O caso Bárbara/ Carrilho e o i
Por Luís Rosa
publicado em 21
Jan 2015 in
(jornal) i online
Prometi-lhe em
Setembro, caro leitor, manter um diálogo constante consigo através deste
espaço. Explicando-lhe os nossos objectivos editoriais, opinando sobre os
grandes temas que o i acompanha e divulgando os resultados do nosso trabalho. Acredito
em jornais abertos que dialogam com os leitores de forma transparente, tal como
acredito que a comunicação social só faz sentido quando percebe as grandes
preocupações dos consumidores que quer atingir e fornece a informação de que os
leitores, ouvintes ou telespectadores necessitam.
Não acredito, tal
com o meu colega Luís Osório, em jornais complexados que não abordam assuntos
que estão vedados, em nome de uma certa ideia aristocrática do jornalismo, à
imprensa de referência. A violência doméstica é um desses temas. Por ser um
crime de intimidade, um crime que acontece entre quatro paredes e na esfera
privada e familiar, durante muitos anos apenas foi noticiado em jornais
populares. A explosão da internet e das redes sociais obrigou a comunicação
social generalista a acompanhar esse tema, bem como outros assuntos tabu. Por
uma razão: a comunidade que os jornais devem servir quer combater esse flagelo
social.
E flagelo social
é uma classificação benevolente. 398 mulheres morreram nos últimos dez anos na
sequência de violência doméstica. Em média, três mulheres são mortas por mês às
mãos dos companheiros. Nos últimos dois anos 107 crianças ficaram órfãs de mãe
devido a violência doméstica. 24 mulheres foram mortas no primeiro semestre
deste ano e outras 27 foram vítimas de tentativa de homicídio, tendo a maioria
sido assassinada por maridos, companheiros ou namorados. Segundo estatísticas
europeias, a violência doméstica mata mais mulheres que os acidentes de viação,
as guerras e o cancro em conjunto.
Todos estes
números e factos revelam a gravidade social da violência doméstica em Portugal
e na Europa - e todos foram noticiados com o devido destaque pelo i após um
diálogo constante com instituições públicas ou associações da sociedade civil
que estudam o fenómeno. Tal como demos destaque de primeira página a 25 de
Novembro de 2014, no Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as
Mulheres, à entrevista da Andreia e à coragem que revelou ao publicar um livro
em que fala em pormenor dos 16 anos de violência doméstica a que foi sujeita
com a sua mãe por parte do seu pai. Antes tínhamos recordado o caso da Joana,
um dia depois de esta adolescente ter visto o pai esfaquear mortalmente a mãe e
a irmã, atacá-la no peito com uma faca e mutilar-se a ele próprio antes de a
GNR entrar no apartamento da família em Soure.
Vem este pequeno
resumo a propósito do caso Bárbara/Carrilho, o mais mediático de violência
doméstica há mais de um ano. Muito por culpa dos processos judiciais, que por
natureza são públicos, que intentaram um contra o outro, e também pelas declarações
públicas de Manuel Maria Carrilho. O i tem a obrigação de noticiar este caso,
com a mesma seriedade, respeito pelas regras deontológicas do jornalismo e
destaque com que tem noticiado casos semelhantes de pessoas anónimas para o
grande público. Por envolver duas figuras públicas, uma conhecida apresentadora
de televisão e um reconhecido intelectual e ex-ministro da Cultura, a obrigação
de informar é mesmo acrescida. Porque a violência de género não é um exclusivo
das classes sociais mais desfavorecidas ou de zonas geográficas recônditas. Pode
acontecer entre os mais ricos, famosos e cultos. Essa constatação tem um valor
jornalístico claro por reforçar uma realidade incontestável: a violência
doméstica é de facto um flagelo social. É obrigação do
i ajudar nesse combate.
Sem comentários:
Enviar um comentário