terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Pais e alunos do Conservatório Nacional protestam contra degradação do edifício / Conservatório Nacional evacuado contra falta de condições


Pais e alunos do Conservatório Nacional protestam contra degradação do edifício
GRAÇA BARBOSA RIBEIRO 24/02/2015 - PÚBLICO

Comunidade educativa exigiu em assembleia geral uma solução definitiva para os problemas que obrigaram ao encerramento de dez salas e deixaram muitos alunos sem aulas.

O toque do alarme de incêndio no final de uma assembleia geral de escola causou nesta terça-feira uma “enorme confusão” no Conservatório Nacional de Música, com pais e alunos a concentrarem-se à porta, do lado de fora, e a “aproveitar” para protestar contra o estado de degradação do edifício, que tem dez salas encerradas por falta de condições. “Queremos que o Ministério da Educação nos diga o que vai acontecer aos alunos que se encontram impedidos de frequentar as aulas, por falta de espaços”, disse Cátia Ferrão, representante dos pais dos estudantes.

Perto das 18h00, pais e alunos continuavam à porta, do lado de fora, por não lhes ter sido assegurado, ainda, que não havia um incêndio no edifício, disse Cátia Ferrão, frisando que "uma manifestação seria ilegal", por não terem pedido autorização. Entretanto, acrescentou, aproveitavam para "chamar a atenção para a gravidade do que se passa na escola".

Na sequência de uma vistoria ao edifício, a direcção da Escola de Música do CN foi notificada a 30 de Janeiro pela Câmara de Lisboa, de que teria de encerrar, a partir de 16 de Fevereiro, dez salas de aulas, por questões de segurança. Naquele mesmo dia, a direcção terá decidido que os alunos com aulas previstas para aquelas salas (alguns do ensino integrado, com exames nacionais de Matemática e Português em Maio), não teriam aulas noutros espaços.

Na assembleia geral, nesta terça-feira, pais e alunos resolveram apoiar aquela decisão da direcção e exigir ao Ministério da Educação e Ciência (MEC) que encontre uma solução definitiva para os problemas de degradação do edifício, que se arrastam há anos; e também criar uma comissão que terá como missão chegar “à fala com representantes do Governo”, disseram ao PÚBLICO Cátia Ferrão e Maria Vidal, representantes dos encarregados de educação e da associação de estudantes, respectivamente. “Fazer rodar os alunos pelas salas que restam não resolveria o problema (já que continuaria a haver falta de espaços) e poderia servir de pretexto para adiar uma solução definitiva”, explicou Maria Vidal.

A directora da Escola de Música, Mafalda Pernão, confirmou que, "até ter uma resposta do MEC que não passe por fazer remendos", não avançará para "a rotatividade das crianças pelas salas", o que justificou com a necessidade de "soluções definitivas". "Isso também servirá apenas para minimizar problemas e não para os resolver, porque uma parte dos alunos ficaria um bocadinho pior para a outra ficar um bocadinho melhor. Não basta", insistiu.

Em resposta ao PÚBLICO, o MEC indicou, através do gabinete de imprensa, que “a Direcção-Geral de Estabelecimentos Escolares, através da Direcção de Serviços de Lisboa e Vale do Tejo, tem acompanhado com atenção a situação a Escola de Música do Conservatório Nacional”. “Foram já feitas duas vistorias técnicas ao edifício, a última delas na semana passada, tendo sido elaborado um levantamento das intervenções essenciais”, acrescenta, frisando que a “direcção da escola foi informada das intervenções dos procedimentos necessários para proceder a essas intervenções com a maior brevidade, através da apresentação de três propostas de orçamento”. Mafalda Pernão reagiu insistindo que "não houve acompanhamento" e que "os orçamentos são para remendos".

A questão também foi objecto de discussão no Parlamento, onde a maioria chumbou um requerimento do Bloco de Esquerda para ouvir o ministro da Educação sobre o encerramento das salas, alegando que já foi anunciada uma intervenção. Segundo a Lusa, Catarina Martins, do BE, frisou que está em causa um edifício classificado e de grande extensão com problemas estruturais de longa data e a exigir uma intervenção abrangente.




