Reabilitação
e vulnerabilidade sísmica em Portugal
João Mascarenhas
Mateus
14/09/2016 - PÜBLICO
A
demolição parcial de alvenarias das fachadas dos edifícios e das
paredes interiores para instalação de cablagens e tubagens deveria
constituir uma prática interdita.
Depois de uma
catástrofe sísmica como a que ocorreu em Amatrice, Itália,
discute-se no espaço público a necessidade de legislação e de
práticas administrativas capazes de reduzir a vulnerabilidade
sísmica do edificado urbano e do património artístico e
arquitectónico.
Um plano estratégico
nacional de segurança aos sismos deveria obrigatoriamente contemplar
o controlo de uma tipologia de intervenções nos edifícios com
fachadas em alvenarias resistentes, espalhados por todo o território
nacional e particularmente presentes nos nossos centros históricos.
Refiro-me expressamente, e com enorme preocupação, a intervenções
como a abertura de roços e de nichos para contadores destinados à
passagem dos cabos das empresas de telecomunicações e electricidade
e das tubagens das concessionárias de água e de gás.
Quem caminhe pelas
ruas de muitas das cidades portuguesas pode assistir todos os dias à
demolição parcial das bases das fachadas de alvenaria de tantos
edifícios, a escopro e martelo ou com o auxílio de martelos
mecânicos. O comportamento mecânico das alvenarias de pedra, de
tijolo ou mistas depende da transferência gradual das cargas
superiores até às fundações, pela compressão das secções
resistentes. Numa parede de fachada em alvenaria, as zonas maciças
entre os vãos de portas e de janelas (nembos) são as responsáveis
por essa transferência de cargas. As tensões mecânicas nesses
nembos dependem pois das cargas a transmitir e das dimensões das
secções dos mesmos. Reduzindo as secções com a abertura de nichos
e de roços, aumenta-se e concentra-se consideravelmente o valor
dessas tensões permanentes, reduzindo a sua capacidade resistente a
cargas adicionais e acidentais. Numa situação sísmica, equivalente
à actuação horizontal e vertical de forças acidentais sobre estas
estruturas, os nembos debilitados terão pois uma capacidade
resistente muito inferior à original.
Por isso, a
demolição parcial de alvenarias das fachadas dos edifícios e das
paredes interiores para instalação de cablagens e tubagens deveria
constituir uma prática interdita nas acções de renovação e
reabilitação urbana. Contudo, e quando consideradas inevitáveis e
insubstituíveis, essas acções deveriam ser acompanhadas de um
projecto de reforço estrutural.
Assim, são
necessários planos municipais integrados e calendarizados para a
efectiva criação de redes subterrâneas de distribuição de
cablagens que hoje são suspensas das fachadas e das tubagens, como
contrapartida das servidões municipais. Ao mesmo tempo, importa
estabelecer e colocar em prática uma legislação nacional que
defina critérios de mínima intrusividade para essas instalações
em edifícios em alvenarias. De facto, sem a implantação destas
medidas urgentes que deverão fazer parte de um plano estratégico
nacional e de planos municipais integrados, a vulnerabilidade sísmica
dos nossos centros urbanos crescerá todos os dias um pouco mais.
Engenheiro, CIAUD –
Faculdade de Arquitectura, Universidade de Lisboa
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