quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

A arma atómica do Syriza contra os interesses instalados é o apoio do povo


A arma atómica do Syriza contra os interesses instalados é o apoio do povo

Panagiotis Karkatsoulis Em 2012 foi considerado o melhor funcionário público do mundo pela Sociedade Americana de Administração Pública. Aqui avalia as medidas do novo Governo

“Estes quatro meses são só uma pausa para respirar enquanto se prepara um plano”, diz Panagiotis Karkatsoulis. “Os problemas maiores virão a seguir”

Maria João Guimarães / 27-2-2015 / PÚBLICO

Panagiotis Karkatsoulis, director do Instituto de Reforma Administrativa e deputado do partido pró-europeu O Rio (To Potami), acha que o não pagamento de impostos na Grécia é político e não cultural e que nada é impossível. Numa entrevista por Skype ao PÚBLICO, diz que o Syriza tem uma tarefa monumental nos próximos quatro meses mas também uma “arma atómica” — um enorme apoio do povo. O que achou do plano de reformas apresentado pelo ministro das Finanças? Estas reformas são absolutamente necessárias e já deviam ter sido feitas. A grande maioria das coisas já está nos últimos memorandos (os dois acordos e as cinco revisões). Há questões pendentes há anos, coisas como o registo de propriedade, corrupção, etc. Se as mesmas questões aparecem em sete documentos, isto leva-me a perguntar (e já vamos à parte grega): que papel têm a Comissão ea troika? Digo isto porque, se há medidas que aparecem uma vez e outra e outra, isto significa que não há resultados. E continua-se com a mesma receita, o que indica um problema de estratégia ao mais alto nível. A minha sensação ao olhar para os memorandos é que se separa as reformas das questões fiscais, ou seja, impostos, cortes de pensões, o pacote de austeridade. A austeridade resulta, com consequências sociais tremendas, mas resulta. E a parte das reformas é só para falar. Discutimos e no final de tudo alguém vai dizer: não chega, vamos voltar à receita que sabemos: cortem mais salários, despeçam mais funcionários públicos. Como é possível fazer com que resultem? A questão é como podemos promover reformas sustentáveis. Precisamos delas, mas não há nenhum apoio de confiança sobre como as podemos fazer. A Comissão Europeia — que é o maior parceiro — não tem experiência ou capacidade para dar apoio neste campo. O BCE (Banco Central Europeu) tem conhecimento limitado ao que pode fazer aos bancos e o FMI (Fundo Monetário Internacional) não está aqui para isto — uma vez tive uma conversa com um deles e perguntei porque não nos ajudavam com as reformas. Ele respondeu que não estavam aqui para isso, apenas para apagar o fogo. O que falta na lista de reformas do novo Governo? Penso que a falha principal é não haver hierarquização. O que tem de ser feito em força e logo, porque não é possível fazer isto tudo ao mesmo tempo. E falta abertura, transparência e responsabilização. Falou dos problemas da parte da troika nas reformas. E da parte grega? O Governo anterior estava tão ligado ao clientelismo, os interesses estavam tão dentro do Governo que não havia hipótese de promover este tipo de reformas. O novo Governo, pelo menos a este nível, não parece estar comprometido. Mas pode sofrer outras pressões? O Governo anterior decidiu as eleições antecipadas para estas datas para bloquear o Syriza e não o deixar manobrar. [No plano interno], no encontro do grupo parlamentar do Syriza, houve reacções contra este plano [da ala mais radical], mas ainda minimais. Penso que o Governo deve continuar nesta direcção e o nosso partido [To Potami] ajudará, todos os partidos pró-europeus vão nesta linha, de os ajudarmos a ir nesta nova direcção. Como vão aprovar as novas reformas? Ainda não é claro, mas há várias opções. A hipótese de um decreto, que pode ser feito em circunstâncias excepcionais, parece estar afastada. Outra seria a aprovação parlamentar normal — que criaria muitos problemas. A última coisa é simplesmente as medidas não serem levadas ao Parlamento: como é uma continuação dos memorandos anteriores não tem de ser aprovada. Penso que é o mais provável. Toda a gente percebe que estes quatro meses são só uma pausa para respirar, enquanto se prepara um plano. Até Junho o Governo estará sob uma pressão enorme, todas estas medidas têm de ser especificadas nos próximos três ou quatro meses. Os problemas maiores virão a seguir. A União Europeia pressiona para resultados. Mas quão depressa é possível fazer estas reformas? Mostrem-me um país no mundo que tenha feito isto! Até agora trabalhei com mais de 20 governos em todo o planeta. Não conheço nem um caso em que um governo democrático tenha conseguido fazer algo semelhante a isto. Com um mínimo de paz social não é possível. Algumas podem ser feitas, mas a grande maioria vai levar tempo. Pensa que esse tempo pode ser conseguido, se for visto algum progresso nestas reformas que podem ser mais rápidas?


Penso que sim. Concordo com o principal argumento do Syriza de que as medidas foram exageradas: a Grécia perdeu 25% do seu PIB, é um desastre. Lembro-me de Tony Blair dizer, numa entrevista ao Financial Times, que, se isso acontecesse na Grã-Bretanha, falaríamos de uma revolução. Aqui não há uma revolução, mas, se não tivermos cuidado, a revolução não vai ser vermelha, vai ser negra. A terceira força no Parlamento é a Aurora Dourada. Não é um partido “tipo” nazi, ou nacionalista. É um partido nazi! Há coisas muito estranhas a acontecer, como esta aliança entre populismo de esquerda e de direita [a coligação no Governo entre o Syriza e os Gregos Independentes]. Para além de tudo isto, há outros obstáculos, mais práticos — como, por exemplo, fazer os armadores pagar impostos. Como resolver isto? Há reformas mais fáceis do que outras. O contrabando de tabaco,

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