O bullying constitucional
Por Eduardo
Oliveira Silva
publicado em 6
Jun 2014 in
(jornal) i online
O ataque do
governo ao TC servetambém para disfarçar a queda contínuada economia
O comportamento
do governo em relação ao Tribunal Constitucional é uma mistura de bullying e de
uso da panóplia tradicional de expedientes a que recorre quem tem dinheiro e
advogados para evitar cumprir as penas a que é condenado, arrastando casos com
recursos e incidentes processuais eticamente reprováveis.
É preciso lembrar
que o confronto com o Tribunal resultou de um facto simples: a persistência do
governo em legislar de forma inconstitucional, que obrigou o Tribunal a pôr
cobro a uma situação reiterada, coisa que o governo apenas finge aceitar. Ainda
assim, o Tribunal teve o cuidado de fazer com que os efeitos das suas decisões
não recuassem ao princípio deste ano, a fim de não destruir as contas do
Estado. Tal não impediu Passos e Portas de lançarem mão de todo o tipo de
expedientes para criar uma situação turbulenta, iniciando uma crise
político-institucional e pondo inclusivamente em causa a legitimidade dos
juízes. Não faltou sequer o pormenor ridículo de anular uma visita oficial do
chefe do governo ao Brasil.
Tudo isto serve
para ganhar tempo e tentar capitalizar simpatias através da vitimização,
potenciando um ambiente de confusão exactamente num momento em que o próprio
Partido Socialista está enredado em problemas internos, o que necessariamente
diminui a capacidade de intervenção do seu líder.
Tendo em conta os
antecedentes, qualquer cidadão minimamente ilustrado tinha consciência de que o
chumbo do Tribunal era uma alta probabilidade. Por maioria de razão, o governo
sabia-o também, mas a verdade é que em vez de preparar serenamente uma
alternativa optou por aumentar a tensão política.
Evidentemente que
há uma explicação para esse comportamento. O executivo está confrontado com uma
realidade económica altamente negativa, sem crescimento, com uma nova
desaceleração e com todo um conjunto de indicadores a divergirem negativamente
da média europeia. Nesta fase pós-eleitoral também já não é possível manter o
discurso fantasista que se ensaiou durante umas semanas. Ao mesmo tempo, está
confrontado com a impossibilidade de cumprir as metas do Tratado Orçamental que
fez questão de ser o primeiro a assinar, sem o respaldo de uma troika que está
de saída.
Mais: como não
fez qualquer reforma do Estado e não quer mexer nas reservas orçamentais ou nos
15 mil milhões que pediu emprestados para acautelar a entrada directa para os
mercados, o governo tem como única opção um aumento de impostos ou cortes cegos
na despesa. Simplesmente em Portugal a carga total de impostos na classe média
já passa os 60%, pelo que aumentá-la ainda mais pode ter consequências
sinistramente recessivas.
Perante isto, o
mais simples é agudizar a tensão, subindo o tom e aumentando o nível de
conflitualidade política, levando as oposições a fazer o mesmo e tentando
envolver na confusão o Presidente da República.
De um
primeiro-ministro e do seu vice não se
esperam números políticos sucessivos e manobras dilatórias, ao jeito daqueles
ricos que não querem cumprir pena depois de condenados. Espera-se uma liderança
serena e firme, uma linha de rumo, uma política coerente e permanente que faça
sentido e mobilize o país, sabendo dialogar com a sociedade. Deseja-se que
tracem um rumo em que os cidadãos possam confiar, respeitando as leis e
arranjando soluções de crescimento. É isso que na realidade distingue figuras
de referência de políticos banais, gerados em máquinas partidárias, como os que
hoje dirigem o país e certa oposição.
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