Segundo
resgate? Não teremos esse azar (ou sorte)
Helena Garrido
Há uma hora /
OBSERVADOR
O
ministro das Finanças está a trabalhar para evitar um segundo
resgate. Pelo menos Centeno está a ver a realidade. Infelizmente,
mais apoio financeiro não será fácil. E por isso aí vêm mais
impostos.
“Com papas e bolos
se enganam os tolos”. Mas parece que por Portugal abundam poucos
tolos, a crer na reacção que os portugueses estão a ter à
combinação de política económica escolhida pelo Governo. Estamos
a gostar da mensagem, levando em conta as sondagens, mas não
actuamos de acordo com o que nos está a dizer o Governo. Qualquer
coisa como “ouve o que eu digo, mas não faças o que eu digo”.
As perspectivas que,
em matéria de impostos, abrem o Orçamento do Estado de 2017 são
igualmente desanimadoras. O Negócios revela esta quinta-feira que o
Governo prepara um novo imposto sobre património imobiliário. Temos
de nos preparar para ver o sector imobiliário perder a pouca
animação que tinha, especialmente no segmento da requalificação
de casas no centro das grandes cidades. Esperemos que não se
confirme, mas este imposto tem condições para ser mais um
contributo para afundar a economia.
O imposto anunciado
revela ainda até que ponto um país pode ser conduzido pela política
no seu pior sentido. Primeiro incentivam-se as pessoas a comprarem
casa, depois atira-se com impostos e mais impostos em cima das casas.
E, na conjuntura actual, as melhores soluções de política
económica não são adoptadas ou por razões eleitoralistas ou para
não reconhecer que a receita de devolver rendimentos, por ter sido
demasiado rápida, agravou ainda mais os nossos problemas.
Lamentavelmente para
nós, o modelo que Mário Centeno usou para fazer o programa
económico do PS deve ter-se esquecido de levar em conta a restrição
financeira. Infelizmente para nós, com o seu modelo validou
tecnicamente uma política económica que nos vai sair cara, nesta
era populista que estamos a viver.
Na ausência de
reacção da economia aos incentivos do Governo para aumentar o
consumo, o Orçamento do Estado para 2017 dá o primeiro ar da sua
graça revelando uma medida que vai também desincentivar o
investimento em imobiliário. Não é obviamente um contributo para o
dinamismo da economia. E sem crescimento a dívida torna-se mais
pesada, mais difícil de pagar.
Estamos entregues a
nós próprios. Porque na frente da política europeia não existem
condições para ajudas fáceis no curto prazo. Os mais importantes
países europeus, designadamente a Alemanha e a França, não vão
querer ouvir falar em “resgates” durante os próximos doze meses.
Eleições, eis os
acontecimentos que vão apoiar Mário Centeno na sua batalha contra o
resgate. A Alemanha terá eleições no Outono de 2017, a França
eleições na Primavera de 2017. Ninguém vai querer debater as
necessidades financeiras de Portugal, especialmente depois de parte
delas terem sido criadas pelos governantes do país.
Um dos mais
preocupantes sinais de pressão chega da taxa de juro da dívida
pública. Apesar de o BCE estar no mercado a comprar títulos, a
diferença entre as taxas de juro da dívida portuguesa a dez anos e
as da Alemanha têm estado a subir. Nos últimos seis meses de 2015 a
média dessa diferença foi de 1,92 pontos percentuais. A média dos
últimos seis meses terminados em Agosto foi já de 2,89 pontos
percentuais.
A pressão no
mercado primário – aquele que nos dá os juros de facto pagos pelo
Estado – também já se fez sentir na quarta-feira, dia 14 de
Setembro. No empréstimo de 500 milhões a sete anos, o Tesouro pagou
2,82% quando antes a taxa tinha sido 2,35%. No financiamento de 250
milhões a 20 anos suportou um juro de 4,02%, o que compara com 3,23%
na emissão anterior equivalente. A desconfiança começa a ter
efeitos.
Infelizmente,
alertar para os riscos que estamos a correr é uma tarefa inglória.
Há vários estudos académicos, designadamente no domínio da
economia comportamental, a demonstrarem que os avisos pouco ou nada
mudam a dinâmica da realidade. Um facto que se aplica especialmente
nos mercados financeiros, mas também a qualquer anúncio de uma
crise. Foi assim, por exemplo, na crise financeira de 2007 que,
apesar de alguns a terem antecipado, ninguém conseguiu evitar.
Na resposta a uma
pergunta sobre um eventual segundo resgate Mário Centeno disse que
esse era o seu trabalho, evitá-lo. As reacções que estamos a ver
na economia e nos mercados financeiros dizem-nos que estamos a entrar
em zonas cada vez mais arriscadas, andamos crescentemente no radar
dos analistas e comentadores como um país no fio da navalha. Para já
poderemos não ter o azar (ou a sorte) de um segundo resgate, porque
os países europeus preferem agora fingir que nada está a acontecer.
Mas isso significa que temos de arranjar dinheiro de outra forma.
Mais impostos já se anunciam.
Com “papas e bolos
se enganam os tolos”, apenas parcialmente. Gostámos de ouvir que
acabou a austeridade mas não actuámos como se ela tivesse
terminado. Ainda bem.
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