terça-feira, 28 de maio de 2013

Pessoal da EPUL só será integrado com concursos "martelados", diz PSD. EPUL EXTINTA SOB PROTESTOS E ALARME.

Os funcionários da EPUL, que ontem exibiram cartazes onde falavam em "gestão danosa" e nos quais acusavam o antigo presidente Santana Lopes de "endividamento" e António Costa de "despedimento".

Pessoal da EPUL só será integrado com concursos "martelados", diz PSD

Por Inês Boaventura in Público
Extinção foi ontem aprovada na assembleia municipal. Oposição duvida que António Costa consiga cumprir promessa


A dissolução da Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL) foi ontem aprovada pela Assembleia Municipal de Lisboa. O líder da bancada do PSD, partido que com a sua abstenção viabilizou a proposta, disse que a câmara não só não tem necessidade de absorver os quase 150 funcionários da empresa, como só conseguirá fazê-lo se promover concursos públicos "martelados".
O social-democrata António Prôa reagia assim às declarações do presidente da autarquia, António Costa, que, mais uma vez, garantiu que todos os funcionários da empresa agora extinta serão integrados no município. Numa primeira fase, através de acordos de cedência de interesse público, que têm a duração máxima de um ano, e depois pelo ingresso no quadro de pessoal, através de concursos públicos promovidos para o efeito.
"Só os trabalhadores que não quiserem é que não integrarão os quadros do município de Lisboa", afirmou o autarca socialista, sustentando que a dissolução da EPUL é a melhor forma de garantir os direitos dos trabalhadores. A alternativa, disse, seria a declaração da sua insolvência e o arrastar de quase 150 pessoas para o desemprego.
Já António Prôa acusa António Costa de "faltar à verdade". Isto porque, afirma, os concursos públicos que venham a ser lançados terão de ser abertos, "em igualdade de circunstâncias", tanto aos trabalhadores daquela empresa como a todos os funcionários públicos. "Ou os concursos não são sérios ou então são sérios e isentos e não se pode dar uma garantia", concluiu o líder da bancada do PSD em declarações aos jornalistas.
Para além disso, o deputado municipal social-democrata, que sublinhou ser a favor da dissolução da EPUL por considerar que o seu objecto está "esgotado", diz que "está por demonstrar" que a câmara precise dos trabalhadores em causa. "A câmara tem quadros suficientes e que estão muitas vezes subaproveitados", afirmou António Prôa.
Confrontado com essas declarações pelos jornalistas, António Costa defendeu que os funcionários da EPUL "são necessários", atendendo a que a sua actividade será agora "internalizada" nos serviços do município. Quanto aos concursos públicos, o autarca acredita que, dada a sua experiência ao serviço da autarquia e o seu perfil, os profissionais oriundos da empresa ficarão mais bem classificados do que outros funcionários públicos que com eles venham a concorrer.
A dissolução da EPUL, que, na opinião de António Costa, "legou à cidade um trabalho notável de urbanização", por exemplo em Telheiras e no Restelo, foi aprovada com os votos favoráveis do PS e dos deputados independentes, com a abstenção do PSD, CDS e PPM e com os votos contra do BE, PEV, PCP e MPT. Já as garantias do presidente da autarquia de que todos os funcionários da EPUL seriam integrados foi unanimemente questionada pelos partidos da oposição.
Diogo Moura, do CDS, considerou que extinguir a empresa foi "uma decisão coxa", desde logo por haver "uma manifesta falta de sustentação" na sua base e por não estar integrada numa "reestruturação do sector empresarial local".
Modesto Navarro, do PCP, defendeu, por seu lado, que a EPUL "foi e é necessária", classificando-a como "fundamental para novos reordenamentos, rumos e projectos essenciais para Lisboa", nomeadamente ao nível da reabilitação urbana. A dissolução, acrescentou Paulo Quaresma, do mesmo partido, é "um gravoso crime para a cidade, a mando de interesses puramente financeiros de especulação imobiliária", atendendo a que o património da empresa foi avaliado em 350 milhões de euros.
Pelo BE, José Casimiro manifestou a convicção de que o fim da empresa, "que cumpre todos os critérios da lei e nenhum determina a sua extinção", "é uma decisão política".
Durante toda a reunião de ontem da Assembleia Municipal de Lisboa, os cerca de 50 trabalhadores da EPUL presentes nas galerias foram-se manifestando, saudando com palmas as intervenções de alguns deputados, especialmente de pequenos partidos da oposição, e protestando quando António Costa ou outros eleitos do PS falavam.
Os gritos de protesto no final da reunião levaram mesmo a presidente da assembleia municipal, Simonetta Luz Afonso, que, durante os trabalhos, já tinha dito várias vezes que o regimento não permitia manifestações da assistência, a pedir a agentes policiais que evacuassem as galerias.
Os funcionários da EPUL, que ontem exibiram cartazes onde falavam em "gestão danosa" e nos quais acusavam o antigo presidente Santana Lopes de "endividamento" e António Costa de "despedimento", admitem agora interpor uma providência cautelar para tentar travar a dissolução da empresa.



