Director do JN ouvido numa
audiência na PGR sobre contactos com Sócrates
PEDRO SALES DIAS
19/01/2015 – PÚBLICO.
Afonso Camões recusou dizer na PGR como soube que Sócrates estava a ser
investigado. Em editorial publicado esta segunda-feira, o director do JN,
apanhado nas escutas a avisar Sócrates, assume que soube através de um
jornalista.
O director do
Jornal de Notícias (JN), Afonso Camões, reuniu-se com a procuradora-geral da
República, Joana Marques Vidal, na semana passada a propósito de informações
que terá obtido sobre o processo em que o ex-primeiro-ministro, José Sócrates
foi detido.
O encontro, a 15
de Janeiro, ocorreu na Procuradoria-Geral da República (PGR) que o confirmou
esta segunda-feira em comunicado. “Afonso Camões solicitou a audiência a 8 de
Janeiro e fundamentou o pedido no conhecimento de determinados factos relativos
à denominada Operação Marquês, os quais gostaria que a procuradora-geral
avaliasse”, disse a PGR.
Em Maio do ano
passado, Afonso Camões terá contactado por telefone Sócrates dando lhe conta de
ter sabido que este estava a ser investigado. O contacto terá sido apanhado em
escutas telefónicas ao ex-primeiro-ministro, adiantou fonte judicial ao
PÚBLICO. Sócrates foi detido em Novembro.
Em Maio, Camões
era presidente do Conselho de Administração da Agência Lusa e não tinha
carteira profissional de jornalista, confirmou ao PÚBLICO o próprio. A notícia
de que iria deixar a Lusa e passar a ser director do JN foi conhecida apenas em
Setembro.
Camões quis
reunir-se com Marques Vidal por receio de que seriam publicadas notícias
“relativas às suas ligações pessoais com José Sócrates, tendo por base escutas
realizadas no âmbito da Operação Marquês”.
E assim foi. Durante
o fim-de-semana, o Correio da Manhã noticiou que Camões alertou Sócrates sobre
a investigação e que este terá conversado com o actual presidente do Conselho
de Administração da Controlinveste, o advogado Daniel Proença de Carvalho,
sobre a venda do DN e do JN, mostrando-se disponível até para ajudar a arranjar
financiamento.
Fonte judicial
confirmou que esses contactos constam das escutas telefónicas. O PÚBLICO
tentou, sem sucesso, contactar o advogado Daniel Proença de Carvalho, que
representa Sócrates em vários processos contra a comunicação social.
Numa entrevista à
SIC na noite desta segunda-feira João Araújo advogado de José Sócrates, afirmou
supor que Afonso Camões tenha avisado José Sócrates de que estaria ser
investigado.
Questionado sobre
se falou sobre o assunto com o ex-primeiro-ministro, Araújo disse que sim mas
recusou revelar o teor da conversa por “razões profissionais”.
Num editorial
publicado esta segunda-feira no JN, Camões critica a publicação dessas notícias
e o Estado por deixar que “se violem sistematicamente o segredo da Justiça e o
direito de reserva da vida privada”. Diz ainda que esses artigos pretendem
atingir o seu nome e o JN.
Porém, Camões
recusou dizer na PGR o que disse depois no editorial. “É verdade: disse-me um jornalista
do grupo empresarial da Coisa [uma alusão ao grupo onde se insere o Correio da
Manhã] que a prisão de Sócrates estava iminente. Esse mensageiro cometeu um
erro: quando se tem uma informação relevante, o primeiro dever de cidadão de um
jornalista livre, pesados os seus direitos e responsabilidades, é para com os
seus leitores”, escreve Camões no artigo.
Em comunicado, a
PGR faz questão de informar que na audiência, onde estava também o director do
Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Amadeu Guerra, o director
do JN “optou por nada dizer” sobre a forma como soube que Sócrates estava a ser
investigado.
A PGR não
esclareceu se abriu inquérito a essa fuga de informação num processo que está
em segredo de justiça. Reafirmou apenas que “neste, como em todos os outros
casos, não deixa de exercer todas as competências que lhe são atribuídas”.
