jean-claude juncker
A derrota de Cameron
João Marques de
Almeida
30/6/2014, 5:20 / OBSERVADOR /http://observador.pt/opiniao/derrota-de-cameron
A “derrota” em Bruxelas reforçou a autoridade interna de
Cameron, que pode ter-se transformado no líder britânico com mais hipóteses de
ganhar o referendo sobre a Europa.
A derrota de Cameron no último Conselho Europeu culminou uma
política cheia de equívocos em relação à União Europeia. O desastre começou
quando, ainda antes de ser primeiro-ministro, retirou o seu partido do PPE.
Mostrou, por um lado, fraqueza perante os sectores anti-União Europeia dos
conservadores, a qual apenas serve para alimentar o anti-europeismo dos seus
colegas de partido. Por outro lado, o abandono do maior e mais poderoso grupo
político do Parlamento Europeu reduz a influência de Cameron na política europeia.
Só uma enorme ignorância sobre o modo como funciona a União Europeia impediu o
primeiro-ministro britânico de perceber a importância das reuniões dos líderes
da direita europeia antes dos Conselhos Europeus. Tomam-se muitas decisões
relevantes nesses encontros. Se os Conservadores estivessem ainda no PPE,
Juncker não seria provavelmente presidente da Comissão Europeia. A verdade é
que no que toca à União Europeia, Cameron tem-se comportado mais como um líder
partidário do que como um primeiro-ministro.
O modo como Cameron fez campanha contra Juncker foi
igualmente desastroso. Atacou Juncker em vez de defender a competência do
Conselho Europeu na escolha do presidente da Comissão Europeia. Reduzindo a
discussão ao plano pessoal, perdeu o apoio dos outros líderes europeus. Em
Bruxelas, os ataques pessoais não ajudam a ganhar. Aliás a estratégia britânica
foi de tal modo má que impediu Merkel de ajudar a travar Juncker. Merkel queria
ajudar Cameron e este tornou a ajuda impossível. Com a sua campanha, Cameron
conseguiu a proeza de colocar o Conselho Europeu a apoiar Juncker. Se fosse de
propósito, não teria sido mais eficaz.
No entanto, estamos longe do fim, e Cameron pode ainda ficar
na história como o líder que reforçou a presença do Reino Unido na União Europeia.
Cameron não só impôs o voto no Conselho Europeu que elegeu Juncker como quis
que o vissem perder. Fê-lo por duas razões. Primeiro, porque pretende que os
outros líderes europeus o levem a sério. E já todos perceberam que ou a União
Europeia faz reformas importantes ou o Reino Unido sairá. Aqueles que querem
evitar o abandono de Londres terão mesmo que se empenhar no concretização de
reformas económicas e institucionais. Merkel já percebeu e vai ajudar Cameron.
Simultaneamente, Cameron vai ajudar Merkel a introduzir um conjunto de reformas
que de outro modo seria dificil, senão impossível. Apesar das divergências em
relação a Juncker, Berlim e Londres estão a construir uma aliança para mudar a
União Europeia.
A segunda razão que justifica a vontade de Cameron em tornar
a sua derrota bem visível está relacionada com a política interna britânica.
Para a cultura política britânica, a derrota não é uma vergonha. É melhor
perder do que participar em falsos consensos. Além disso, Cameron reforçou a
sua autoridade para defender os interesses britânicos em Bruxelas. Se durante a
campanha para o referendo, ele disser que o novo acordo entre a União e o Reino
Unido corresponde aos interesses britânicos, a maioria do eleitorado vai
acreditar. A “derrota” em Bruxelas reforçou a autoridade interna de Cameron.
Apesar dos acontecimentos recentes, Cameron pode ter-se transformado no líder
britânico com mais hipóteses de ganhar o referendo sobre a Europa.
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