"O Syriza sabe que o estado de graça na política é algo efémero. E se calhar mais complicado do que negociar com o Eurogrupo será explicar ao eleitorado as promessas que vão ficando pelo caminho." |
As promessas que vão ficando pelo
caminho
DIRECÇÃO EDITORIAL
25/02/2015 - PÚBLICO
Já são visíveis os sinais de incómodo dentro da coligação de esquerda na
Grécia.
O Syriza é um
partido recente que resultou de uma aliança eleitoral de 13 partidos e
correntes de esquerda, desde maoístas, trotskistas, comunistas, verdes, entre
outros. Quando o novo Governo apresentou o seu programa de reformas para
conseguir mais tempo e dinheiro da troika, Yanis Varoufakis e Alexis Tsipras
tentaram apresentar o acordo como uma vitória para os gregos. Mas à medida que
a ala mais à esquerda do Syriza foi fazendo o deve e o haver do acordo, e as
comparações com o memorando anterior assinado por Antonis Samaras, alguns
começam a ficar desiludidos com Tsipras.
Não é por acaso
que após o acordo firmado no início desta semana, o ministro das Finanças
alemão tenha dito que “os gregos certamente terão um período difícil para
explicar o acordo aos seus eleitores”. E assim está a ser. Primeiro foi o
veterano Manolis Glezos que veio mostrar-se desiludido com as condições da
extensão do regaste: “A mudança do nome da 'troika' para 'instituições', do 'memorando'
por 'acordo' e dos 'credores' por 'parceiros' não altera nada a realidade
anterior”, sentenciou Glezos.
Depois foi a vez
de Mikis Theodorakis, outra celebridade grega, torcer o nariz ao acordo com os
alemães, e esta quarta-feira foi o ministro da Energia, um dos representantes
da ala mais à esquerda do Syriza, dizer que afinal as empresas de energia não
iriam ser privatizadas, contrariando assim a carta que Alexis Tsipras enviou
aos parceiros europeus onde garantia que as vendas em curso não iriam ser
canceladas. E no meio destas dissonâncias internas, o Partido Comunista já veio
marcar uma manifestação de protesto contra o novo Governo. A primeira. O Syriza
sabe que o estado de graça na política é algo efémero. E se calhar mais
complicado do que negociar com o Eurogrupo será explicar ao eleitorado as
promessas que vão ficando pelo caminho.
Ministro da Energia contradiz
Varoufakis e insiste que não haverá privatizações no sector
Panagiotis Lafazanis representa a ala esquerda do Syriza e pode abrir
confronto com o líder do Governo,
Maria João
Guimarães / 26-2-2015 / PÚBLICO
Alexis Tsipras prometeu que as privatizações em que já tivessem
sido lançadas ofertas ou concursos não seriam interrompidas. É o caso de parte
(66%) da ADMIE. Lafazanis disse que estas não iriam em frente. “O concurso para
a ADMIE não seguirá em frente”, disse Lafazanis. “As empresas não submeteram
ofertas vinculativas, por isso não serão completadas. Passa-se o mesmo com a
PPC.”
O ministro das
Finanças veio esclarecer entretanto que, embora as privatizações não possam ser
canceladas, as condições podem ser reavaliadas e alteradas — e a sua legalidade
também pode ser examinada.
Lafazanis — o
ministro que representa a ala de esquerda radical do Syriza, que terá cerca de
um quinto dos deputados do Partido no Parlamento — já tinha sido a voz de uma
posição intransigente em relação às privatizações no fim-de-semana. “São uma
linha vermelha”, garantia.
Duas celebridades
do Syriza — Manolis Glezos, que tirou a bandeira dos ocupantes nazis da
Acrópole em 1941, e Mikis Theodorakis, o compositor de Zorba — foram das faces
mais visíveis de oposição, manifestando apoio a uma posição mais dura do
Governo nas negociações. Glezos foi mais duro, acusando o Governo de apenas
mudar as coisas de nome, e Theodorakis pediu que os gregos dissessem “não” ao
“nein” do ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble. Para tentar acalmar
a oposição, o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, visitou Theodorakis e, ainda
que não tivessem sido feitas declarações, as imagens divulgadas mostravam
Tsipras a apertar a mão a um sorridente Theodorakis.
Dissidências na
Alemanha
Na Alemanha, cujo
Parlamento tem também de aprovar o acordo numa votação marcada para amanhã,
espera-se uma aprovação certa, mas não sem discussão. Dentro da União Democrata
Cristã (CDU), o partido da chanceler, Angela Merkel, já há dissidências
anunciadas. O deputado Wolfgang Bosbach, crítico de acordos anteriores e que já
defendeu antes que a Grécia deveria deixar o euro, disse que iria votar contra
a extensão de quatro meses do empréstimo à Grécia, classificando a lista de
reformas prometidas pelo novo Governo como “vaga” e sem uma “solução permanente
para os problemas económicos do país”.
Da Baviera, o
conservador David Bendels apelou à rejeição do acordo. “Qualquer outra posição
será uma negligência e uma traição ao contribuinte alemão”, defendeu num artigo
publicado no Handelsblatt.
E dois
responsáveis do conselho económico da CDU, Kurt Lauk e Wolfgang Steiger,
manifestaram-se contra o que disseram ser “atirar dinheiro” para a Grécia.
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