Restaurante La Gondola fecha para ser demolido e dar espaço
a sede de banco
POR O CORVO • 27 JULHO, 2017 •
Ao fim de mais de sete décadas na lista de espera para ser
demolido, o edifício onde, desde 1943, funciona o restaurante La Gondola, na
Avenida de Berna, fechará portas para fazer cumprir um destino. O dia 6 de
agosto será a última oportunidade para ali se poder desfrutar de uma refeição,
anunciaram recentemente os donos do estabelecimento. Apesar de a notícia ter
apanhado muita gente de surpresa – a ponto de ter sido desencadeada uma onda de
solidariedade e de apreço pelo restaurante que inclui uma petição contra o
anunciado desfecho – trata-se da confirmação de um cenário previsível.
Sobretudo desde que, em dezembro de 2014, foi aprovada em reunião de câmara uma
operação urbanística de permuta de terrenos entre o município e o Montepio
Geral. A instituição de crédito e a sua seguradora, a Lusitânia, verão
construídas as suas novas sedes na Praça de Espanha, num terreno que inclui a
parcela onde o restaurante se localiza.
Na petição que foi lançada, esta semana, pelo grupo cívico
Vizinhos das Avenidas Novas, intitulada “Contra a Demolição do Edifício
Restaurante Gôndola e Salvar a identidade das Avenidas Novas”, lembra-se a
história do edifício desenhado e erguido, em 1928, por Júlio Salustiano
Rodrigues e de como, apenas nove anos depois, em 1939, se começou a equacionar
a sua demolição. A compra daquela parcela de terreno, na altura, pela Câmara
Municipal de Lisboa, surgia como alternativa a uma expropriação com intuito de
pôr em prática um plano de urbanismo desenhado para a área. O que nunca chegou
a acontecer, pelo que o imóvel acabou por se manter na posse da autarquia,
albergando o restaurante La Gondola a partir de 1943. Desde então, assistiu à
demolição das muitas moradias que existiam na zona e a sua substituição por
edifícios de arquitectura moderna.
“Neste contexto de
substituição acelerada de edifícios que foi a realidade das Avenidas Novas,
sobretudo a partir da segunda metade do século XX, a demolição de um edifício
como o do restaurante La Gondola não seria controversa. Hoje, no entanto, a
situação é muito diferente”, diz o texto de suporte da petição, pondo em causa
a ideia de um futuro de “construção nova em grande escala”. Além disso, o
estabelecimento que agora parece ter os dias contados, alegam os autores da
iniciativa, “constitui uma Loja com reconhecidas tradições, memória histórica e
longevidade, que configura um candidato concreto e assertivo ao ‘Programa Lojas
com História’”, ao qual propõe a sua candidatura. Os promotores da petição
alegam ainda que a programada demolição entrará em conflito com o Regulamento
do Plano Director Municipal (PDM), que, dizem, só permitirá a demolição de
edifícios em situações excepcionais.
“São já muitos os
edifícios de arquitectura tradicional e de valor histórico, cuja demolição e
posterior substituição se vê aprovada, sem que sejam compreensíveis os
critérios. Disso são exemplo os muitos edifícios de arquitectura tradicional,
bem conservados e enquadrados, cuja demolição ocorreu ou se prevê em Lisboa,
como é este caso”, argumenta-se, antes de se pedir que a demolição e a
alteração não seja autorizada até que se proceda à avaliação da sua
classificação como Imóvel de Interesse Municipal bem como da sua candidatura ao
“Programa Lojas com História”. Alegando estar em causa a “perda da identidade
de Lisboa”, os autores da petição afirmam que “aquilo que poderia ser
considerado como um edifício dispensável, de qualidade inferior a outros
desaparecidos ou em vias de desaparecer, tem hoje um valor adicional de memória
urbana”.
A construção das
novas sedes do Montepio Geral e da Lusitânia acontecerá numa parcela de
terreno, situada entre a Praça de Espanha, a Avenida de Berna e a Avenida
Santos Dumont, com a área de 6.232,72 metros quadrados e uma capacidade
construtiva de 31.800 metros quadrados de superfície de pavimento. Terreno que
ambas as instituições receberam do município, em troca de lhe cederem a parcela
onde, até setembro de 2015, funcionou o antigo Mercado da Praça de Espanha. O
mesmo terreno deverá ser alvo de uma operação de construção que, segundo a
Unidade de Execução da Praça de Espanha, aprovada em maio de 2016, prevê a
implantação de um edifício com uma altura máxima de 145 metros. Toda a aquela
área deverá ser redesenhada para a criação de “um parque urbano de escala
citadina”. A CML prevê que a zona compreendida entre a Praça de Espanha, Sete
Rios e Entrecampos venha a ser o novo centro de escritórios da capital.
O Corvo tentou falar
com a gerente do restaurante La Gondola, mas tal não foi possível até ao momento
da publicação deste artigo.
Texto: Samuel Alemão
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