OPINIÃO
Draghi ou Tsipras podem tirar-nos
da situação em que estamos?
PAULO TRIGO PEREIRA
26/01/2015 – PÚBLICO
Nem Draghi nem
Tsipras nos resolverão os problemas, mas dão alguma ajuda. Imaginemos que, por
algum processo engenhoso, conseguíssemos reduzir, sem efeitos colaterais
significativos, o rácio da dívida no produto de cerca de 130% para 90%.
Ignoremos mesmo que existe um Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) e um
Tratado Orçamental, ou seja, assumamos que não há restrições políticas
europeias. Teríamos o nosso problema das finanças públicas resolvido?
Não, pois este
tem a ver com a dinâmica da dívida (que advém do défice primário, dos juros e
do crescimento económico) e não do valor absoluto. A sustentabilidade das finanças públicas não
adviria assim de uma redução do stock da dívida de 40 pontos. Se a tendência de
crescimento do seu peso no produto se mantivesse crescente ela seria
insustentável. Dado que uma política orçamental contraccionista, como temos
tido (de subida de impostos e/ou redução de despesa), tem um efeito quer no
numerador (dívida) quer no denominador (PIB), a dificuldade está em calibrar o
ritmo e a composição da consolidação orçamental para assegurar um adequado
decréscimo do peso da dívida, mantendo de forma adequada as funções que o
Estado deve desempenhar numa economia mista que se quer competitiva, mas
solidária.
Nos últimos anos
por razões substantivas (défices excessivos mesmo com perímetro orçamental
constante) e contabilísticas (alargamento do perímetro orçamental), o rácio da
dívida no produto tem vindo sempre a aumentar. Atingiu-se o ponto máximo? Não
há certezas neste momento, pois não se conhece o défice orçamental de 2014 e as
outras necessidades líquidas de financiamento das administrações públicas (por
exemplo para recapitalização de empresas públicas). A minha intuição é que
atingiremos o ponto de viragem em 2014 com a dívida a crescer ainda
ligeiramente mais que o PIB nominal.
Cingindo-me à
análise contabilística, o défice orçamental rondaria os 3,6% do PIB sem contar
com o contributo para o défice das
empresas adicionais que passarão a integrar o perímetro orçamental em 2014.
Dessas, as que terão um impacto mais significativo no défice serão todos os
hospitais EPE (que tinham um resultado líquido de -189 milhões, ou 0,11% do
PIB, em Agosto) e a CP. Sem outros efeitos significativos do novo sistema de
contas (SEC2010) e sem a contribuição para o Fundo de Resolução da banca, o
défice de 2014, em contas nacionais, poderá rondar os 4% do PIB, um progresso
relativamente a 2013. Há, porém, alguns dados a partir dos quais se podem tirar
conclusões.
Os impostos sobem
mais 926 milhões do que era previsto no orçamento rectificativo de Maio 2014
(mesmo retirando o IRS que é transferido para os municípios). O principal
responsável por esta sub-orçamentação de receitas é o IVA e, a seguir, o IRS. É curioso registar que a receita do Imposto
sobre Produtos Petrolíferos diminuiu ligeiramente, reflectindo um aumento do
consumo de combustíveis, mas também a queda do preço do petróleo, que terá
neutralizado esse efeito. Dado manter-se esta queda em 2015, não se percebe bem
como aumentará a receita deste imposto em 2015 na ordem dos 10,4%. Aliás, à
excepção do IRS, em que o OE2015 prevê um crescimento da colecta a acompanhar o
crescimento nominal do PIB, em todos os restantes principais impostos o Governo
prevê que a colecta aumente consideravelmente mais que o produto.
As contribuições
sociais também dão um contributo favorável superior ao previsto na redução do
défice de 2014, quer para a Caixa Geral de Aposentações (onde se verificou
um aumento da taxa contributiva do
Estado) quer para a Segurança Social.
Do lado da
despesa, houve uma execução abaixo da prevista em todas as prestações da
segurança social à excepção das pensões. O principal contributo para a redução
do défice foi a redução do subsídio de desemprego, que só de Maio ao final do
ano gerou um desvio positivo de 608 milhões. De salientar também a acção
social, onde houve uma execução menor de 242 milhões. Em sentido oposto,
contribuindo para agravar o défice, estão sobretudo o acréscimo de despesas com
pessoal (Estado e Fundos e Serviços Autónomos), em que a sub-orçamentação da
despesa (rectificativo de Maio) é da ordem dos 1143 milhões. Parte deste desvio
deve-se ao Acordão do Tribunal Constitucional que obrigou a uma reposição
salarial na função pública, com efeitos de Junho a Agosto, e que levou ao
pagamento do subsídio de férias.
PS: Voei ontem,
talvez pela última vez, na TAP pública, que é algo que me entristece, porque
evitável. Os dois principais responsáveis são, de um lado, o Governo, que
sempre optou pela privatização e, do outro, a grande maioria dos inúmeros
sindicatos, que não quiserem perceber que parte da solução passaria por eles.
Mais um exemplo do “dilema do prisioneiro”, em que a solução cooperativa para o
“jogo”, que seria melhor para todos, não foi alcançada.
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