Passos admite “revisão de acordo
técnico” das Lajes
Primeiro-ministro viu-se atacado por todos os lados no debate quinzenal.
TAP, PT, desemprego, impostos. Conseguiu ir apresentando respostas. Excepto
para a falta de médicos nos hospitais
Nuno Sá Lourenço /
17-1-2015 / PÚBLICO
O
primeiro-ministro aproveitou o debate quinzenal de ontem para criticar os EUA a
propósito da redução na Base das Lajes. Comentando a situação, Pedro Passos
Coelho ouvia de Washington “muito verbo e pouca acção” sobre a possibilidade de
aplicação de medidas para mitigar o impacto socioeconómico da redução na Base
das Lajes, nos Açores. O chefe do Governo admitiu mesmo que o anúncio poderá
“suscitar a revisão do acordo técnico” que regula a permanência militar
americana na ilha Terceira.
O acordo técnico
foi um dos documentos oficiais assinados entre os dois Estados em 1995. Nele se
fixaram as regras de utilização da base, os procedimentos a levar a cabo para
as aeronaves em trânsito — quando os EUA teriam de solicitar autorização ou
apenas avisar as autoridades portuguesas —, o pagamento dos custos de operação
e manutenção na base, o número máximo de pessoal americano destacado, militar e
civil (6500) e a concessão de facilidades no porto da Praia da Vitória. Esse
acordo prevê ainda a facilitação de recursos locais aos americanos, isenção de
taxas na importação de equipamentos, abastecimentos e material para uso da
força militar. O acordo permite até isenção do IVA de material e serviços
portugueses. No início deste mês, a Administração Obama confirmou que a
racionalização de efectivos militares na Europa aplicar-se-ia também às Lajes,
com a redução dos actuais 600 para 165 norte-americanos e o corte de
trabalhadores portugueses de 800 para 400.
As declarações de
Passos Coelho surgiram após uma pergunta do líder parlamentar do PSD, Luís
Montenegro, sobre o que se poderia fazer para “evitar as consequências”
económicas da redução. Passos anunciou a criação de uma comissão, a juntar os
governos da República e o regional, “para encontrar medidas que possam atenuar”
esse impacto e “revitalizar a economia da ilha”.
Passos Coelho
defendeu no Parlamento que as consequências iriam ter “um peso muito negativo”
na ilha e Açores e que essa era uma realidade “a que os EUA não podem deixar de
atender”. E acrescentou que o “Governo não aprecia” a forma como a
administração tinha gerido a questão “ao longo dos vários anos”.
O desejo de um
empenho conjunto dos diferentes partidos na defesa da posição portuguesa, manifestado
por Montenegro, não se reflectiu, no entanto, neste debate. O PS criticou a
reacção do Governo ao anúncio feito a 8 de Janeiro, denunciou o “isolamento
atlântico” e o “tratamento vexatório” de que o país fora alvo. O que levou o
primeiro-ministro a criticar o PS por utilizar a questão “como arma de
arremesso político”.
As Lajes foram
apenas um dos muitos temas através dos quais o primeiro-ministro foi metralhado
pela oposição. Na maior parte dos embates, Passos Coelho foi conseguindo
responder aos ataques, à excepção de um tema. Na saúde, o chefe do executivo
revelou maiores dificuldades para contrariar as críticas. Todos os partidos da
oposição lembraram a falta de médicos nos hospitais. Heloísa Apolónia, dos
Verdes, deu o tiro de partida ao afirmar que havia “gente a morrer nas
urgências deste país”, apontando a responsabilidade aos cortes efectuados no
sector.
O chavão da
austeridade regressava. “As consequências das políticas de austeridade estão à
vista. O Governo preferiu cortar nas escalas, reduzir nos vencimentos, recrutar
médicos sem ligação aos hospitais”, insistia Ferro Rodrigues. A única resposta
que Passos conseguiu articular foi repescar o passado. “Pensei que se referia
ao pagamento de dívidas que os senhores deixaram. Conseguimos pagar parte do
passivo e de dívidas e capitalizar alguns hospitais. Apesar das restrições, não
puseram em causa os serviços prestados”.
Ainda assim, nos
restantes temas, Passos foi conseguindo apresentar respostas às críticas. O PCP
acusou o Governo de, com os seus planos para a requalificação, ter criado a
“antecâmara” para despedimentos. Por começar “nos cortes nos salários, numa
autêntica chantagem” a que depois juntava os números distorcidos.
O líder
comunista, Jerónimo de Sousa, acusou o Instituto Emprego e Formação
Profissional (IEFP) de distorcer “as estatísticas”. “Lá se foram os sinais tão
proclamados sobre as estatísticas do desemprego, as quais, desde que torturadas
e retorcidas, dizem sempre aquilo que se pretende”, afirmou, classificando de
“inquietantes as tendências” anunciadas de “despedimentos no sector financeiro,
na Base das Lajes, na TAP”, entre outras.
Passos Coelho já
antes reconhecera preocupação com os números do desemprego. “Houve um aumento
do valor do índice, e isso evidentemente preocupa o Governo”, disse o chefe do
executivo, para depois se manifestar esperançoso de que os mais recentes
valores fossem apenas um contratempo: “Não estou certo de que isto transmita
uma inversão de tendência, mas precisamos de estar atentos”.
PT e Novo Banco
Do BE, o foco foi
para a PT. Catarina Martins desafiou o Governo a tomar uma posição na Portugal
Telecom, insistindo no trunfo do Novo Banco. “Na quinta-feira, há uma nova
assembleia geral de accionistas e é possível, usando Novo Banco, Segurança
Social e pequenos accionistas, ter os 30% para parar a venda da PT à Altice.
Que indicações é que o Governo vai dar aos administradores que vão estar nessa
assembleia geral representando o Estado?”, interrogou a porta-voz do BE.
Sem surpresas,
Passos disse que não levantaria um dedo. Para o social-democrata, o Estado não
era “dono do Novo Banco”. “O Novo Banco foi criado com a resolução do BES, foi
criado pelo Fundo de Resolução, o Fundo de Resolução não dá ordens à
administração do Novo Banco em nome do interesse do Estado para que, na gestão
dos interesses correntes do banco, os administradores votem de uma ou outra
maneira”, vincou. Mas Catarina Martins ainda lembrou que quem estava a “meter
dinheiro” era o Estado e, como tal, a administração tinha de “obedecer” às
indicações desse accionista.
O posicionamento
dos dois partidos do Governo sobre impostos foi também tema no debate. Ferro
Rodrigues abordara o tema, mas uma intervenção do líder parlamentar do CDS
permitiu ao primeiro-ministro sublinhar a “total sintonia dentro do Governo” na
fiscalidade. Que foi usada, sublinhou depois, para “conseguir servir os
objectivos” ambientais e de promoção da natalidade. Através do líder
socialista, o PS ensaiou um discurso em que tentava apresentar o Governo
“isolado” em relação ao resto do país. Não só em relação à política externa — a
propósito das Lajes —, mas também nas reformas na justiça, nas urgências
hospitalares, na requalificação e nas “discriminações positivas” em carreiras
do Ministério das Finanças. “O senhor primeiro-ministro está isolado da
administração pública e começam a sentir-se sinais de que as trapalhadas do seu
Governo podem conduzir a um isolamento face às forças políticas que o
sustentam”, sustentou. Na resposta, Passos Coelho argumentou que o executivo
não trabalhava “com a preocupação de agradar”.
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