Ministro de estado indiano diz que violação “às vezes
é certo, outras vezes é errado”
Maria João Guimarães
06/06/2014 - PÚBLICO
Responsáveis indianos já
tinham desvalorizado crime contra duas adolescentes violadas e mortas na semana
passada.
Um ministro de um estado indiano fez comentários
controversos sobre a violação, numa altura em que a Índia acabou de ver mais um
crime chocante, com duas adolescentes violadas por um grupo de homens, mortas e
deixadas enforcadas numa árvore.
“Este é um crime social que depende de homens e mulheres. Às
vezes é certo, outras vezes é errado”, disse Babulal Gaur, ministro do Interior
do estado indiano do Madhya Pradesh (centro), e do partido BJP, do recém-eleito
primeiro-ministro Narendra Modi. A violação só pode ser considerado crime,
acrescentou, citado pela agência Reuters, se for feita queixa à polícia.
Os líderes do estado do Uttar Pradesh (norte), onde ocorreu
o crime, foram criticados por não terem visitado o local. O primeiro-ministro
Modi não comentou o caso.
Gaur teve ainda palavras simpáticas para Mulayam Singh
Yadav, chefe do partido Samajwadi que lidera o Uttar Pradesh, onde foi cometido
o crime. Este criticou recentemente as alterações à lei, feitas após a violação
e espancamento até à morte de uma estudante de medicina num autocarro em Nova
Deli que prevêem pena de morte para violação em grupo. “Há rapazes que vão
cometer erros: vão ser enforcados por violação?”
E no caso do crime no seu estado, ao ser questionado por
jornalistas, Yadav teve uma atitude trocista: “Não estão seguros? Vocês não
estão em perigo, pois não? Então porque estão preocupados?”
O pai e o tio de uma das vítimas disseram que tentaram fazer
queixa à polícia e não conseguiram. Os habitantes da aldeia recusaram deixar
que os corpos fossem retirados da árvore enquanto não houvesse uma
investigação. Acabaram por ser detidos três homens pelo crime e dois polícias
acusados de o tentar encobrir.
A cada 21 minutos é feita uma queixa de violação na Índia.
Mas a maioria dos crimes nem chega a ser reportada. E os que são, dizem grupos
de defesa de direitos humanos, não chegam por vezes a ser investigados. Quem
faz queixa arrisca retaliações: a mãe de uma rapariga violada foi recentemente
agredida por cinco familiares do violador, e estava num hospital em estado
crítico, com fracturas múltiplas e ferimentos internos, depois de se ter
recusado a retirar a queixa.
Na Índia, ao sistema de castas em que algumas pessoas são
vistas como inferiores e propriedade de outras, junta-se aos maus tratos
generalizados contra as mulheres – começando antes da nascença, nos abortos
selectivos que dão origem a um número de homens muito superior ao de mulheres.
A pobreza também contribui: o facto de não haver casas-de-banho em muitas
habitações levou as duas adolescentes do Uttar Pradesh a sair para o campo,
onde foram atacadas. Há casos de meninas de sete anos violadas em
casas-de-banho públicas ou de comboios.
O partido de Modi desvalorizou os comentários do ministro do
interior do estado, dizendo que se trata de opiniões pessoais e não de uma
posição partidária.
Activistas têm questionado o empenho dos políticos em tratar
a violação como um crime – entre 2007 e 2012, apontam, os partidos apresentaram
a eleição 27 candidatos acusados de violação.
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