Em alta nas
sondagens, oposição irlandesa também exige reestruturação da dívida
Os efeitos da mudança política em Atenas já se fizeram sentir na outra
ponta da zona euro: agora são os irlandeses que se interrogam sobre os
benefícios da austeridade numa altura em que a sua economia voltou a crescer.
Os partidos da oposição, como os nacionalistas de esquerda do Sinn Féin,
vão de vento em popa há meses nas sondagens e as eleições gregas vieram
acentuar essa tendência.
“Este fardo de dívida insuportável que foi imposto ao nosso país é a
principal causa da nossa miséria económica”, argumenta Gerry Adams, que já
falou ao telefone com o novo primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras. “Não se
trata apenas de um problema irlandês, mas sim de um problema europeu que
necessita de uma solução europeia”, disse o líder do Sinn Féin, que reclama uma
conferência europeia sobre a dívida, tal como os novos lideres políticos
gregos.
A situação da Irlanda, que saiu do plano de resgate acordado pelos seus
parceiros europeus e o Fundo Monetário Internacional, é bastante mais invejável
do que a da Grécia. O país espera para este ano 3,9% de crescimento económico,
depois dos 4,7% alcançados em 2014, o desemprego recuou e, ao fim de sete anos
de rigor orçamental, o país saiu oficialmente da austeridade em Outubro do ano
passado.
Mas a Irlanda ainda tem de pagar as suas dívidas, e o Sinn Féin reclama
agora uma renegociação, nomeadamente sobre os 64 mil milhões de euros que foram
injectados no sistema bancário para evitar o seu colapso depois da crise
financeira de 2008.
O Governo irlandês sublinha que já reestruturou a sua dívida por quatro
vezes e sem drama. Esta semana, o FMI voltou a elogiar o “bom arranque” da
retoma económica, ao mesmo tempo que encorajou o executivo de Enda Kenny (Fine
Gael, centro-direita) a atacar a dívida com mais vigor.
Mas os progressos económicos e orçamentais do país não impediram a queda da
popularidade dos partidos de governo para níveis historicamente baixos,
especialmente depois da introdução de um polémico imposto sobre a água da
torneira no início do ano, uma decisão que levou dezenas de milhares de pessoas
a protestarem na rua.
Os observadores interrogamse se, tal como aconteceu na Grécia, a maré
também não vai mudar na Irlanda, depois de décadas de domínio dos dois partidos
de centro-direita, Fine Gael e Fianna Fáil. “Temos o potencial para uma
reviravolta eleitoral semelhante aqui na Irlanda, mas também em Portugal e em
Espanha”, diz Nat O’Connor, do think thank de esquerda Tasc. As eleições
irlandesas estão previstas para 2016.
“Se os gregos obtiverem melhores condições graças ao Governo que elegeram,
então os irlandeses vão seguir-lhes o exemplo, convencidos de que esta é a
verdadeira solução para os seus problemas”, vaticina o analista político Johnny
Fallon.
Mas outros sublinham que a situação da Irlanda é muito diferente e bem mais
favorável do que a da Grécia, com a diminuição do desemprego e a perspectiva de
um aumento das receitas. A sua economia é flexível, foi reformada em
profundidade e exporta para o resto do mundo, sublinha Austin Hughes,
economista do banco KBC.
“O desafio que o Governo enfrenta é o de dar confiança às pessoas,
convencendoas de que estão no bom caminho, sem, no entanto, gerar expectativas
irrealistas em relação ao que se pode razoavelmente esperar do desempenho da
economia”, conclui Hughes.
in PÚBLICO / 31-1-2015.
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