Atenas e Berlim sobem o tom entre
esperanças de compromisso
MARIA JOÃO
GUIMARÃES 10/02/2015 - PÚBLICO
A véspera da reunião do Eurogrupo começou com optimismo com o plano grego e
terminou com declarações fortes de Schäuble, Varoufakis e Tsipras.
Os ministros das
Finanças da zona euro reúnem-se esta quarta-feira para ouvir uma proposta grega
que incluirá aceitar 70% das reformas do acordo com a troika e conseguir
financiamento através da emissão de bilhetes de tesouro, da devolução de lucros
de obrigações gregas e de um limite mais baixo para o excedente primário
(tirando a dívida), segundo fontes de Atenas.
Enquanto de
Bruxelas veio uma mensagem de “contactos construtivos” entre o
primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, e o presidente da Comissão Europeia,
Jean-Claude Juncker, esta foi temperada pela conclusão de que os contactos
intensos entre os implicados “não foram, até agora, muito frutuosos”.
Contrariando a
expectativa geral de que seria possível um acordo, o ministro das Finanças da
Alemanha, Wolfgang Schäuble, disse, após um encontro do G20, que se a Grécia
não aceitar a tranche final do actual programa, “acabou”. Os credores “não vão
negociar nada novo”, garantiu.
Do lado de
Atenas, o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, também subiu o tom. “Se não
estamos a sequer considerar um confronto, não estamos a negociar”, disse na
discussão parlamentar antes de um voto de confiança ao Governo, citado pela
agência Reuters. “Não estamos a procurar um confronto e faremos tudo para o
evitar. Mas não estamos a negociar se o excluirmos.”
Os restantes
membros da zona euro querem que a Grécia aceite uma extensão do programa da
troika, algo que o novo executivo tem recusado. A BBC noticiava que a comissão
preparava uma extensão de seis meses, algo que já desmentido por Schäuble.
Nesta terça-feira
à noite, Tsipras repetiu as palavras desafiadoras, antes de o seu Governo
receber o voto de confiança, com 162 votos a favor, precisamente o número de
deputados do Syriza e dos Gregos Independentes, os dois partidos que suportam a
coligação. "Schäuble pode pedir de que maneira for que nós não pediremos a
extensão do plano de ajuda”, garantiu Tsipras, acusando a Alemanha de estar a
exigir “coisas irracionais”.
Cada vez mais o
encontro desta quarta-feira é visto como “uma primeira troca de pontos de vista
com o novo Governo grego”, segundo a porta-voz da comissão Mina Andreeva, e não
é esperado um acordo. Na segunda-feira há nova reunião do Eurogrupo.
Ainda assim, e
antes do comentário de Schäuble, a disposição parecia mais optimista, pelo
menos do lado dos investidores, com a bolsa de Atenas a fechar em alta (7,98%)
ao contrário do que tem acontecido nos últimos dias.
Na Grécia, a
estratégia de negociação do novo Governo tem recebido apoio até de quem votou
na oposição (70% dos inquiridos, 40% dos eleitores da Nova Democracia), embora
um estilo de confronto faça franzir sobrolhos em Bruxelas. “O melhor modo de
conseguir um acordo com a União Europeia é ir conseguindo alianças em encontros
atrás de portas fechadas e depois tentar chegar a consensos”, disse um antigo
diplomata à Reuters. “Confrontos ruidosos normalmente levam a resistência e
isolamento.”
Yanis Varoufakis
tem testado estes limites com declarações sobre a sustentabilidade da dívida
italiana ou da fragilidade do euro (que não resistiria a uma saída da Grécia,
disse). Na Alemanha, a hipótese de uma saída da Grécia da zona euro é cada vez
mais considerada: uma sondagem indicava que um em cada dois alemães é a favor
da Gr-exit.
Piorando ainda a
este nível, o ministro da Defesa Panos Kammenos, do partido Gregos
Independentes (Anel), veio dizer que se a zona euro se mostrar inflexível a
Grécia poderá ter de recorrer ao Plano B. “O plano B é ir buscar verbas a
outros países, seja no melhor cenário os Estados Unidos, poderá ser a Rússia,
poderá ser a China, ou outros países”, disse.
A questão levou o
ministro dos Negócios Estrangeiros, Nilos Kotzias (que tem uma visita a Moscovo
no ar, ainda não confirmada) a defender em Berlim que a Europa continua a ser o
parceiro “preferido”.
Enquanto isso, os
Estados Unidos têm falado mais sobre a Grécia e a zona euro com declarações que
têm sido descritas como recados à Alemanha para que admita mais investimento
para permitir a recuperação da procura interna. As declarações vieram do
Presidente, Barack Obama, que defendeu a necessidade de crescimento da economia
do país, e do secretário de Estado do Tesouro, Jack Lew, a dizer que “toda a
gente tem de baixar um pouco a retórica”, que “não deve haver conversa casual
sobre uma resolução que deixaria a Grécia ou a União Europeia numa situação
insustentável”, e que a Europa precisa de uma política fiscal um pouco
diferente porque há uma queda na procura.
Extensão ou
programa temporário
Em termos
concretos, a proposta que o ministro grego apresentará – que o colunista do
Financial Times Wolfgang Münchau considera “inteligente” – baseia-se em traços
largos em quatro pilares. O primeiro é a aceitação dos 70% das disposições da
troika, que permite considerar o acordo uma “extensão” e manter a afirmação da
chanceler alemã, Angela Merkel, de que o memorando é a base para qualquer
entendimento. O mesmo foi sublinhado pelo comissário europeu da Economia Pierre
Moscovici: "A Grécia sabe que o programa é a nossa referência. Temos de
ver que tipo de soluções conseguimos dentro deste quadro, não fora dele.”
O segundo pilar
da proposta grega é o excedente orçamental primário (tirando o pagamento da
dívida) descer para 1,5% dos actuais 3%, que Atenas considera insustentáveis.
Este ponto beneficiará eventualmente, dizem analistas, de uma pressão dos EUA
para mais espaço para crescer.
O terceiro é
algum tipo de discussão sobre dívida – como a indexação ao crescimento do PIB,
acordos bilaterais para troca de dívida ou outras soluções. Finalmente, no
quarto pilar, o Governo quer reverter algumas medidas de austeridade que
causaram o que considera ser uma situação de crise humanitária, propondo
refeições e electricidade grátis para quem não pode pagar, cuidados de saúde
para quem não tem seguro ou emprego, e outras medidas que estima custarem 1,86
mil milhões de euros.
Em termos de
percepção, fontes consideram que pode haver um acordo que permita aos gregos
falem de programa temporário e os restantes parceiros de extensão técnica. Este
programa vigoraria até Setembro, permitindo ultrapassar o dia 28 de Fevereiro
quando termina o actual programa, até que fosse discutido um programa
abrangente, cujas bases seriam já lançadas.
“Os políticos
gregos estão a caminhar numa corda bamba entre gritar uma condenação ao
anterior memorando suficientemente alto para que os seus eleitores ouçam mas
também sussurrar promessas aos burocratas para conseguir um acordo”, resume o
analista da CMC Markets Japes Lawer em declarações ao jornal britânico The
Guardian.
A jornalista do
Wall Street Journal Matina Stevis fazia um ponto da situação no Twitter: “As
diferenças económicas são ultrapassáveis [mas] politicamente difícil de
engolir.” E avisa: “o custo do falhanço é exorbitante para todos.”
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