EPUL EXTINTA SOB PROTESTOS E ALARME

A Empresa Pública de Urbanização de Lisboa, criada em 1971, foi terça-feira oficialmente extinta pela maioria da Assembleia Municipal, numa sessão agitada e iniciada com uma hora de atraso devido a uma ameaça de bomba.


Texto: Francisco Neves Foto: João Paulo Dias in "O Corvo" / http://ocorvo.pt/2013/05/28/epul-extinta-sob-protestos-e-alarme/

Coube ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa fazer a defesa da proposta de extinção. António Costa disse aos deputados municipais que a função da EPUL ficou praticamente esgotada, ainda mais agora, num período em que o paradigma não é a nova edificação mas a reabilitação. E que chegou a um ponto em que não consegue realizar fundos para se manter. “A crise do crédito após 2008 introduziu uma mudança radical no mercado imobiliário e precipitou as decisões sobre a EPUL”, afirmou.
A última tentativa para a EPUL se manter à tona, a planeada urbanização do Vale de Santo António, falhou depois de, no Verão de 2012, os parceiros privados decidirem sair do projecto e exigirem a devolução do primeiro pagamento efectuado. “Isto mudou tudo”, disse o autarca. O último precalço da empresa ocorreu no ano passado quando falhou o pagamento ao banco Dexia de uma prestação de um empréstimo de 60 milhões de euros feito em 2004 junto de dois credores holandeses. Face a isto os bancos declararam vencido todo o empréstimo e reclamaram 47 milhões de euros à EPUL.
Segundo Costa, “teria particular gravidade o não pagamento por parte do sector público empresarial do Estado” numa altura em que o país se encontra sujeito à troika e a extinção da EPUL – com consequente assunção das suas responsabilidades pelo município – seria a única maneira de resolver o problema sem que o valioso património da urbanizadora fosse “vendido ao desbarato”. A lei não permite à CML financiar a EPUL. O voto pedido aos deputados lisboetas, comentou ainda António Costa, não constitui um momento agradável, mas é “absolutamente necessário”. Outro caminho, sublinhou, seria “os bens da empresa irem para o bolso dos credores”.
O adiamento da votação para conseguir mais esclarecimentos – a persistência de situações obscuras neste assunto foi invocada por quase todas as bancadas – foi aconselhado pelos pareceres das três comissões da Assembleia Municipal que estudaram o problema, mas sem resultado.
A dissolução da EPUL vingou com os votos favoráveis do PS e Independentes e a abstenção do PSD, CDS e PPM. Votaram contra PCP, BE, PEV e MPT. Os muitos trabalhadores da EPUL presentes na sala da Avenida de Roma, ouvindo as críticas à proposta do dirigente do grupo municipal do PSD, ainda gritaram a António Proa “Vote contra! Tenha coragem!”, mas o partido absteve-se.
Dulce Mendes, da comissão de trabalhadores da EPUL, garantiu ontem ao Corvo que o escritório de António Gracia Pereira vai interpor quarta-feira uma providência cautelar contra a decisão da Assembleia. “Isto não é legal. Não há forma de transferir para o sector público quem trabalha ao abrigo do direito laboral privado”, disse após a votação.
Com a votação da proposta socialista a actividade da EPUL passa para os serviços do município, cujo presidente repetiu à saciedade que o futuro dos 148 trabalhadores não foi ignorado. “Dos trabalhadores da EPUL só os que não quiserem é que não integrarão os quadros da Câmara Municipal”. “Podemos abrir de imediato concursos de ingresso. Há urgência nisso. Cada dia que nos atrasarmos só estaremos a dificultar a vida aos trabalhadores da EPUL”, afirmou. “Abrirei tantos concursos quantos forem necessários”, prometeu. Mas também advertiu que não garantia que entrassem na CML com todas as regalias que auferem na EPUL pois ficarão sujeitos à tabela de vencimentos do município.
