Hoje
em Berlim tomam lugar as eleições . O grande tema das eleições é
o direito de habitar, o aumento galopante do preço das casas , a
especulaçào Imobiliária …
Este
será também um dos temas fundamentais nas próximas eleições de
Lisboa.
OVOODOCORVO
"Tem
de haver residentes nos prédios de alojamento local"
18 DE SETEMBRO DE
2016
00:45
Marina Almeida
Os
bairros históricos de Lisboa estão a mudar: têm mais gente, grande
parte estrangeiros que lhes dão uma vida diferente. Quem lá mora há
muitos anos, ou desde sempre, está dividido: por um lado reconhece
que os turistas trazem um ambiente novo, por outro temem a perda de
identidade. O presidente da Junta de Santa Maria Maior dá a sua
visão sobre um tema que o DN contou ontem numa grande reportagem.
Quais são os
problemas e as virtudes do alojamento local? Por um lado cada vez se
encontra menos população e comércio local nos bairros mas por
outro os prédios estão arranjados.
A imagem é forte
demais mas faz-me lembrar quando foi a polémica da bomba de neutrões
ainda nos tempos da Guerra Fria em que estaria a ser desenvolvida uma
bomba de neutrões que aniquilava as pessoas mas os edifícios
ficavam todos em pé. Eu não me interessa ter muitos prédios
recuperados e depois não morarem lá pessoas, sobretudo pessoas do
bairro e dos bairros. Passando a imagem mais catastrófica, a questão
que se coloca é que a razão principal pelas quais os turistas
visitam a cidade de Lisboa segundo um inquérito que foi realizado
aqui há uns anos pela Direção de Turismo da Câmara de Lisboa é
curiosamente a autenticidade. Entre gastronomia, sol, luz,
arquitetura, tudo isso. Portanto se esta cidade e se esta freguesia
que é Santa Maria Maior e é o coração de Lisboa, tem os bairros
históricos de Lisboa, perder a autenticidade, também esta demanda
tenderá a esvaziar-se.
Alfama e Mouraria
são os bairros mais afetados?
Aquilo que está a
acontecer sobretudo em Alfama de forma acentuada mas também na
Mouraria é uma espécie de assalto onde as pessoas que nasceram
nestes territórios e que sempre viveram lá são repentinamente
empurradas para fora. Ou a troco de indemnizações que não têm uma
particular relevância, ou mesmo à força da legislação que
permite fazer isso. Eu não diabolizo o turismo, é importante para a
nossa economia, para a criação de emprego, mas não pode questionar
a qualidade de vida de quem cá mora nem a preservação do seu modo
de vida. Quando isso acontecer é o próprio turismo que fica
condenado e vai para outras paragens.
O que deve ser
feito?
Esta lei das rendas
já devia ter sido alterada. Aliada ao facto se ter descoberto de
repente que o alojamento local é um investimento de lucro muito
elevado e pouco taxado do ponto de vista dos impostos, está a fazer
que seja muito fácil hoje em dia correr com um cidadão que mora no
bairro há 20, 30 anos, às vezes há mais, para o substituir por
outro tipo de residente que está 4,5 dias, depois vem outro que está
6,7 dias, não são residentes fixos.
É uma população
flutuante.
É uma população
flutuante que por muito simpática que seja descaracteriza os
bairros, não é aquela população tão boa para o comércio em si.
É uma população que desestabiliza a qualidade de vida de quem lá
mora. Num prédio onde haja habitação permanente e habitação
local, quem está em habitação local está de férias e não tem
preocupação com o ruído. Isto está a fazer que haja uma
debandada. Ou gente que é expulsa, ou gente que não está para
aturar isto.
Quantos recenseados
tem?
Nós perdemos 10% do
nosso eleitorado. Tínhamos 12 mil eleitores, agora temos 11 mil.
Quando baixar dos dez mil eleitores há consequências muito sérias
quer a nível orçamental na junta quer a nível de organização.
Temos aqui na freguesia uma média diária calculada de 200 mil
pessoas, que sujam, estragam e também reclamam. Mais de 50% do nosso
orçamento é alocado à prestação destes serviços, higiene urbana
e recuperação do espaço público e mesmo assim isto é muito
pesado. Estamos muito preocupados com esta atitude neoliberal que
existe em relação ao alojamento local.
Qual poderia ser o
caminho? Berlim e Barcelona já impuseram limites ao Airbnb, Lisboa
poderia seguir um caminho semelhante?
Medidas imediatas
para já é procurar introduzir um nível de fiscalidade que agrave a
quem coloque este tipo de apartamentos no mercado. Em segundo lugar,
para as tais situações mistas onde há residentes fixos e
alojamento local, só possa haver alojamento local se for aprovado em
assembleia de condóminos. A quota para alojamento local, como tem
Berlim, admito que sim mas não sei como. Depois quem é que tem
direito? É por sorteio? É quem pede primeiro? Temos de refletir
sobre isso. Acho que aquilo que se pratica em Barcelona talvez seja o
mais viável, isto é, tem de haver residentes nos prédios, e os
residentes têm de concordar. Neste momento é preciso travar.
Estamos tão desesperados, qualquer exemplo que vem de fora é bom.
O presidente da
Associação do Alojamento Local está a pensar em formas
alternativas de atuar no mercado. Uma passaria por atrair para
Alfama, porque é um bairro com casas mais pequenas, um alojamento de
média duração para jovens, solteiros, eventualmente estrangeiros
que queiram ali viver, com fiscalidade intermédia. Veria isso com
bons olhos?
Eu não conheço a
proposta concreta e não me vou pronunciar. O que tenho de equacionar
é que Alfama tem de manter as pessoas que lá moram e as pessoas
tradicionais do bairro. Depois, os jovens que eram os filhos deles,
que lá viviam em regime de arrendamento a tempo certo estão agora a
ser dizimados pelas cartas para saírem. Quando fui eleito, um T0 ou
um T1 em Alfama tinha a renda média de 150/170 euros. Agora está a
mil euros. E mesmo assim é difícil conseguir, porque eles fazem
isso numa semana no alojamento local. Eu gosto que Alfama tenha
jovens mas temos de tomar medidas para que os jovens de Alfama tenham
condições para lá ficar.
Fala da questão da
autenticidade e do que os turistas procuram em Lisboa mas tem a Baixa
cheia de hotéis.
Claro, e também há
alojamento local. A única diferença é que o hotel paga os seus
impostos e não se pode pôr um hotel em qualquer sítio. É uma
coisa mais controlada.
Mas continuam a
aparecer hotéis na Baixa.
Sim. Mas o
alojamento local é uma coisa que se espalha como se fosse uma mancha
de óleo e isso é que está a desestabilizar tudo completamente. O
que não posso aceitar é que se vá à habitação buscar para o
alojamento local. E isso é urgente. Depois vamos aos hotéis ver se
há de mais, de há de menos.
Se proliferam os
alojamentos locais é porque há procura.
Claro, a procura vem
do estrangeiro. Cada vez que há um atentado não sei onde vem tudo
para aqui. Mas e as pessoas que cá moram? Vão para os países dos
atentados? Não podemos trocar de população. E nós não temos
competência legal para intervir nesta matéria.
Da parte da câmara
tem tido algum feedback?
É melhor falar com
a câmara sobre isso. Ainda estamos numa fase em que depende com quem
falamos. Mas encontro na câmara as duas visões. A visão de que
isto é muito importante porque recupera o edificado e a visão
atenção, isto é preocupante porque faz perder pessoas.
Sem comentários:
Enviar um comentário