No editorial,
Camões diz que falou com Joana Marques Vidal sobre a “necessidade” de, como
“guardiã dos direitos dos cidadãos, actuar para impedir esta violência e a
continuação destes crimes”, referindo-se à publicação de notícias sobre as
escutas em que foi apanhado a conversar com Sócrates.
Mas a PGR tem
outra versão. Diz que Camões pretendeu ser aconselhado e que a PGR “não lhe
pode dar conselhos nem pessoais nem jurídicos” e sugeriu que procurasse um
advogado. A PGR garante ainda “desconhecer totalmente se o nome do director do
JN constava das escutas telefónicas”.
Procuradora-geral da República
aconselhou diretor do JN a arranjar advogado
Joana Marques
Vidal, em comunicado enviado esta segunda-feira às redações, garante que não
sabe se há escutas comprometedoras para o diretor do "Jornal de
Notícias" no processo que envolve José Sócrates.
Rui Gustavo |
EXPRESSO
16:21 Segunda
feira, 19 de janeiro de 2015
Procuradora-geral
da República aconselhou diretor do JN a arranjar advogado
A Procuradora-geral
da República (PGR) sentiu necessidade de esclarecer o encontro que teve com o
diretor do Jornal de Notícias, acusado pelo "Correio de Manhã" de ter
avisado José Sócrates de que iria ser preso.
Joana Marques
Vidal admite que recebeu Afonso Camões "a pedido" do próprio, que
teria "conhecimento de factos relativos à Operação Marquês".
A PGR revela que
o diretor do JN lhe disse que temia que saíssem nos jornais notícias relativas
à relação que tinha com José Sócrates, "tendo por base escutas" da
operação Marquês. E pediu que Joana Marques Vidal o aconselhasse sobre o que
fazer.
Num comunicado
enviado esta segunda-feira às redações, a PGR diz que aconselhou Afonso Camões
a consultar um advogado e diz não saber se o diretor do JN está ou não nas
escutas do processo que levou José Sócrates à prisão.
Joana Marques
Vidal conta que Amadeu Guerra, diretor do DCIAP, também participou no encontro
e que os dois perguntaram ao jornalista se sabia de onde vinha as informações
sobre a prisão iminente do ex-primeiro-ministro. Afonso Camões optou "por
nada dizer", mas no editorial desta segunda-feira do JN revela que um
colega do jornalista que lhe revelou em junho a história da prisão de Sócrates
lhe contou que a informação vinha "da investigação liderada por Rosário
Teixeira e Carlos Alexandre".
O Expresso pediu
à PGR esclarecimentos sobre este facto novo, mas ainda não teve qualquer
resposta.
Opinião
Estado não cumpre e assobia para
o lado
19.01.2015AFONSO
CAMÕES / JN
O Estado
português deixa que se violem sistematicamente o segredo de justiça e o direito
de reserva da vida privada, e assobia para o lado. Posso testemunhá-lo. Disse
isso mesmo à Senhora Procuradora-Geral da República, de quem se espera que seja
a guardiã dos direitos de cidadania. E que faça o que lhe
compete.Explico-me.Primeiro, o romance de cordel.Desconheço a dimensão da
matilha, mas sei que, ainda que pouco inteligente, obedece ao dono que a mandou
ir "chatear o camões". Só percebeu a terminação, mas veio.
Literalmente.Razões sanitárias inibem-me de dizer o nome da Coisa publicada que
nas últimas horas, e provavelmente nas próximas, mente com todas as letras,
procurando atingir o meu nome, Afonso Camões, e, por esta via, tentar minar os
laços de confiança e de credibilidade na relação com os leitores que fazem do
Jornal de Notícias um grande jornal nacional, sustentável, vencedor e orgulhoso
da sua pronúncia do Norte.A Coisa publicada - que lidera em Portugal o triste
campeonato das condenações e dos crimes por difamação, abuso de liberdade de
imprensa, de violação do direito de reserva da vida privada e outras
malfeitorias escritas que tais - mente e manipula, sabe que o está a fazer, mas
vai ter que responder por isso, mais uma vez. Associa-nos a um fantasioso plano
conspirativo para a tomada do poder na comunicação social, a mando do antigo
primeiro-ministro José Sócrates. Esse mesmo, aperreado há 59 dias sem culpa
formada, detido preventivamente por suspeitas de corrupção, branqueamento de
capitais e fraude fiscal.A "novidade" que trazem, de mau
"jornalismo", é velha de mais de 40 anos, tantos quantos os da
relação de amizade que mantenho, com gosto e desde a minha juventude, com
Sócrates.E dizem que o avisei que ia ser detido. E que terá sido em maio,
quando eu integrava a comitiva do presidente da República à China e a Macau. Ora,
se o avisei, e se foi em maio, eu era administrador e presidente da Agência
Lusa. Logo, não estava jornalista, muito menos diretor do nosso Jornal de Notícias.
