segunda-feira, 6 de maio de 2013

"Ruído" de Paulo Portas não perturba Bruxelas.Paulo Portas do outro lado do espelho (e aqui deste lado também).


"Ruído" de Paulo Portas não perturba Bruxelas

Por Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas in Público
07/05/2013



As críticas de Paulo Portas a "esses senhores" da troika de credores internacionais de Portugal foram recebidas sem preocupação de maior em Bruxelas, onde as instituições comunitárias estão mais do que blindadas face à chuva de críticas que recebem em permanência dos 27 países da União Europeia (UE). Para os responsáveis europeus, as únicas posições que têm em conta são as dos Governos, que são os seus interlocutores oficiais. No que respeita a Portugal, o que importa em Bruxelas é que o Governo mantém a linha e os compromissos assumidos no programa de ajustamento económico e financeiro que constitui a contrapartida da ajuda externa, frisa uma fonte do sector.
"O resto, os debates, os desentendimentos, as críticas, as moções de censura ou as manifestações de rua são expressões normais do processo interno de decisão de cada Estado", refere um eurocrata. "Não se pode ligar, porque senão o ruído político de 27 capitais seria ensurdecedor", sublinha.
Além de serem vistas como parte do "ruído" interno português, as críticas de Portas são acima de tudo consideradas pouco produtivas, sobretudo entre os que pensam que as exigências da troika poderiam ser eventualmente flexibilizadas.
"Não é com gritos que se mudam as coisas, mas tentando influenciar o debate europeu para uma mudança de políticas", avisa um eurocrata veterano. Um pequeno país, como Portugal, só poderá esperar influenciar o debate europeu se conhecer muito bem o processo de decisão comunitário e, sobretudo, se o souber usar, refere a mesma fonte. Por maioria de razão porque "quando um português fala, representa menos de 2% do PIB europeu, mas quando é um alemão a falar, representa mais de 20%. O que significa que o português só é ouvido se for mais inteligente do que o alemão, não é com gritos nem pedindo situações excepcionais", insiste.
O "ruído" português corre aliás o risco de ter um efeito precisamente oposto ao pretendido por Portas, avisa uma fonte europeia familiarizada com o programa de ajuda. O risco é que a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI), que vigia o cumprimento do programa de ajustamento, endureça ainda mais as exigências feitas a Portugal.
Isto foi precisamente o que aconteceu a partir da ruptura do diálogo entre o Governo e o PS, o que se traduziu num endurecimento inesperado das exigências da troika para o cumprimento das metas fixadas para a redução do défice orçamental e da dívida pública. Este endurecimento complicou aliás fortemente a 7.ª avaliação do programa que, de forma inédita, se arrasta desde Março devido em grande parte ao desentendimento entre o Governo e, sobretudo, os técnicos europeus da troika.
Enquanto esta 7.ª avaliação do programa não estiver concluída, Portugal não poderá receber a próxima parcela da ajuda externa, no valor de 2100 milhões de euros, nem terá a luz verde oficial da zona euro à obtenção de um ano adicional, até 2015, para reduzir o défice orçamental para menos de 3% do PIB.
Da aprovação do relatório da troika depende, igualmente, a confirmação pelos ministros europeus das Finanças da extensão por mais sete anos dos prazos médios de reembolso dos 52.000 milhões de euros dos empréstimos europeus. Um acordo político nesse sentido foi concluído pelos ministros das Finanças em Abril, mas ficou dependente da conclusão bem sucedida da 7.ª avaliação do programa.
Fontes da troika garantem que estão a fazer os impossíveis para concluir o relatório que permitirá aos ministros das Finanças confirmar todas as decisões pendentes durante as suas reuniões da próxima segunda-feira e terça-feira, mas não sabem se será possível.


Paulo Portas do outro lado do espelho (e aqui deste lado também)

Por José Vítor Malheiros in Público
07/05/2013

1. O último discurso de Paulo Portas foi um prodígio. Prodígio no sentido maravilhoso da palavra, porque nos mostrou algo de que já tínhamos ouvido falar mas que não sabíamos ao certo se existia e que nos causou aquele misto de espanto e de terror de que se fala nas lendas. Numa única intervenção, Paulo Portas conseguiu ser ministro da coligação mas presidente do CDS, Governo mas oposição, troikista mas patriota, estadista mas Paulinho das feiras, austeritário mas desenvolvimentista, falar para dentro e para fora do partido, para dentro e para fora do país, reforçar a sua posição neste Governo e preparar o seu papel no próximo, elogiar Pedro Passos Coelho e mostrar-lhe que segura o único fio que o segura, ser sensato mas ameaçador, firme mas negociador, cortês mas feroz, tudo sem piscar um olho e quase sem um tremor de voz.
Mas Paulo Portas não nos mostrou apenas que sabe jogar com virtuosismo em vários tabuleiros. O discurso mostrou-nos que já estamos todos a viver num país do outro lado do espelho, onde Paulo Portas é o principal autor dos cortes mas recusa partes essenciais dessas medidas, onde Portas diz que a troika é indispensável mas recusa o seu protectorado humilhante, onde Portas é Pétain e de Gaulle ao mesmo tempo e sem mudar de chapéu.
Portas lembrou-me aquela velha pergunta de algibeira: se um homem dorme com outra mulher e depois conta tudo à legítima, está a enganá-la ou não?