Esta afirmação levou o social-democrata António Proa a acusar Costa de prometer o que não pode garantir, dizendo que a entrada na CML só estaria garantida se se tratar de “concursos martelados” porque terão que ser abertos a outros funcionários públicos. “Desses assuntos de carpintaria não conheço. Sei que o PSD é contra a integração dos trabalhadores, mas eles são necessários porque a CML assumiu as funções da EPUL”, comentou o presidente do município. Segundo disse, será normal que, num concurso, um técnico com experiência na EPUL acabe bem situado para ingressar nos quadros da CML. A Câmara tem vindo a reduzir o seu quadro de pessoal: de 11.500 funcionários há seis anos, tem agora 9.500.
A perspectiva não entusiasma o pessoal da empresa, criada há 42 anos e agora extinta. Um dos motivos poderá ser o de os ordenados na EPUL serem em média superiores aos equivalentes na Câmara. Nos bastidores da assembleia falava-se em casos de “duas ou três vezes” os valores pagos na CML e o deputado do Partido da Terra António Arruda criticou os “elevados salários” e “mordomias” da EPUL.
Os funcionários da empresa dizem que o executivo municipal mente. Argumentam, por exemplo, que foi a CML que obrigou a empresa a gastar milhões de euros com os estádios do Sporting e do Benfica na expectativa de contrapartidas que não se verificaram. E acusam a Câmara de dever à empresa cerca de 50 milhões de euros. António Costa responde que “na contabilidade da Câmara não há registo de qualquer compromisso nessa matéria”.
À esquerda do PS disse-se que tudo não passa de um assalto ao património da EPUL, avaliado em 350 milhões de euros. Paulo Quaresma (PCP) classificou a decisão como um “gravoso crime” para a cidade de Lisboa, praticado “a mando dos interesses da especulação imobiliária”. Referindo-se às audições feitas à administração e comissão de trabalhadores da EPUL e aos dirigentes da CML por parte de três comissões permanentes da AM, disse que produziram “contradições atrás de contradições como nunca se viu nesta casa”. “Mais uma vez o grande capital fez dobrar” o presidente da Câmara, acusou, para concluir: “PSD e CDS no Governo e PS na Câmara são farinha do mesmo saco”. Modesto Navarro, do mesmo partido, criticou a “tentativa brutal de destruição da EPUL” que “obteve resultados anuais de cerca de 5 milhões de euros nos últimos três anos”.
Por seu lado o Bloco de Esquerda pôs em dúvida a lisura da transferência dos trabalhadores da EPUL para a CML, afirmando que, em Janeiro, o vice-presidente Manuel Salgado pediu à administração da empresa municipal “um completo mapa de pessoal” em que se incluiam informações como a situação sindical ou a sua ligação à comissão de trabalhadores.
O CDS, através de Diogo Moura, criticou a tomada de uma decisão apesar da “falta de um relatório circunstanciado sobre a situação patrimonial da EPUL”.
Os visados manifestaram-se de forma exuberante durante a discussão e votação da proposta, ao ponto de a presidente do colectivo, Simonetta Luz Afonso, ter pedido a sua evacuação pela polícia. Já antes, PSP e Polícia Municipal tinham sido chamadas a procurar por algum engenho explosivo colocado na sala, hipótese resultante de uma chamada anónima para as instalações da AM. O caso não foi levado muito a sério: não foi chamada a brigada de Minas e Armadilhas, manifestantes, funcionários e autarcas nunca foram obrigados a afastar-se mais que uns metros do edifício e, no parque contíguo ninguém foi impedido de passear. Mas tudo se atrasou por uma hora.

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