E, pelos vistos, nem sequer havia processo.É verdade: disse-me um jornalista do
grupo empresarial da Coisa que a prisão de Sócrates estava iminente. Esse
mensageiro cometeu um erro: quando se tem uma informação relevante, o primeiro
dever de cidadão de um jornalista livre, pesados os seus direitos e
responsabilidades, é para com os seus leitores.Ele deveria ter publicado a
informação, que lhe veio, disse-me depois, por um seu camarada, diretamente da
investigação, liderada pelo juiz Carlos Alexandre e pelo procurador Rosário
Teixeira. Erro maior, criminoso, é ser verdade essa possibilidade: que a fuga
de informação veio dos agentes da justiça, ou seja, de onde menos podemos
admitir que se cometam crimes de violação do segredo de justiça.Sim, eles falam
com jornalistas!Durante meses, o caso parecia ter ficado por ali.Mas basta uma
pequena ponta de verdade para sobre ela fazer cair a sombra de uma grande
mentira. Depois da detenção de José Sócrates, a 21 de novembro, mas comentada
há meses nos meios políticos e jornalísticos, começou a circular nos corredores
da intriga que eu teria avisado o antigo primeiro-ministro da sua iminente
detenção. Mas, agora, já como diretor do JN, o que configuraria uma grave
violação do Código Deontológico. A mentira chegou, plantada, a vários jornais,
mas teve sempre perna curta.O ataque à minha reputação, mas sobretudo à
independência e à credibilidade do nosso Jornal de Notícias, levaram-me a pedir
uma audiência à Senhora Procuradora-Geral da República. Joana Marques Vidal
recebeu-me quinta-feira à tarde, dia 15, na presença do meu diretor-executivo e
do diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, Amadeu Guerra,
que tutela a investigação ao caso Sócrates, liderada pelo procurador Rosário
Teixeira e pelo juiz Carlos Alexandre.Narrei à procuradora parte dos factos
aqui descritos. Mostrei-lhe séria preocupação pela intentona em curso, lesiva e
violadora dos meus direitos, liberdades e garantias, e, sobretudo, o gravíssimo
atentado à credibilidade deste JN centenário, que atravessou regimes e
revoluções, mas que não é nem nunca poderá ser utilizado como instrumento de
uma qualquer guerra empresarial, na disputa pelo controlo dos média
portugueses.Falei a Joana Marques Vidal das escutas de que estaria a ser alvo,
da violação do segredo de justiça, da tentativa de condicionamento da minha
liberdade enquanto diretor de jornal e jornalista, e da necessidade de a
procuradora-geral, como guardiã dos direitos dos cidadãos, atuar para impedir
esta violência e a continuação destes crimes. Disse-nos nada poder fazer e,
candidamente, aconselhou-nos a consultar um advogado...Diz a Coisa publicada
que foi Sócrates que me fez diretor do Jornal de Notícias.Sou honrosamente
diretor deste grande jornal, com o voto unânime do seu Conselho de Redação,
depois de ter aceitado o convite dos meus administradores, com o apoio do
Conselho de Administração deste grupo empresarial. É perante eles que respondo.