Afinal Portas aceitou cortes de 740 milhões por ano para reformados do Estado


Por Margarida Bon de Sousa
publicado em 7 Maio 2013 in (jornal) i online

Portas vetou a TSU dos reformados, mas escondeu que o Estado vai cortar 18,6% nas pensões até 2015

Os reformados da função pública vão perder em média 9,3% do seu rendimento em 2014, 740 milhões de euros, e outros 9,3% em 2015, também no valor de 740 milhões de euros. Esta percentagem, muito próxima dos 20% defendidos pelo FMI em Janeiro, consta do mapa de cortes enviados juntamente com a carta do primeiro-ministro à troika sexta--feira e corresponde à rubrica da convergência da Caixa Geral de Aposentações com a Segurança Social (ver gráfico ao lado).
No total, Pedro Passos Coelho avança com reduções na despesa pública da ordem dos 6,114 mil milhões de euros até ao final de 2016, de que 4,788 mil milhões constam do documento que os peritos da troika começam hoje a negociar em Lisboa. Os outros 1326 milhões correspondem ao chumbo do Tribunal Constitucional a quatro normas do Orçamento do Estado deste ano e serão incluídos no Orçamento Rectificativo que será aprovado até ao final do mês.
O mapa, já na posse da troika, abrange o ajustamento da dimensão da administração pública (224 milhões este ano, 1,3 mil milhões no próximo e 1,6 mil milhões em 2015), o ajustamento da política de remunerações no Estado (445 milhões em cada um dos próximos dois anos), medidas sectoriais (505 milhões este ano, 1,1 mil milhões em 2014 e 1,2 mil milhões em 2015) e a reforma do sistema de pensões (1,4 mil milhões no próximo ano e 1,4 mil milhões em 2015).
TSU já está em Bruxelas Nesta última rubrica está incluída a contribuição de sustentabilidade do sistema de pensões, que vale 436 milhões em 2014 e 436 milhões em 2015. Medida a que o líder do segundo partido da coligação tão veementemente se opôs domingo à noite. Paulo Portas disse claramente que bateria com a porta se o governo avançasse com a TSU.
Nessa altura, o ministro de Estado disse também ter sido contra a redução dos rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas. Com um pequeno pormenor que na altura passou despercebido. Referiu-se apenas a 2013, escondendo os cortes que os antigos funcionários públicos vão sofrer nos próximos dois anos. Porém, concorda com a convergência das pensões pagas pela Caixa Geral de Aposentações e pela Segurança Social, que irão representar uma perda acumulada de 18,6% em dois anos para estes portugueses.
Na carta o primeiro-ministro admite que algumas das medidas podem vir a ser substituídas por outras, de “semelhante qualidade e efeito orçamental”.
Fontes próximas da Comissão contactadas pelo i em Bruxelas acreditam que a sétima avaliação da troika, que hoje se inicia em Lisboa, ficará decidida até ao final da semana para ser validada segunda-feira, dia 13, no Ecofin. Mesmo assim, existem receios de que a próxima tranche de 2 mil milhões de euros não chegue para a semana a Portugal, embora os credores tenham ficado satisfeitos com a proposta enviada pelo primeiro-ministro.
As mesmas fontes deixaram claro que a troika só dará por concluída esta avaliação se o executivo apresentar cortes na ordem dos que já estão nas mãos da Comissão, do BCE e do FMI, com a devida calendarização. E admitem que a contribuição de sustentabilidade do sistema de pensões, que representaria uma diminuição da despesa de 872 milhões de euros em dois anos, possa ser uma das medidas a substituir por outro corte da mesma dimensão.
Já no Ministério das Finanças o ambiente é de maior apreensão. As declarações de Paulo Portas no sábado abriram uma brecha na confiança de Vítor Gaspar de que o fecho da sétima avaliação da troika iria correr sobre rodas.
A reunião do Ecofin, que deverá aprovar esta nova tranche a Portugal, mas sobretudo o alargamento dos prazos de maturidade do empréstimo em mais sete anos, é já na próxima segunda--feira, o mesmo dia em que os técnicos do FMI, do BCE e da Comissão Europeia apresentam o seu relatório sobre o país.

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