A cisão começou
no interior da bancada socialista e agora ameaça a estabilidade do Governo
francês
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ECONOMIA
Lei Macron: crise política em
França
Miguel Santos / 17/2/2015,
OBSERVADOR
A falta de maioria no Parlamento
obrigou o Governo francês a legislar por decreto um polémico conjunto de
medidas que prevêem a liberalização da economia e maior flexibilidade nos
despedimentos.
Uma grave crise
política pode estar prestes a eclodir em França. Esta terça-feira, François
Holland aprovou a decisão do primeiro-ministro francês, Manuel Valls, de fazer
passar um pacote de medidas para estimular o crescimento e liberalizar a
economia francesa por decreto governamental, isto é, sem a aprovação do
Parlamento.
O mecanismo está
previsto na Lei Fundamental francesa, mas raramente foi utilizado. Manuel Valls
serviu-se deste trunfo (o Artigo 49-3 da Constituição) porque temia que o
conjunto de medidas não fosse aprovado pela maioria parlamentar, depois de pelo
menos 30 deputados socialistas terem ameaçado votar contra a “Lei Macron” –
assim conhecida por ter saído do gabinete do ministro da Economia, Emmanuel
Macron.
A nova lei tem
como objetivo aumentar a competitividade do tecido empresarial francês através,
por exemplo, da privatização de parte do capital dos aeroportos de Lyon e Nice,
da flexibilização dos despedimentos e da liberalização do acesso a profissões
antes muito reguladas, como os advogados, os notários ou os oficiais de
justiça.
Desde que começou
a ser discutida, a medida provocou a ira de vários setores da sociedade
francesa e até no interior do PS: uma parte da ala mais à esquerda do partido
não aceitou algumas das medidas previstas na lei, por considerar que eram
demasiado liberais. Um diferendo admitido, inclusivamente, pelo
primeiro-ministro: “A maioria para aprovar esta lei podia existir, mas não era
uma certeza. Não vou correr o risco de vê-la rejeitada (…) Nada nos vai fazer
recuar na defesa dos interesses de França”, garantiu Valls.
Ainda assim,
entre os socialistas, há quem discorde da visão de Valls e Macron. Martine
Aubry, antiga secretária do Partido Socialista francês e filha de Jacques
Delors, foi uma das vozes mais críticas. Aubry acusou mesmo o primeiro-ministro
de querer fazer aprovar uma lei que promove a “regressão social”.
O principal
partido da oposição, a União por um Movimento Popular (UMP), liderado pelo
antigo Presidente Francês, Nicolas Sarkozy, foi rápido a reagir e anunciou que
vai apresentar uma moção de censura, que deverá ser votada na próxima
quinta-feira. Apesar de não ser clara que posição adotaria a UMP se a lei fosse
sujeita a votação no Parlamento, Sarkozy parece estar a aproveitar para
capitalizar politicamente aquela que está a ser encarada como uma derrota
socialista. No Twitter, o antigo Presidente francês escreveu: “A verdade
conheceu a luz do dia: não há Governo, nem maioria” [tradução não literal].
Se o Parlamento
francês aprovar a moção de censura, não só a “Lei Macron” cairia, como também o
Governo francês. Isto numa altura em que os índices de popularidade de François
Holland atingiram recordes negativos e que Marie Le Pen surge em primeiro lugar
nas intenções de voto dos eleitores franceses.
A queda do
Governo é, no entanto, um cenário que, mesmo perante a insatisfação de alguns
deputados socialistas, não está em cima da mesa.
“O 49-3 é uma
negação da democracia”
Entretanto,
vários órgãos de comunicação social franceses estão a recuperar as palavras de
François Hollande, quando, em 2008, teceu duras críticas ao então
primeiro-ministro Dominique de Villepin, sob a presidência de Jacques Chirac,
precisamente por ter decidido legislar por decreto.
Na altura,
Hollande defendeu mesmo a supressão do artigo, descrevendo-o como
antidemocrático.
“O 49.3 é uma brutalidade, o 49.3 é uma negação da
democracia. O 49.3 é uma forma de travar ou impedir o debate parlamentar”, defendeu
o agora Presidente francês.
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