E é aos nossos leitores que dou a cara, cada dia.Aqueles que se cruzaram comigo
ao longo de 35 anos de carreira, que me orgulha a mim, aos meus filhos e
amigos, sabem a massa de que sou feito.Trabalhei com zelo e lealdade sob
Freitas Cruz, Feytor Pinto, Marcelo Rebelo de Sousa, José Miguel Júdice,
Francisco Balsemão, Cunha Rego, Vasco Rocha Vieira. Nos últimos anos, enquanto
administrador da Lusa, trabalhei sob sete ministros, ao longo de três governos
de diferentes famílias.Não sou de deixar ninguém para trás. E guardo em casa,
entre outras honrarias, a medalha de mérito da minha terra e a Medalha de
Mérito Profissional que me foi atribuída em nome do Estado português.Mas
voltemos à audiência na Procuradoria-Geral da República. O diretor do DCIAP,
Amadeu Guerra, considera que "não há política neste caso" e, sem que
eu o tivesse questionado, sublinhou a confiança dos seus "homens no
terreno" (estou a citá-lo), negando, primeiro, ter ouvido as escutas, mas,
depois, confirmando ter ouvido mas não tudo.No dia seguinte, a 16, a Coisa publicada bradava
o primeiro folhetim da fantasia conspirativa, pretendendo atingir o presidente
do Conselho de Administração da Global Media, Daniel Proença de Carvalho, e os
seus administradores.Quem é essa gente, que atira a pedra escondendo a mão?!Há
mais de 400 anos, Filipe II de Castela, aquele que residiu em Lisboa,
topou-lhes o caráter nos avoengos, em carta enviada à mãe para Madrid: gente
rasteirinha, daqueles que "sofrem mais com a ventura alheia do que com a
dor própria". Dói-lhes de inveja que sejamos sãos, a crescer e melhores do
que eles. E estão outra vez enganados: aqui, na casa, cumprem-se regras
herdadas de gerações de grandes jornalistas, ao longo de 127 anos, e gostamos
de roçar a nossa na língua portuguesa. Mas antes mortos do que na imundície em
que esgravatam.Mais luz sobre este lance põe a descoberto, também, o mais sujo
e antigo dos truques das guerras comerciais que todos conhecemos: atirar lama
sobre os produtos e as empresas da concorrência, para ganhar vantagem no
mercado. É nessas práticas que se revelam os carateres.Não disputaremos tal
terreno.A liberdade de imprensa não pode ser utilizada em nome do lucro ou de
agendas empresariais. Nada é mais importante do que a liberdade. E são ignóbeis
quaisquer tentativas de submeter a liberdade a agendas pessoais - sejam elas
privadas, ou mesmo públicas.Não podemos permitir que, a coberto de um caso
mediático, empresas nossas concorrentes utilizem a mentira para tentarem ganhar
vantagem.A meses de duas eleições que convocam os portugueses para importantes
escolhas, a quem aproveita a tentativa de condicionamento do JN?Este jornal tem
critérios e depende exclusivamente deles. São os da ética e do rigor
profissional. Não tem ambições políticas e é indiferente a quem as tiver. Não
deve obediências a partidos, autarquias, clubes, empresas ou qualquer
sacristia. Mas não é nem será neutral na defesa das grandes causas, pela
liberdade e dignidade do homem como medida de todas as coisas.Contra o
centralismo, a miséria, a ignorância, a inveja e a tirania, não gostamos do
jornalismo mole, narcótico ou redondinho. Ao contrário, apreciamos e
procuraremos acolher e cultivar a prosa culta, comprometida, por vezes
revoltada - e sempre, sempre inconformada. Um jornal são milhões de palavras. E
quem as escreve escreve-se a si também, no seu registo histórico.O JN é um
exercício de memória contra o esquecimento. Na batalha contra as desigualdades
e na afirmação da solidariedade inclusiva, em primeiro lugar na relação de
vizinhança, aí esteve e aí estará sempre o Jornal de Notícias.Como eu
compreendo o Papa Francisco quando, há poucos dias, disse que se alguém lhe
ofendesse a mãe "deveria estar preparado para levar um soco". Por
mim, hesito em ir às fuças cobardes de quem me quer ofender, porque resisto à
ideia de meter as mãos na enxovia.Até lá, o Senhor lhes perdoe, que eu não
posso.
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