O abraço de urso
Por Luís Osório
publicado em 11
Fev 2015 – in (jornal) i online
Eles sabem e
aceitam as regras do jogo. São estrelas de novela num mundo que deseja estar
animado em permanência. E não há animação sem novidade
Não sabemos se a
Grécia sairá da reunião do Eurogrupo com mais ou menos esperança no futuro. A
esperança já teve melhores dias, mas Varoufakis, ministro das Finanças, tem
sido talentoso na maneira como gere o que diz e não diz. Há quem fale, com tão
poucos dias, na possibilidade de um choque frontal entre Tsipras e este seu
ministro, dois egos que na nomenclatura de uma sociedade espectáculo não podem
coabitar no mesmo palco sem que um queira matar o outro - um pouco como os
leões em combate pelo domínio da sua tribo. Veremos.
O Syriza
conquistou o poder por ser uma força livre de culpa. Não tem culpa do estado a
que a Grécia e a Europa chegaram. Conquistaram o poder porque tinham as mãos
limpas de corrupção, porque têm uma retórica que restituiu a honra de Atenas,
porque "inventaram" novas palavras jamais escutadas nos centros de
poder e, finalmente, porque têm uma imagem que tornou os políticos tradicionais
e os burocratas da troika exemplares de um mundo arcaico.
O drama da
vitória de Tsipras é que equivale a uma derrota das forças que tiveram e têm o
poder na generalidade dos países europeus. Uma derrota também dos partidos
socialistas que mostram uma inteligente prudência. O perigo de sobrar para eles
como sobrou na Grécia para o PASOK é um risco que não tencionam nem podem
correr.
Escrevi há uns
dias sobre o paralelismo com a Alemanha entre guerras. Foi a má gestão dos
vencedores do conflito mundial de 1914-18 em relação à Alemanha que tornou
possível a subida ao poder de Hitler. Também ele convenceu os seus de que a
honra tinha de se reconquistar contra quem a usurpara. Varoufakis fez igual
paralelismo e, inteligentemente, afirmou que, se não for a Europa a estender a
mão a um entendimento, o que sucedeu poderá voltar a acontecer pois a Grécia
acabará por cair nas mãos de um partido fascista (já o terceiro mais votado
entre os gregos).
Eles são um grão
na engrenagem. Que só conseguirá resultados com apoios internacionais. São
revolucionários, disso não tenho dúvidas. Revolucionários e filhos da
globalização e do mercado que diabolizam. Tsipras e Varoufakis querem a morte
de uma parte de si, a morte de um mecanismo que os fez ganhar, que os fez serem
quem são. Porque são, sem crítica implícita, um produto que se adaptou na
perfeição às regras do marketing. Ver Varoufakis no seu cabedal e camisas fora
das calças, vê-lo ao lado de uma mulher Barbie, é o mesmo que observar uma
estrela pop,
um macho alfa que
encanta a comunicação social e inspira a curiosidade entre os seus pares
internacionais.
Eles sabem e
aceitam as regras do jogo. São estrelas de novela num mundo que deseja estar
animado em permanência. Não há animação sem novidade e os dois protagonistas
gregos são a novidade de que o mundo precisava. Serão travados hoje por Merkel
porque a Europa do dinheiro e do crédito não pode tolerar que o efeito Syriza
se multiplique pela Espanha. Porém, há mais marés que marinheiros. Os gregos
têm cartas a jogar e a Rússia está pronta a abraçar. Varoufakis não perderá a
oportunidade de confessar no Eurogrupo que precisa urgentemente de um abraço. O
melhor é chegarmo- -nos à frente e evitar o abraço de urso.
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