A arma atómica do Syriza contra
os interesses instalados é o apoio do povo
Panagiotis Karkatsoulis Em 2012
foi considerado o melhor funcionário público do mundo pela Sociedade Americana
de Administração Pública. Aqui avalia as medidas do novo Governo
“Estes quatro meses são só uma
pausa para respirar enquanto se prepara um plano”, diz Panagiotis Karkatsoulis.
“Os problemas maiores virão a seguir”
Maria João Guimarães / 27-2-2015 / PÚBLICO
Panagiotis
Karkatsoulis, director do Instituto de Reforma Administrativa e deputado do
partido pró-europeu O Rio (To Potami), acha que o não pagamento de impostos na
Grécia é político e não cultural e que nada é impossível. Numa entrevista por
Skype ao PÚBLICO, diz que o Syriza tem uma tarefa monumental nos próximos
quatro meses mas também uma “arma atómica” — um enorme apoio do povo. O que
achou do plano de reformas apresentado pelo ministro das Finanças? Estas
reformas são absolutamente necessárias e já deviam ter sido feitas. A grande
maioria das coisas já está nos últimos memorandos (os dois acordos e as cinco
revisões). Há questões pendentes há anos, coisas como o registo de propriedade,
corrupção, etc. Se as mesmas questões aparecem em sete documentos, isto leva-me
a perguntar (e já vamos à parte grega): que papel têm a Comissão ea troika? Digo
isto porque, se há medidas que aparecem uma vez e outra e outra, isto significa
que não há resultados. E continua-se com a mesma receita, o que indica um
problema de estratégia ao mais alto nível. A minha sensação ao olhar para os
memorandos é que se separa as reformas das questões fiscais, ou seja, impostos,
cortes de pensões, o pacote de austeridade. A austeridade resulta, com
consequências sociais tremendas, mas resulta. E a parte das reformas é só para
falar. Discutimos e no final de tudo alguém vai dizer: não chega, vamos voltar
à receita que sabemos: cortem mais salários, despeçam mais funcionários
públicos. Como é possível fazer com que resultem? A questão é como podemos
promover reformas sustentáveis. Precisamos delas, mas não há nenhum apoio de
confiança sobre como as podemos fazer. A Comissão Europeia — que é o maior
parceiro — não tem experiência ou capacidade para dar apoio neste campo. O BCE
(Banco Central Europeu) tem conhecimento limitado ao que pode fazer aos bancos
e o FMI (Fundo Monetário Internacional) não está aqui para isto — uma vez tive
uma conversa com um deles e perguntei porque não nos ajudavam com as reformas. Ele
respondeu que não estavam aqui para isso, apenas para apagar o fogo. O que
falta na lista de reformas do novo Governo? Penso que a falha principal é não
haver hierarquização. O que tem de ser feito em força e logo, porque não é
possível fazer isto tudo ao mesmo tempo. E falta abertura, transparência e
responsabilização. Falou dos problemas da parte da troika nas reformas. E da
parte grega? O Governo anterior estava tão ligado ao clientelismo, os
interesses estavam tão dentro do Governo que não havia hipótese de promover
este tipo de reformas. O novo Governo, pelo menos a este nível, não parece
estar comprometido. Mas pode sofrer outras pressões? O Governo anterior decidiu
as eleições antecipadas para estas datas para bloquear o Syriza e não o deixar
manobrar. [No plano interno], no encontro do grupo parlamentar do Syriza, houve
reacções contra este plano [da ala mais radical], mas ainda minimais. Penso que
o Governo deve continuar nesta direcção e o nosso partido [To Potami] ajudará,
todos os partidos pró-europeus vão nesta linha, de os ajudarmos a ir nesta nova
direcção. Como vão aprovar as novas reformas? Ainda não é claro, mas há várias
opções. A hipótese de um decreto, que pode ser feito em circunstâncias
excepcionais, parece estar afastada. Outra seria a aprovação parlamentar normal
— que criaria muitos problemas. A última coisa é simplesmente as medidas não
serem levadas ao Parlamento: como é uma continuação dos memorandos anteriores
não tem de ser aprovada. Penso que é o mais provável. Toda a gente percebe que
estes quatro meses são só uma pausa para respirar, enquanto se prepara um
plano. Até Junho o Governo estará sob uma pressão enorme, todas estas medidas
têm de ser especificadas nos próximos três ou quatro meses. Os problemas
maiores virão a seguir. A União Europeia pressiona para resultados. Mas quão
depressa é possível fazer estas reformas? Mostrem-me um país no mundo que tenha
feito isto! Até agora trabalhei com mais de 20 governos em todo o planeta. Não
conheço nem um caso em que um governo democrático tenha conseguido fazer algo
semelhante a isto. Com um mínimo de paz social não é possível. Algumas podem
ser feitas, mas a grande maioria vai levar tempo. Pensa que esse tempo pode ser
conseguido, se for visto algum progresso nestas reformas que podem ser mais
rápidas?
Penso que sim.
Concordo com o principal argumento do Syriza de que as medidas foram
exageradas: a Grécia perdeu 25% do seu PIB, é um desastre. Lembro-me de Tony
Blair dizer, numa entrevista ao Financial Times, que, se isso acontecesse na
Grã-Bretanha, falaríamos de uma revolução. Aqui não há uma revolução, mas, se
não tivermos cuidado, a revolução não vai ser vermelha, vai ser negra. A
terceira força no Parlamento é a Aurora Dourada. Não é um partido “tipo” nazi,
ou nacionalista. É um partido nazi! Há coisas muito estranhas a acontecer, como
esta aliança entre populismo de esquerda e de direita [a coligação no Governo
entre o Syriza e os Gregos Independentes]. Para além de tudo isto, há outros
obstáculos, mais práticos — como, por exemplo, fazer os armadores pagar
impostos. Como resolver isto? Há reformas mais fáceis do que outras. O contrabando de tabaco,
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