Em cima, o painel
da Avenida da Índia, e em baixo os das escolas Luísa de Gusmão e da Querubim
Lapa
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Painéis de azulejos de Querubim
Lapa em Lisboa sofrem degradação
Património / Marisa Soares / PÚBLICO / 9-6-2014
Pintor e ceramista lamenta “falta de respeito” pelas obras que tem na
capital, algumas em risco devido à falta de conservação do espaço. Um dos casos
mais preocupantes é o do painel
“Daqui por
dez anos vêm outra vez ter comigo, mas provavelmente nessa altura já cá não
estou”, ironiza Querubim Lapa, que tem 88 anos
O mestre Querubim Lapa, que é o pintor e ceramista com mais obras no espaço
público do país, está preocupado com o estado de degradação a que chegaram
algumas das suas obras mais emblemáticas na capital. Lamentando a “degradação
constante” do património azulejar português, o artista acusa em particular a
Câmara de Lisboa de “falta de respeito pela arte”.
Um dos casos que
mais preocupam o ceramista é o do painel O Terraço, que a câmara lhe encomendou
há 20 anos para decorar um muro na Avenida da Índia, defronte para a estação
ferroviária de Alcântara-Mar. Em 2004, as paredes que rodeavam o muro foram
demolidas a pretexto de um projecto imobiliário que nunca arrancou. Ainda se
pensou transferir o painel para outro local, mas os azulejos estão colados à
parede com cimento. O painel continua lá, mas hoje mal se vê, quase abafado
pela publicidade.
Um parecer
assinado em 2004 por uma técnica de Conservação e Restauro do Ministério da
Cultura, ao qual o PÚBLICO teve acesso, considerava necessário “proceder à
escoragem do tardoz da parede” e “ponderar na protecção do revestimento com a
colocação de palas superiores de maior dimensão e uma melhor iluminação”.
Questionada pelo
PÚBLICO, a autarquia não esclarece se algo foi feito entretanto. Diz apenas,
através do gabinete de comunicação, que o muro “não necessita de qualquer tipo
de intervenção preventiva dado que a sua estrutura se encontra estável”.
Querubim Lapa
acusa a câmara de “falta de respeito pela obra de arte”, ao autorizar a
colocação de cartazes junto ao painel. “O painel mistura-se com toda aquela
publicidade, e tem surgido cheio de graffiti. Eu próprio, quando ainda dava
aulas, fui lá uma vez limpar a tinta com um grupo de alunos. E também falta
iluminação que assinale o painel à noite.”
A obra foi
oferecida por uma farmacêutica à câmara, então dirigida por João Soares, que
depois contactou o ceramista. “O painel foi premiado pela própria câmara [com o
Prémio Jorge Colaço], deviam ter o máximo de cuidado”, critica.
Perante a
impossibilidade de transferir a obra para outro local, a câmara propôs ao
artista que fizesse uma cópia d’O Terraço para reproduzir na parede de um
edifício municipal nas Olaias. “Apresentei uma proposta e o respectivo custo,
mas estou há dez anos à espera”, afirma. “Disseram-me que a proposta se perdeu
na mudança de instalações do gabinete de Cultura. Há quatro meses, a secretária
do presidente António Costa disse-me que finalmente iam tratar do caso”, relata
o ceramista. A uma nova proposta seguiu-se um novo impasse: o projecto no valor
de cerca de 40 mil euros está em stand by, alegadamente por falta de verbas.
“Daqui por dez
anos vêm outra vez ter comigo, mas provavelmente nessa altura já cá não estou”,
ironiza Querubim Lapa, que aos 88 anos é o artista com mais obras no espaço
público do país e continua a trabalhar. A maioria está na capital, como os
azulejos no interior da estação de Metro da Bela Vista ou o painel Sol
Mexicano, na Pastelaria Mexicana, recentemente classificada como monumento de
interesse público.
À lista juntam-se
diversos painéis que decoram fachadas de algumas escolas da capital. Mas na
Escola Básica Mestre Querubim Lapa, em Campolide, e na Secundária D. Luísa de
Gusmão, já há azulejos no chão.
“Eu avisei que
com a infiltração de água da chuva aquilo ia cair, e caiu”, afirma Querubim
Lapa, indignado com a incapacidade da autarquia para evitar o desfecho na
escola primária de Campolide — que adoptou o nome do pintor modernista
precisamente por causa do painel, feito em 2003. Os avisos partiram também da
directora da escola, Maria Jorge Figueiredo: “Há mais de um ano comuniquei à
câmara que a parede rachou, vieram uns peritos avaliar, mas nada foi feito.” Quando
chegou ao estabelecimento a 10 de Fevereiro, depois de um forte temporal,
encontrou no chão metade dos azulejos de um alçado do bloco B.
“Todos os
azulejos caídos, alguns danificados, foram recolhidos pela câmara”, esclarece a
autarquia. O estabelecimento está há vários anos em lista de espera para
receber obras. Segundo o município, estas devem avançar em 2015, durante as
férias escolares. Está prevista a “reparação da empena de suporte do painel e a
colocação duma réplica do painel original, a executar pelo autor”.
“Disseram-nos que
o que ficou não está em risco de cair”, explica ao PÚBLICO o presidente da
Junta de Freguesia de Campolide, André Couto. “O património cultural está a
pagar a factura do adiamento das intervenções nas escolas, que já deviam ter
começado há bastante tempo”, lamenta.
Já na Escola
Secundária D. Luísa de Gusmão, na Penha de França, a situação é semelhante mas
a responsabilidade é do Ministério da Educação (ME). No painel de 30 metros que
cobre a fachada também já faltam azulejos. “Começaram a cair com a infiltração
de águas, há três meses”, diz Querubim Lapa, que mandou o seu azulejador
(especialista em assentar azulejos) avaliar o estado da obra. Este concluiu que
o painel pode cair a qualquer momento e utilizou fita-cola para tentar segurar
os azulejos. “A directora da escola diz que já participou o caso ao ME, mas não
há resposta”, lamenta o ceramista.
O PÚBLICO tentou
contactar a direcção do estabelecimento, sem sucesso. A câmara, que criou em
2012 um Programa de Investigação e Salvaguarda do Azulejo de Lisboa (PISAL)
para defender o património em risco, diz não conhecer este caso.
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