Conservatório Nacional evacuado contra falta de condições
Miguel Santos / 24/2/2015, OBSERVADOR

Tetos e paredes a cair, janelas partidas e água por todo o lado. Foram estes os motivos que levaram alunos e professores a manifestarem-se esta terça-feira em frente ao Conservatório de Lisboa.

“São precisas medidas drásticas como esta para nos fazermos ouvir”. Palavras de Sofia Candeia, aluna de canto da Escola de Música do Conservatório Nacional (EMCN), que esta terça-feira foi encerrada como medida de protesto contra aquilo que pais, alunos e professores descrevem como uma “situação vergonhosa”.

A evacuação do edifício deu-se depois de soar o sistema de alarme da escola. Não se sabe se foi algum dos muitos manifestantes que accionou o alarme, mas a verdade é que, numa questão de minutos, alunos e professores estavam em frente ao EMCN a protestarem contra a falta de condições do edifício. “A situação da EMCN já se arrasta há anos, para não dizer há décadas”, sublinhou Nuno Villalonga, professor de canto naquela escola. “Ainda recentemente uma professora por pouco não ficou gravemente ferida depois de uma rajada de vento ter levado uma janela de uma sala. A sorte é que o vidro, em vez de cair para dentro da sala, caiu para fora”, contou.

Mas não são só as janelas que se partem no Conservatório. “Há já dez salas encerradas por faltas de condições mínimas de segurança para os alunos. Há pedaços dos tetos e das paredes a caírem e graves problemas nas instalações elétricas”, explicou Sofia Candeia.

A situação chegou a um ponto que, em outubro, “num dia de desespero, foi preciso chamar a proteção civil e os bombeiros porque a chuva ameaçava fazer ruir o teto de algumas salas de aulas e a água estava por todo o lado”, relata Lília Kopke, professora de piano e uma dos muitos professores que se juntaram aos alunos neste protesto improvisado.

Na altura, a proteção civil foi clara: não estavam reunidas condições suficientes para realizar aulas em alguns setores do edifício e mandou encerrar dez salas temporariamente. Quase quatro meses depois, a 30 de janeiro deste ano, os técnicos da Câmara Municipal de Lisboa tiveram um parecer idêntico e notificaram a EMCN a fazer obras urgentes e a encerrar definitivamente dez aulas.

O problema, denunciam professores e alunos, é que o Conservatório não tem verbas suficientes para fazer as obras necessárias e as entidades competentes continuam a não dar uma resposta definitiva para travar a situação.

Sem obras de fundo, a situação é gerida ao “desenrasque”, confessa Lília Kopke. “São colocados baldes nos sítios onde chove, mas em dias em que a água cai com mais intensidade simplesmente não há aulas”.

Cátia Ferrão, membro da direção da associação de pais, alerta para os “graves problemas de desigualdade entre os alunos do Conservatório e os restantes, porque os primeiros não estão a ser preparados devidamente para os exames nacionais que se avizinham”. Existem mesmo alunos que só têm uma “aula [de artes] por semana e muitas vezes não têm algumas aulas de português e de matemática, disciplinas prioritárias”, atesta Sofia Candeia, uma das alunas mais inconformadas com a situação a que a escola chegou.

A 20 de fevereiro, o Ministério da Educação deu autorização à EMCN para apresentar os orçamentos necessários para a realização de obras. Uma abertura que para a diretora do Conservatório, na altura contactada pela Lusa, “não chega”. “Ando desde 2013 a ter contactos com a Direção Geral de Estabelecimentos Escolares para resolver o problema [de degradação do edifício]. Não se admite que estejam a adiar”, afirmou.

A adiar uma situação que a qualquer momento pode “provocar a morte de alguém”, alertou o professor Nuno Villalonga. Também Bruno Graça, professor de clarinete, foi claro: “As coisas são muito simples: neste momento já baixamos ao ponto de o edifício não ter sequer dignidade para receber alunos e em que não há dignidade humana para dar aulas”.


Mas como se arrastou esta situação durante tanto tempo e até a este ponto? Sofia Candeia deu a sua versão dos acontecimentos, enquanto o professor Nuno Villalonga acenava com a cabeça em concordância:  “As pessoas que estão no poder, os proeminentes políticos, não dão valor ao ensino artístico e cultural em Portugal e querem obrigar os alunos a passarem do setor público para o privado. É uma vergonha!”, rematou.

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