, a diferença é ainda maior, cerca de 300 metros. Em
termos de ruído, são cinco decibéis a menos – um valor
expressivo. Embora a diferença na inclinação pareça pequena, não
é fácil porém lidar com ela ao pilotar um grande avião comercial.
A velocidade aumenta e é mais difícil manter uma aproximação
estabilizada. “É uma questão de gerir a energia”, explica o
piloto Frank Chapman.
Uma alternativa
poderá ser uma aproximação em duas fases: primeiro com um ângulo
de descida maior, depois estabilizando a rampa nos três graus
usuais, na aproximação final.
As emissões de CO2,
a outra dor de cabeça ambiental da aviação, também padecem de uma
ironia. Com aviões cada vez mais eficientes, a quantidade de
combustível necessária para transportar um passageiro caiu
brutalmente nas últimas três décadas. Mas o tráfego aéreo
aumentou e as emissões totais do sector também, embora representem
apenas 2% de todo o CO2 lançado pelas actividades humanas.
O futuro preocupa. O
movimento de passageiros promete mais do que duplicar até 2030,
segundo as previsões da Organização Internacional para a Aviação
Civil. O número de aviões a cruzar os céus deverá aumentar de
cerca de 20 mil hoje para 42 mil em 2030 e 56 mil em 2040. E, sem
medidas para as conter, as emissões de CO2 podem subir de duas a
mais de quatro vezes até 2050.
As companhias aéreas
não querem ter este peso sobre os ombros e acordaram metas
voluntárias ambiciosas, no seio da Associação Internacional de
Transporte Aéreo: atingir o pico das emissões em 2020 e depois
reduzi-las até 2050 para 50% dos níveis de 2005.
“É um desafio
para a indústria, não é uma questão de relações públicas”,
afirma Jonathon Counsell, da British Airways. “Caminhar para um
paradigma neutro em carbono é algo que irá mudar o jogo”,
corrobora Mark Watson, director da área ambiental da Cathay Pacific.
Do lado tecnológico,
há muitas soluções em marcha. O Airbus A380 – 162 deles já a
voar comercialmente – consome menos 20% de combustível e emite
menos 40% de CO2 do que um avião actual da mesma categoria. No
Boeing 787 Dreamliner – 269 em operação –, a poupança também
é de 20% em combustível. E no A350 – três já entregues e mais
12 previstos até ao final do ano – chega aos 25%.
Aviões já
existentes também estão a ser reconfigurados, como novos motores,
“barbatanas” na ponta das asas e outras melhorias. O A320neo,
cuja primeira unidade a Airbus entregará à Qatar Airways no último
trimestre deste ano, lançará menos 20% de CO2 para a atmosfera do
que os A320 actuais. E o equivalente da Boeing – o 737 MAX, que
entrará nas frotas comerciais a partir de 2017 – promete 13% de
redução no consumo de combustível.
Mas a tecnologia dos
aviões não vai resolver sozinha o problema. Combustíveis
alternativos, a operação dos voos e até a gestão do tráfego
aéreo também entram na equação. “Quando se é obrigado a voar
em círculos por meia hora, à espera de uma brecha para aterrar,
perdem-se os benefícios de tudo o resto”, exemplifica Charles
Champion, vice-presidente da Airbus para a área da engenharia.
Os biocombustíveis
já estão a ser utilizados na aviação comercial desde Junho de
2011, data de um primeiro voo da KLM, entre Amesterdão e Paris, com
óleo de cozinha incorporado no jetfuel. A companhia aérea espera
multiplicar por dez o seu uso este ano, em relação a 2014.
“Acreditamos que será um elemento-chave para a indústria da
aviação”, afirma Ellen van de Tweel, directora de inovação na
KLM.
Mas os
biocombustíveis têm estado sob fogo cruzado, por competir com a
produção de alimentos e destruir florestas. Além disso, por ora
ainda são mais caros. “É uma questão económica. Não podemos
pagar um prémio pelo jetfuel”, afirma Jonathon Counsell, da
British Airways.
Todas as soluções
somadas não chegarão para reduzir as emissões de CO2 da aviação
em 50% até 2050. Uma parte deste esforço vai passar necessariamente
pela compensação com créditos de carbono transacionáveis –
incluindo os gerados por investimentos em projectos “verdes”
noutras áreas. No entanto, um mercado de carbono para a aviação à
escala global é algo que ainda está em discussão nas Nações
Unidas, depois de um arranque falhado na União Europeia – que quis
impor um sistema próprio a todas as companhias aéreas que operam
nos aeroportos europeus. Perante forte contestação, Bruxelas teve
no entanto de suspender a medida. “O sistema foi mal desenhado e é
muito distorcido”, afirma Mark Watson, da Cathay Pacific. Mas teve
o mérito de dar um empurrão às negociações internacionais,
completa Watson.
O mercado de carbono
será mais um elemento a ligar-se a outros na luta da aviação para
deixar de ser o modo de transporte menos amigo do ambiente. A
indústria acredita nesta via, com múltiplas medidas unidas
organicamente. Como resume Charles Champion, da Airbus: “É cada
vez mais um ecossistema.”
O jornalista viajou
a Toulouse a convite da Airbus
Sem comentários:
Enviar um comentário