"Ambos os lados parecem irredutíveis. E esta reunião, a longo prazo, pode ser uma espécie de Portugal-Gana. Uma vitória que não serve para nada..." |
No PS, como na selecção, por
quatro pontos se ganha, ou perde
PAULO PENA 26/06/2014
- PÚBLICO
O assunto é aquele que todos dizem querer evitar: questões estatutárias. No
entanto, na comissão política nacional desta quinta-feira não se falou de outra
coisa. Seguro não aceitou nenhuma das principais propostas de Costa.
António Costa
chegou vinte minutos atrasado à reunião. Carlos Zorrinho chegou vinte minutos
depois de Costa. Maria de Belém ainda demorou mais: chegou às 22h38. Marcada
para as 21h30, a Comissão Política Nacional do PS foi-se reunindo, a conta
gotas. Na sede do Largo do Rato, em Lisboa, António José Seguro tinha preparada
uma proposta de regulamento das primárias, depois de cerca de "uma
dezena" de propostas de alteração que recebera, nos últimos dias.
A reunião
aconteceu precisamente para isso: aprovar o regulamento que definirá a forma
como se realizarão as primárias de 28 de Setembro próximo, nas quais,
previsivelmente, se defrontarão os dois homens que querem liderar o partido. A
eleição, como se sabe, não cuidará de escolher um líder, apenas um
"candidato a primeiro-ministro". Porém, sabe-se também, se o
escolhido for Costa, Seguro demitir-se-á.
Estas são as
certezas. A reunião desta quinta-feira tratou das dúvidas. Quem vota, como se
vota, até quando se pode declarar a "simpatia" pelo partido que, além
dos militantes com quotas pagas, dará igualmente direito a escolher nas
primárias.
Na SIC Notícias,
Costa foi substituído por José Magalhães, na Quadratura do Círculo. No Rato, o
seu ponta-de-lança foi Carlos César. Foi o ex-presidente do Governo Regional
dos Açores que, à entrada da sede nacional do PS, explicou como pretendia
acabar com esta "fase de grande perturbação da direcção do partido". A
solução está num "consenso" quanto às regras das primárias. Para
Carlos César, a proposta de Seguro (aquela que tinha sido apresentada na
segunda-feira) não oferece "garantias de idoneidade e transparência".
Por isso, os apoiantes de Costa apresentaram várias propostas de alteração. "A
direcção não deu qualquer resposta", queixou-se César.
Os pontos que
Costa considera inaceitáveis são quatro: a data para o fecho dos cadernos
eleitorais (uma semana antes da votação); a possibilidade de os eleitores
votarem sem qualquer documento de identificação; a inexistência de um órgão
fiscalizador autónomo; e a necessidade de escolher a comissão eleitoral por
consenso (dois terços dos membros da Comissão Política).
Para Costa, estes
quatro pontos são essencias para garantir a "democraticidade" do
processo. Porque, alegam os seus apoiantes, os prazos não são suficientes para
atender a eventuais erros de recenseamento e a possibilidade de voto sem
identificação abre o caminho à "fraude".
Foi isto,
sobretudo, que César começou por defender na reunião.
Do lado de
António José Seguro, os apelos ao consenso também se repetiram. O
secretário-geral tem uma justificação para todas estas alíneas que Costa
critica. No caso dos cadernos eleitorais - que fecham no dia 21, a uma semana da votação -
a proposta de Seguro inspirou-se no processo de primárias dos socialistas
italianos. E, por isso, não incluiu nenhuma das propostas "centrais"
de António Costa na sua proposta revista. Isso já era claro, ainda antes de ter
início a comissão política.
Que efeitos isso
terá nos alinhamentos actuais? Para já ainda não é possível antecipar. Mas à
entrada para a reunião, Francisco Assis, um dos mais notórios apoiantes de
Seguro, dizia ser "absolutamente imprescindível" que ambos os
candidatos chegassem a um "consenso sobre as regras das primárias". Esse
"entendimento" que Assis defende não parece possível, a esta luz.
Entre os membros
da comissão política afectos a Costa, este regulamento, tal como está, não não
dá garantias. A convicção de vários dirigentes socialistas contactados pelo
PÚBLICO era a de que os apoiantes de Costa deveriam votar contra a proposta do
secretário-geral, caso esta não atendesse às suas preocupações.
Ambos os lados parecem
irredutíveis. E esta reunião, a longo prazo, pode ser uma espécie de
Portugal-Gana. Uma vitória que não serve para nada...
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